Excerptus

 

 

EXCERPTUS

 

 

 

 

Pietro Ubaldi

 

Evolução e Evangelho (ver livro)

 

Nenhum indivíduo pode achar-se em equilíbrio estável senão no seio da lei de seu plano, que lhe cor­responda aos instintos e à natureza.

 

Cada um é o que é, e com o próprio comporta­mento revela o que seja. É inútil vestir-se como evo­luído, quando não se é tal. E cada um, de acordo consigo mesmo, vai situar-se no plano que lhe com­pete, porque é o seu, e nele encontra o ambiente apto a viver.

 

Se o evoluído se en­contra na terra, seja mesmo por exceção, é para rea­lizar alguma tarefa, e não para nada. Essa tarefa in­teressa a vida em sua fundamental exigência, que é a evolução.

 

Tudo está em seu devido lugar, para realizar o trabalho que compete a cada um, de acordo com a sua natureza.

 

Colocar-se-á, então, a favor do Evangelho quem tem a inteli­gência para compreendê-lo e um grau de evolução suficiente para poder praticá-lo. Os outros, bem con­vencidos, no segredo de seus corações, de que se tra­ta de loucura perigosa, evitarão vivê-lo seriamente, e o deixarão no terreno teórico, limitando-se a uma glo­riosa exaltação verbal.

 

A sociedade dos seres que formam a vida é constituída por um sistema orgânico hierárquico em que os seres estão interligados, e nenhum deles pode avançar sozinho, mas somente inclinando-se sobre os irmãos menores para fazê-los subir com ele.

 

Não se pode ga­nhar dos dois lados, do lado da Terra e do lado do céu. Quem possui as qualidades com as quais sabe viver bem na Terra, contente-se com as vantagens des­ta e não peça as que descem do Alto. Mas quem não sabe viver na Terra, porque pertence a planos mais altos da vida, é justo que seja salvo pelas forças do céu.

 

É lógico e justo que o homem que vive de prepotência e luta seja obrigado a defender-se com esses seus meios, de que está bem armado, e que as forças do Alto não se movam para ele.

 

Sem mérito e justiça, nada se recebe do céu.

 

É inútil pretender o mila­gre quando não há martírio, nem bondade quan­do nos aproximamos dos poderes do Alto com a psi­cologia humana corrente do aproveitador.

 

Não basta sermos bons se formos inertes e pre­guiçosos. Precisamos possuir a fé e a atividade dos trabalhadores fortes e honestos.

 

É justo que o auxilio seja dado pelo Alto a quem trabalha sacrificando-se pelos outros, e não a quem trabalha só para si mesmo.

 

A vida deve ser trabalho produtivo para todos. Por isso, só pode subtrair-se a um traba­lho quem está realizando outro.

 

Evoluindo não crescem os di­reitos, mas os deveres; não se ganha em comando, mas em obediência.

 

A evolução avança para a unidade orgânica.

 

A primeira qualidade espontânea do evoluído é a de ignorar a sua superioridade; a sua maior paixão é a de tornar evoluídos os outros seres.

 

Pode-se então conceber o Evangelho como uma meta a alcançar, como um estado de perfeição a que o homem ainda não chegou, mas ao qual devera che­gar fatalmente.

 

O Evangelho, que é justo, não pode admitir nenhum direito sem os cor­relativos deveres.

 

Que afirmação suprema constitui, em compensação, o Evangelho; afirmação de uma vida muito mais alta e poderosa, que o mundo não toma em consideração porque não a vê.

 

O Evangelho quer tirar-nos a ânsia do tra­balho, mas não o trabalho; quer que o façamos com ânimo tranqüilo, o que significa menos esforço e maior rendimento; quer que o realizemos com inteli­gência e amor, o que o torna interessante e útil, inclu­sive para o espírito.

 

Se quisermos construir solida­mente e não arriscar a falência da obra, teremos de ocupar-nos também com as coisas espirituais da alma e do céu.

 

A presença do dinheiro numa obra, mesmo que seja indispensável, tende, por sua natureza — se não for corrigida e disciplinada — a levar-nos pelo cami­nho dos enganos, num terreno mal seguro de areias movediças, prontas a tudo engolir.

 

A vida obedece muito mais as causas profundas, que não vemos, do que às superficiais, com as quais tanto contamos.

 

O dinheiro pode ser perigoso, e isto pelos sentimentos negativos e desagregantes que atrai e traz consigo, introduzindo-os na obra.

 

O erro consiste no dinheiro dema­siado, não honesto, não fruto do trabalho, não meio para coisas boas, mas fim em si mesmo.

 

As coisas em si mesmas não são nem boas nem más. Tudo depende da intenção e do objetivo com que são feitas. Elas só en­tram no mundo moral com o uso que delas faz o ho­mem. Tudo é bom quando bem usado; tudo se torna mal quando se usa mal.

 

Fala-se muito de Deus e de Cristo, utilizados como capa para encobrir os próprios interesses e para fazerem-se, a sombra Deles, melhores negócios.

 

Com os meios e métodos do mundo poderão fazer-se edifícios materialmente grandes, mas nada se constrói nas almas.

 

Se nos basearmos orgulhosamente apenas em nossos recur­sos pessoais, teremos somente estes para nossa defesa. Mas se humildemente nos coordenarmos no âmbito da Lei de Deus, poderemos contar com o poder dela, e a teremos como defesa nossa.

 

Em qualquer circunstância, não se pode sair do próprio estado mental, nem se pode agir diversamente daquilo que se é.

 

O que o homem deve aprender primeiro não é a espiritualidade, mas a libertação da materialidade; não é tornar-se anjo, mas deixar de ser animal.

 

A primeira qualidade do homem espiritual é a de eliminar o corpo e a matéria das próprias funções espirituais.

 

Ao invés de reduzir as coisas espirituais à forma mental humana, abaixando tudo a esse nível, seria necessário pro­curar subir, assumindo a forma mental do homem espiritual.

 

Infelizmente cada um tende a transformar e reduzir tudo às medidas do próprio plano e aos limites da própria natureza.

 

O que está acima de qual­quer discussão é que, qualquer coisa que se faça, deve-se fazê-la honestamente e com sinceridade, sem enganar-se a si mesmo e aos outros.

 

A evolução não pode impelir-nos a caminhar contra a vida, mutilando‑se na dor; mas leva-nos para a vida.

 

Assim, a animalidade humana continua a enfei­tar-se com esse belo chapéu e a vestir-se com esse belo manto, o Evangelho, acreditando que lhe baste isto para conseguir civilizar-se sem esforço.

 

Na ordem uni­versal, nada ocorre por acaso, nada é inútil, tudo está em seu lugar justo.

 

A plenitude da vida está em Deus, e o ser a conquista subindo para Ele com a evolução, enquanto a perde afastando-se de Deus com a involução.

 

O    Evangelho não desce para trabalhar num ter­reno virgem, mas num já poluído por mil delitos. É necessário enfrentar um trabalho imenso, porque se trata de corrigir, de reeducar de novo, reedifi­car o que está mal construído.

 

Quem quisesse, sozinho, no mundo de hoje, contra todos, viver integralmente o Evangelho, só poderia ser um mártir.

 

Embora seja proibi­do o crime, o gosto tão difundido pelos dramas crimi­nais demonstra como é grande o desejo de morder, de matar, de destruir, que se acha aninhado no fun­do da alma humana.

 

Todos estamos mais ou menos presos numa rede de débitos e créditos re­cíprocos.

 

Ninguém po­de escapar à lei do próprio plano, muito menos quem a prefere e procura cada vez mais imergir nela.

 

Para realizar um trabalho mais vasto, com mira a resultados maiores e vanta­gens longínquas, seria preciso saber conceber com maior amplitude fenômenos a longo prazo.

 

Com o seu respeito à liberdade individual, a lei não pode tirar a ninguém o seu direito de errar. Para aprender, per­manecendo livres, é necessário pagar de seu próprio bolso as conseqüências, experimentando-as na própria pele.

 

Ninguém está mais defendido, embora desarmado, do que o justo, e precisamente porque é justo.

 

O objetivo da evolução é a conquista da vida. Essa conquista é a maior paixão do ser, que tanto mais se debate para subir quanto mais baixo é o plano em que esta imerso.

 

A luta se torna tanto mais árdua quanto mais se involui longe de Deus, porque é sempre mais difícil salvar a vida da morte quanto mais o ser se afasta do centro da vida, que é Deus, avizinhando-se do pólo oposto, que é o da negação de Deus e da vida, ou seja, o pólo da morte.

 

Quando não é suficiente a atração para o alto, entra em ação a repulsão contra o baixo.

 

O or­ganismo universal é tão bem construído que, aconte­ça o que acontecer, tudo termina bem; qualquer erro que o ser cometa servirá para instruí-lo e, finalmente, fazê‑lo progredir.

 

Quando a evolução não se realiza pela alegria de progredir, a vida a realiza com o chicote da dor, para que se cumpra, de qualquer forma, o progresso, que é o maior bem para o ser.

 

A vida é um recipiente que, em si mesmo, vale pouco. Tudo depende do valor do conteúdo que lhe derramamos dentro.

 

A posição de maior vantagem e de menor prejuízo em relação à dor é a de aceitá-la, não passivamente, mas para nos pôr a seu lado construtivamente, com ela colaborando para nosso benefício.

 

Nas religiões, co­mo em nosso organismo, é necessário haver equilí­brio entre espírito e corpo. Um espírito só, sem cor­po, passa despercebido. Um corpo só, sem espírito, torna-se cadáver putrefato.

 

O ser espiritualmente maduro baseia-se na substância, dando à forma o valor que ela merece. Quanto mais o ser esta adiantado, mais livremente aceita por convicção, e maior conhecimento possui para poder autoguiar-se.

 

Não podem dar-se pérolas aos porcos; não se pode dar alimento espiritual puro, sem revestimento de formas, a quem apenas sabe conceber coisas mate­riais; não se pode dar liberdade a quem está habituado a funcionar apenas debaixo do aguilhão do mando; não se pode dar direito de autodecisão a quem não possui nenhum conhecimento para dirigir-se.

 

Sem o terror do inferno de um lado e a cobiça de ganhar um paraíso do outro, nada se teria podido obter do ser humano.

 

Um dos maiores problemas humanos é o de poupar trabalho e satisfazer a todas as necessi­dades próprias, inclusive às espirituais, com o me­nor dispêndio possível de energia física e mental.

 

As religiões tendem a tomar a forma que lhes é imposta pela natureza humana e pelas condições do ambiente terrestre.

 

Para um indi­víduo imaturo é equivalente e indiferente aceitar esta ou aquela idéia, pois logo que se sai do terreno das coisas materiais, tudo se perde, para ele, num ocea­no de pensamentos impalpáveis.

 

Para poder agir de conformidade com a própria fé é preciso compreender bem aquilo em que se crê.

 

No seio da ordem constituída, tudo o que é insubordinação traz desordem, semeia escândalo.

 

Não é o divino que evolui, mas a capacidade humana de compreendê-lo e realizá-lo.

 

Sem dúvida, para ser perfeita, uma Igreja deveria ser constituída só de santos. Só então o Evangelho pode­ria ter realização completa. E certamente uma tal Igreja de santos saberia tratar muito bem das coisas do céu. Mas será que saberia tratar das coisas da terra?

 

Uma igreja apenas de santos, sem os homens do mundo, permanece no céu e não trabalha na terra. Uma Igreja só de homens práticos, feitos para a matéria, estaria falha em sua substância espiritual e seria uma mentira.

 

Sem dúvida que o ideal seria o respeito às consciências e à personalidade individual, ou seja, a posição que está nos antípodas do absolutismo dogmático, feito de autori­dade e disciplina. Mas é também verdade que não se pode respeitar a liberdade de um selvagem, por­que, se o fizermos, ele se aproveita disso para ma­tar-nos. E, então, quem realizará a missão de civilizá-lo?

 

A disciplina pode ser imposta aos menos amadurecidos só para seu bem. Logo que eles progridam um pouco mais, a liberdade será um direito deles.

 

Reconhece-se o biótipo do involuído por seu espírito de agressividade, ao passo que o do evoluído por seu instinto de compreensão e conciliação.

 

Julgando os outros, nós julgamo-nos a nós mesmos, e condenando os erros e a ferocidade do passado, condenamos os nossos erros e nossa ferocidade no passado.

 

Entrando numa ordem de idéias, não se pode mais sair dela, e sua concatenação lógica nos arrastará até ao fundo. Somos livres ao colocar as premissas, mas depois ficamos inexoravelmente ligados a elas.

 

Quanto mais se é obrigado a condenar, tanto mais se dá prova de que a religião do amor faliu.

 

Com sua forma mental o homem só teria respondido aos terrores do inferno, em que agora já ninguém crê e que não são úteis à evolução, devendo, portanto, ser abandonados como expediente psicológico superado.

 

Com a bondade e o amor será sempre mais aliviado o peso da dor que, embora permanecendo, não será uma condenação eterna, como vingança e falência da obra de Deus, mas um instrumento bendito de redenção, uma escola transitória de evolução, para levar todos à salvação.

 

Quem se entrincheira no definido e no definitivo, permanece aí congelado e abandonado ao passado da vida que caminha.

 

Para repreender as culpas dos outros, é preciso não as possuir no mesmo terreno. Para poder pregar um dever, seria preciso primeiro cumpri-lo.

 

A verdade é que todos vivem imersos no mesmo plano da luta, da força e da astúcia, à caça dos bens e poderes materiais, que constituem o único ideal em que o mundo hoje efetivamente dá provas de acreditar.

 

Nosso dever não deve basear-se na força nem na astúcia, mas na justiça e no fato de haver merecido, por ter obedecido à lei de Deus, a Sua ajuda e proteção.

 

O maquiavelismo não se terá tornado a secular doença crônica da Igreja?

 

Quando se entra na lógica de um sistema, fica-se preso a ele ate ao fundo.

 

Com o princípio de que o fim justifica os meios, pode chegar-se ao uso da violência para estabelecer a paz, da astúcia para defender a verdade, dos expedientes humanos para fazer descer à terra o divino.

 

O Evangelho explicou bem claramente que não se pode servir a dois senhores. O que quer dizer que é preciso decidir-se, na escolha, entre as duas lógicas, rumando por um caminho certo para segui-lo até o fim.

 

A astúcia do jogo duplo é a mais perigosa e enganadora das astúcias. E de tal forma complica a defesa que, a certo ponto, se torna impossível.

 

Ao maquiavelismo jamais faltam razões para legitimar suas obras.

 

Se, para vencer a batalha na terra, chegar a perdê-la no céu, a Igreja a perderá em ambas as frentes porque, numa, traiu a sua missão, e, no plano humano, será liquidada como é de justiça fazer-se com os fracos e vencidos.

 

O mal funciona a serviço do bem, e chegam destruição e dor para recolocar-nos na posição devida, fazendo triunfar o espírito.

 

Ninguém pode deter a história e o progresso. Mesmo que o homem possa fazer todas as coisas, não obstante tudo continua a funcionar perfeitamente na perfeição de Deus.

 

A evolução leva o homem à sua própria espiritualização, pois é esta direção em que a vida progride, e é no espiritualizar-se que verdadeiramente consiste o telefinalismo da evolução.

 

Ainda que o particular seja deixado ao livre-arbítrio individual, à mercê das tentativas e do erro, em suas grandes linhas o fenômeno da evolução é fatal e amarrado a um caminho próprio preestabelecido. Pode-se evoluir de várias maneiras, mas somente caminhando para Deus.

 

A mão de Deus é tremenda, quando é necessária a destruição, que executa sem piedade, e quando a operação do corte cirúrgico é necessária para o bem do enfermo a quem se precisa salvar a vida.

 

Assim, partindo do mundo inorgânico da matéria, através do dinâmico da energia, chega-se ao mundo orgânico da vida, vegetal e animal, no cume da qual se desponta com o homem, o mundo imaterial das idéias e do espírito. Cada um desses mundos se transforma, evoluindo, por imperceptíveis gradações, infiltrando-se no seguinte. Achamo-nos como que diante da construção de um grande edifício, cujas qualidades e complexidade de estrutura revelam uma sabedoria que aumenta a cada plano.

 

O complexo não pode ser gerado pelo simples, nem o mais pelo menos.

 

A presença de Deus em nós é uma conquista que temos de fazer com esforço próprio, merecendo-a pelo fato de saber subir até Ele.

 

Se aceitarmos como procedente o principio do acaso, ou seja, aquele da ação dos fatores da adaptação e seleção, jamais poderemos explicar-nos como esses fatores se orientaram, em média, para a construção de uma forma que é a mais improvável estatisticamente.

 

Havia uma revolução grande demais para realizar, uma ponte muito longa para atravessar o abismo e uma encosta muito íngreme para subir, para que o milagre pudesse ocorrer apenas com as leis e os recursos do mundo inorgânico.

 

No fenômeno vida, verificamos não uma diminuição, mas um incremento das dissimetrias; ao invés de uma tendência a nivelar as desigualdades e a cancelar valores, uma tendência a acentuar as desigualdades, a criar valores, diferenças, complicações.

 

A evolução é um fenômeno pré-ordenado, nunca abandonado ao acaso, mas dirigido por uma inteligência e vontade para determinados fins preestabelecidos.

 

A vida não é um trabalho inútil, sem objetivo, fim de si mesma, nem se esgota apenas com seu funcionamento, sem nada produzir; mas é um meio para atingir conquistas mais altas, como acontece sempre a cada passo do processo evolutivo.

 

Ao homem pertencerá um futuro mais alto quando mostrar-se digno dele.

 

Tudo morre e tudo renasce, e assim se transforma, mas não ao acaso, e sim seguindo um caminho preestabelecido por uma inteligência que bem sabe aonde vai. Sobe-se, dessa forma, por uma escada, em que cada degrau é um ponto de chegada, ao mesmo tempo que um ponto de partida. Os seres que estão ao longo da escada podem ocupar níveis diferentes, adiantar-se, deter-se e até retroceder, mas não podem mudar o traçado estabelecido por ela.

 

Desaparecerá, por evolução, a lei da luta pela seleção do mais forte, própria ao plano animal-humano, sendo substituída pela lei que leva a seleção do mais justo e inteligente.

 

O homem futuro não será um animal forte, nem um astuto lutador, mas um cidadão consciente do universo.

 

Fazer o bem e o mal significa sintonizar com determinados ambientes, que por isso se tornam nossos, e dos quais acabaremos participando, para gozar ou sofrer, consoante nossas obras.

 

E que são as descobertas científicas e todas as grandes construções do pensamento senão pedaços de conhecimentos reconquistados?

 

Cedo ou tarde, de um modo ou de outro, a evolução deverá levar o universo ao estado perfeito do sistema.

 

Nada se cria e nada se destrói. O que morre tem de renascer sob outra forma. A substância que desaparece como manifestação no plano físico e dinâmico reaparece em diferente manifestação no plano espiritual.

 

Tudo se desmaterializa com o avançar da evolução, espiritualizando-se em potência e ganhando, ao mesmo tempo, em amplitude de concepção.

 

Quanto mais involuído é o ser, mais a Lei se lhe manifesta dura e inflexível, porque é melhor para ele que seja assim, e porque esta é a única forma que a sua inferioridade lhe permite ver.

 

Tudo pode fazer-se, desde que seja honestamente feito, sem que provenha mal ou prejuízo nem para si nem para outrem, sem que leve ninguém à descida involutiva.

 

A própria verdade é, para o ser, relativa, e está em evolução, proporcionada ao grau de consciência conquistada.

 

Por coisa alguma uma pessoa é tão bem julgada quanto por seus próprios julgamentos.

 

A sociedade, para poder exigir obediência à sua moral, deve antes permitir a qualquer um o mínimo indispensável para que sejam satisfeitas aquelas exigências da vida.

 

Mesmo respeitando nosso livre-arbítrio, a vida nos coage a buscarmos seus superiores objetivos.

 

O habitual destino do gênio na terra é o de ficar abandonado e despojado, ao passo que a riqueza tende a superabundar nas mãos dos especializados em sabê-la acumular.

 

As normas concebidas nos ambientes mais elevados constituem o que se chama a teoria. O modo com que são recebidas, adaptadas e até invertidas no ambiente humano terrestre constitui o que se chama a prática. A teoria é bela, resplandecente, mas a tendência é que seja deturpada e corrompida logo que desce à prática.

 

A idéia do inferno não foi criação de um grupo sacerdotal, mas uma necessidade psicológica, imposta pelo estado de involução em que se achava o homem no passado. Sem esses terrorismos hoje inaceitáveis, o edifício ético, em virtude de sua estrutura mental, teria caído na anarquia. Mas é lógico que tudo isso deva ir desaparecendo, automaticamente, sem danos, logo que o homem, por ter-se civilizado mais, o permita.

 

Para o involuído, a ética precisa estar armada de chicote, pois só assim o levará ao bem.

 

É preciso afastar-se cada vez mais dos grandes absurdos e aberrações do passado, como as guerras santas, as inquisições, os infernos eternos, a benção das armas e as condenações em nome de Deus, como de toda coação espiritual que leva à aceitação forçada, como substituto da aceitação espontânea, por convicção.

 

Se semearmos justiça, colheremos ordem e paz, mas se semearmos injustiça só poderemos colher revolta e mentira. Se, no próximo, quisermos enganar a vida, a vida, através do próximo, nos enganará. Esta é uma realidade à qual não podemos escapar, mesmo se tudo fizermos em nome de Deus, da pátria, de um ideal, do bem da humanidade. Esta é a verdade a que tudo se reduz, para além dos esquemas filosóficos, religiosos, ideais e sociais. As aparências não contam. Se não formos sinceros, teremos mentira, se oprimirmos teremos revolta, se não soubermos mandar para o bem alheio, não obteremos obediência.

 

Para o homem situado no futuro só são possíveis verdades relativas e em evolução. De fato, é isto o que a realidade nos mostra apesar das mais absolutas e dogmáticas afirmações em contrário. Diante do transformismo universal, a que nenhum ser pode escapar porque está imerso no fenômeno da evolução, o absoluto imutável só é admissível como distante meta final, ainda não tocada, e só atingível no término do processo evolutivo.

 

A lei é um sensibilíssimo organismo de forças que, à mínima violação de sua ordem, responde com um proporcionado e adequado contragolpe, que coloca cada coisa em seu lugar, de acordo com a justiça.

 

Os meios para educar são enérgicos, na medida adaptada à capacidade perceptiva dos alunos.

 

Com a desobediência semeamos dor, onde a lei, se fosse obedecida, faria nascer alegria.

 

A Lei é justa e não admite se possa obter uma vantagem sem ser conquistada e merecida.

 

É justo, está de acordo com a Lei, que quem quer enganar seja enganado, que quem se glorie do saber lograr, seja logrado.

 

A primeira coisa que o instinto ensina ao involuído, que tem de viver em regime de guerra, é esconder suas próprias e verdadeiras intenções, como ensina o Maquiavelismo: parecer sincero e honesto, sem o ser.

 

Saber triunfar no mundo, pela força ou pela astúcia, é, na verdade, o maior prejuízo, porque significa fazer parte de planos inferiores de vida e ser condenado a permanecer aí, suportando todos os seus males.

 

Não se podem alegar direitos se antes não se cumpriram todos os deveres próprios, em relação àqueles de quem se reclama.

 

Pode convir mostrar-se bons, porque assim se atrai a estima e a confiança e, com a veste do cordeiro, pode melhor desarmar-se o próximo e obter-se mais.

 

A moral, em sentido lato, torna-se um meio para enganar os simples que acreditam nas aparências.

 

Está-se mais pronto a condenar as culpas que não se tem, do que as que se tem.

 

Na prática, a culpa que mais se condena não é a mentira, mas o fato de ser tão tolo que se deixe descobrir a mentira; não é não ter defeitos, mas o não saber escondê-los, mostrando assim o ponto vulnerável onde se pode ser derrotado.

 

A verdadeira justiça é só aquela da qual não se pode fugir, como a justiça de Deus. A humana é uma luta entre legislador e réu, entre acusador e acusado, entre juiz e julgado, e, ao contrário, na qual vence o mais forte e o mais hábil. Na prática, o maior valor do indivíduo não consiste naquilo que é proclamado em teoria, ou seja, em obedecer à lei, mas na habilidade de saber escapar dela. Lógico que num ambiente de luta, onde reina o culto da força, seja fraqueza obedecer, e valor o rebelar-se.

 

O universo não é apenas um grande organismo que funciona, mas é um organismo que, a cada momento, se transforma para aperfeiçoar esse seu funcionamento.

 

O paraíso perdido a que temos de regressar é a harmonia entre seres que se compreendem e se amam. A evolução tem de realizar esse trabalho de liquidar o separatismo egoísta, a luta, o instinto de agressividade, a desordem, que constituem o inferno dos planos mais baixos.

 

É lógico e justo que cada um sofra e goze em relação ao grau de evolução que, com os próprios sofrimentos e esforços, conseguiu atingir.

 

Cada um vê apenas o que o cerca, até onde pode e só com os olhos que possui.

 

Cada um vê tudo segundo a forma mental que possui, segundo o grau de consciência que conquistou.

 

 

O Sistema – Gênese e Estrutura do Universo (ver livro)

 

 

Também a ciência necessita da intuição, pelo menos para formular algumas hipóteses de trabalho, sem o que não consegue orientar-se, e fica, em seu progresso, sujeita às puras tentativas.

 

Deus não pode ser definido, porque no infinito Ele simplesmente "é".

 

Nós, como tudo o que existe, estamos em Deus, porque nada pode existir fora de Deus, nada lhe pode ser acrescentado nem tirado.

 

Não se pode definir o infinito. O infinito, uma vez definido, não seria mais infinito.

 

O nosso Universo não é a criação, mas uma sua doença que lentamente se vai curando.

 

Tudo é sempre guiado e encaminhado; até mesmo a explosão das forças negativas está enquadrada nos grandes esquemas da Lei; até o mal, a dor e o erro, — por um sábio jogo de forças, reações e recuperações — tudo é sempre reconduzido ao telefinalismo, supremo fio condutor que reconduz tudo a Deus.

 

Na escola da dura experiência, o ser aprenderá que sua vantagem maior não é rebelar-se contra a Lei, como se faz na Terra, mas sim obedecer a ela.

 

O nosso universo, esse que a ciência estuda e que aceitamos como base da pesquisa para o conhecimento, não representa a criação nem o verdadeiro estado do ser, mas apenas um estado patológico transitório, de que, só indiretamente, podemos reconstruir o estado perfeito e definitivo.

 

Não podemos compreender a fundo nosso universo senão como uma inversão, no negativo, da verdadeira criação, pois esta, para poder ser logicamente atribuída a Deus, deve ser perfeita e espiritual.

 

Para nós, situados no relativo, as perspectivas são diferentes. Dessa forma, não só as verdades são relativas à posição particular de cada um, como também são progressivas, ou seja, caminham em evolução e são conquistáveis por aproximações sucessivas.

 

A verdade não se conquista — como as coisas humanas — pela força ou pela astúcia, mas sim pelo amor. A verdade não está escrita, mas fechada no pensamento de Deus, e só se revela a quem mereça conhecê-la, porque esse dará garantia de saber usá-la bem. A verdade abre suas portas e se deixa conquistar pela sinceridade e pureza de intenções, pela humildade do pesquisador e pelo desejo de conhecer para o bem.

 

A verdade se entrega a quem ama, e quem ama procura a unificação com os seus semelhantes, e não o domínio sobre eles. Isto porque a verdade está em Deus, e só podemos nos aproximar de Deus pelos caminhos do amor, ou seja, unindo-nos fraternalmente ao próximo.

 

O mundo está organizado segundo o tipo médio normal, que mais precisa de chefes que o dominem e o domem, do que de compreensão e liberdade para poder realizar investigações, a fim de chegar ao conhecimento da verdade.

 

Como é possível acreditar que a verdade esteja toda e sempre exclusivamente do próprio lado, e que o erro esteja sempre do lado oposto? Isto corresponde à psicologia de quem vive no plano da luta animal, mas não à de quem vive no plano mais evoluído, no qual deveria estar situado o homem.

 

Quanto mais o ser se eleva e, portanto, conhece e se orienta, tanto mais compreende a bondade da Lei de Deus e a utilidade de a ela obedecer. Então, a obediência forçada, como deve ocorrer para um inconsciente, a uma lei determinística, transforma-se em obediência livre e convicta, como deve ser para quem sabe; obediência a uma lei que vence não por constrangimento, mas por convicção.

 

Tudo, qualquer que seja o estado atual e por mais difícil que seja aceitá-lo, se desenvolveu em perfeita lógica, bondade e justiça.

 

Compete, em primeiro lugar, a quem personifica a lei, representar a sua perfeita atuação na ordem e na disciplina. Só quem jamais transgride pode ter o direito de exigir a obediência.

 

Deus deve ser tudo. Se algo existir além Dele, que não esteja em função Dele e que não dependa Dele, então Deus não é mais Deus.

 

Espírito e matéria, com efeito, sempre foram contrapostos um ao outro como dois extremos irreconciliáveis.

 

Em cada sistema orgânico há necessidade absoluta de todos trabalharem de comum acordo.

 

Há necessidade absoluta de respeitar a ordem estabelecida, pois ela é indispensável ao funcionamento de qualquer coletividade organizada.

 

A onipotência de Deus não pode ir contra a lógica e a ordem da Sua Lei, porque se fosse contra ela Deus iria contra Si mesmo.

 

As forças do mal não têm poder algum sobre o evoluído espiritualizado; o poder é qualidade do espírito e se conquista subindo, mediante a evolução para o Sistema.

 

Só há um caminho de saída: conseguir o homem superar, com seu esforço, o seu atual grau de evolução, isto é, que sofra tanto as duras conseqüências de seu atual sistema de vida, até que aprenda a lição e se ponha em outro rumo, agindo com mais inteligência.

 

O conhecimento libertará o homem, pois aquele que sabe conhece a lei e não é mais constrangido à obediência pelo castigo das sanções de dor, efeito do erro. Aquele que sabe obedece por adesão espontânea, porque compreendeu toda a vantagem individual da obediência, a utilidade própria em não violar a Lei.

 

Quanto mais se evolui, tanto mais a liberdade se torna liberdade de obedecer à Lei e sempre menos vontade de a ela desobedecer. De modo que a liberdade suprema das criaturas, no sistema perfeito, nós só a podemos entender como liberdade de obedecer a Deus, espontaneamente, por livre adesão, vivendo perfeitamente harmonizados em Sua ordem.

 

Para ser completa, a filosofia deveria ser também teologia e ciência.

 

Sentimos, por instinto, que a verdade deve ser uma só e sempre a mesma, mas esta é a verdade última, que está além de nosso mundo.

 

A verdade que desejaríamos só poderá ser o fruto da completa reconquista do mundo perdido, porque ela está situada no ponto final da evolução, realizada através do progresso de tantas verdades relativas.

 

A verdade só pode ser atingida por amadurecimento biológico, que é o único que nos pode levar à compreensão, pois é ele que nos abre os olhos da alma.

 

Quanto mais nos sacrificamos no dar, tanto mais sobre nós choverão do Alto ajuda e consolação.

 

Hoje existe apenas inquietude e febre, mas amanhã ocorrerá o despertar.

 

A evolução representa um processo de reconstrução, muito mais do que um processo de criação. Mais do que uma formação do nada, a evolução representa um trabalho de reconstituição, de reintegração do que fora destruído. Não é uma criação nova, mas um despertar.

 

Realizar uma missão é coisa tremenda, tanto mais que é preciso lutar contra aqueles que queremos salvar, contra os irmãos cegos que não querem ver, lutar para que esta voz não seja destruída pelas forças do mal que saturam hoje o mundo, mas lutar a fim de que possa  sobreviver para alcançar as gerações futuras que poderão compreender e agir.

 

Em nosso mundo, os valores mais apreciados são os que valem menos, os fictícios da matéria, e não os reais e eternos do espírito; quem é premiado na luta pela vida é o mais forte, que vence submetendo o próximo, e não o mais honesto, que trabalha a favor do próximo.

 

O valor de um governo depende, mais do que da forma e do sistema de escolha, do valor pessoal dos chefes tanto quanto dos súditos.

 

A reconstrução se opera por graus, através da unificação. E tanto mais adiantada será a evolução quanto mais tiver conseguido unificar princípios elementares, coordenando-os organicamente.

 

Ao subir, a personalidade se transforma, porque a evolução vai da matéria ao espírito.

 

O Evangelho tem um sentido biológico, representa o caminho que a evolução deve seguir na humanidade; tem um valor universal, porque dá uma direção ao desenvolvimento da vida.

 

Renunciar ao próprio egoísmo para colaborar com o seu semelhante não é apenas uma regra evangélica, mas também um progresso social: é uma lei de evolução da vida para todos, sejam de que religião ou filosofia forem.

 

A maior parte das dores que afligem a humanidade depende desse estado de inimizade de todos contra todos, e as dores não poderão cessar enquanto não terminar essa inimizade.

 

Harmonizar-se, como aconselha o Evangelho, não é apenas problema de bondade ou de renúncia, mas também problema de inteligência e de utilidade.

 

E como se pode obrigar um ser, que deve ficar livre, a compreender em seu próprio benefício; como se pode obrigá-lo a recompor-se, livremente, no caminho certo, senão fazendo-o encontrar o caminho errado, atravancado de dores, senão fazendo-lhe compreender seu erro e as suas tristes conseqüências? Para o homem atual, pois, só existe um remédio que possa curá-lo: sofrer.

 

O homem deve superar sempre mais o seu separatismo e com isso aprender a viver coletivamente.

 

Não nos iludamos pensando que podemos atingir Deus assim como somos hoje feitos, sozinhos; mas apenas fundidos em conjunto, abraçados ao nosso inimigo a quem tivermos perdoado, ao ignorante a quem tivermos ensinado, ao inferior a quem tivermos levantado até ao nosso nível, ao malvado que tivermos transformado em bom.

 

Quanto mais a criatura se aprofundar no Anti-Sistema, mais ela ficará submergida na ignorância, e mais virá a perder sua liberdade, que não é uma qualidade que se possa conceder aos inconscientes, que não podem saber fazer bom uso dela.

 

O pensamento de Deus, que dirige tudo, é lógico e previdente. Não se pode deixar a livre escolha de dirigir-se a quem caminha nas trevas, mas apenas a quem dá bastante garantia de possuir conhecimento para não cair e arruinar-se. Por isso, a liberdade chega à proporção que se desenvolvem paralelamente o conhecimento e a inteligência.

 

No homem, o instinto representa a parte que permaneceu atrasada, sob o domínio do determinismo e da inconsciência dos planos inferiores; zona ainda animal, em que só cabe ao homem obedecer à natureza, como os animais. Mas, no seu lado mais alto, o espiritual, ele começa a dar os primeiros passos no caminho da liberdade e do conhecimento.

 

A vida pode ter, para cada indivíduo, de acordo com a sua posição evolutiva, um sentido completamente diferente. Para os inferiores, que saem de baixo, o plano humano pode ser um ponto de chegada bastante alto. Para os mais evoluídos, atentos a subir a planos mais elevados, a Terra pode ser um ponto de partida baixo. Assim, viver em nosso mundo pode representar para os primitivos a maior e mais alegre realização da existência, enquanto, para os mais adiantados, pode constituir doloroso estado de sufocação da vida.

 

A substância da vida é expressa pela consciência de existir. A substância da morte é dada pela perda dessa consciência. Ora, involução significa morte justamente porque representa a perda dessa consciência. E evolução significa conquista de vida, porque constitui conquista dessa consciência.

 

O homem passará, por meio da evolução, da forma mental atual, lógico-racional, à forma mental representada pela intuição.

 

A obtenção do conhecimento é problema sobretudo de amadurecimento biológico. Em outros termos, o grau de conhecimento possuído, de uma verdade para nós relativa e em contínuo processo de conquista, depende do grau de evolução alcançado.

 

A sensação de personalidade, como individuação separada, tal como costuma ser compreendida, pertence apenas aos planos inferiores, e desaparece nos superiores, com a evolução.

 

O que o ser ganha do lado espiritual, deve perdê-lo do lado material.

 

Somos nós mesmos que, com a nossa natureza e nosso grau de evolução, estabelecemos os limites de nosso conhecimento. Muitos outros continentes, além dos da Terra, devem ainda aguardar serem descobertos no mundo do espírito!

 

A ciência, e não as religiões, é que dirige o pensamento humano. Por isso, se as teologias e doutrinas quiserem sobreviver, ao menos entre as pessoas cultas, que sabem pensar, deverão tornar-se racionais e científicas, e demonstrar a sua verdade diante dos fatos.

 

Podemos, dessa forma, considerar como índice seguro de involução, o instinto da destruição, o espírito da agressividade e de polêmica, o egoísmo e a indiferença às dores do próximo.  E podemos ter, como seguro índice de evolução, o instinto de conservação, o espírito de compaixão e de conciliação, o altruísmo e a sensibilidade às dores do próximo.

 

Onde o egoísmo é o ponto fundamental, não pode haver coesão.

 

O involuído é um individualista genérico, no sentido de que só sabe pensar em si mesmo e sabe fazer um pouco de tudo. O evoluído é um ser coletivista, orgânico e especializado, no sentido de que vive em colaboração com os seus semelhantes, e cada vez mais se adapta a executar, na sociedade humana, a sua função específica.

 

A idéia dualista de que há um oposto que deve ser vencido, e que o valor consiste em saber impor-se a ele, é um princípio de cisão e contraste, particular ao Anti-Sistema.

 

O homem imerso no Anti-Sistema cria para si um Deus antropomorfo, feito à própria imagem e semelhança, ou seja, um Deus partido no dualismo, um Deus que luta consigo mesmo, o que constitui o absurdo máximo.

 

A evolução, quanto mais sobe, mais se torna uma reconstrução de valores morais.

 

A idéia de virtude, quando vem à terra, assume em geral as características da luta e da agressividade, próprias dos involuídos; usa-se então o conceito de virtude, não tanto para melhorar a si mesmos, mas para impô-la ao próximo, porque ela, representando um sacrifício, é melhor seja imposta aos outros do que a nós mesmos.

 

A virtude, que é princípio do Sistema, é utilizada de forma invertida, não para melhorar-se, mas para condenar os outros.

 

Tudo, em nosso mundo, se baseia numa contraposição de conceitos opostos, que se completam como dois pólos do ser; são contrários, mas só podem existir um em função do outro; lutam, mas justamente na luta se escoram mutuamente, e um não pode dispensar o outro.

 

Quando um conceito possui valor intrínseco como afirmação de verdade, ele nada terá de temer das negações que, se aparecerem, trabalharão em seu favor. O esforço para destruir a nova verdade é utilizado, pelas leis da vida, para difundi-la, tal como os ventos tempestuosos que trazem destruição são utilizados para levar para longe as sementes fecundas de uma vida mais ampla. E a própria posição negativa, assumida pelos negadores, servirá para destruí-los em favor da afirmação, nutrindo-a com a própria carne.

 

A função da ciência não é de matar a fé, mas de fecundá-la com a razão e com a observação, de demonstrá-la, dando as provas de seus enunciados, que já agora se tornaram, em sua forma primitiva demasiadamente imprecisos e elementares, para poderem ser aceitos pela forma mental moderna, mais evoluída.

 

A verdade, em nosso universo, para os decaídos, só pode ser relativa e progressiva.

 

A nossa mente é filha do próprio ambiente e não sabe funcionar além dos limites deste.

 

Em nosso mundo, jamais vemos Deus agir aparecendo diretamente, mas sempre indiretamente, através de Seus instrumentos encarregados de cumprir missões.

 

Quando nos achamos diante de um efeito inegável, que não se pode destruir, teremos que achar a causa dele, se não quisermos renunciar a compreendê-lo.

 

Hoje, para crer, é necessário convencer, e não basta ordenar por princípio de autoridade. A inteligência desenvolveu-se e ninguém, a não ser um primitivo, está mais disposto a aceitar cegamente o que não estiver claro e provado.

 

O que é novo sempre se encontra diante de uma parede de dogmatismo, para qualquer lugar onde se dirija, porque encontra posições já conquistadas, que procuram aumentar de potência o que já possuem, e não desejam caminhar pelas estradas do progresso. Prevalece sempre o instinto humano, que é o de armazenar tudo na própria casa, excluindo e condenando o que é novo porque, mesmo se está substancialmente de acordo com o velho, se apresenta sempre como uma revolução. Prevalece o instinto de apegar-se à forma, trocando-a pela substância, de aderir à letra que mata, ao invés de ao espírito que vivifica.

 

As religiões se demonstram contrárias a qualquer nova indagação, porque esta pode trazer conclusões novas, diferentes das que já possuem, e dessa forma minar o velho edifício. A verdade já foi conquistada, possuída, e fazê-la progredir significa atentar contra um patrimônio sagrado.

 

O consenso das massas ignorantes não pesa no progresso do mundo. Em qualquer religião elas seguem sempre os seus instintos e se enfileiram sempre atrás dos vencedores, que gritam mais alto. O que interessa é o consenso dos que pensam e dirigem, atrás dos quais segue o rebanho

 

Se a condição para se salvar for a de cortar a cabeça para não compreender, o homem preferirá perder-se com a cabeça a salvar-se sem ela.

 

Quem procura a verdade, não pode ter outra finalidade: caminha sem saber como poderá concluir e deve estar pronto a aceitar sem preconceitos tudo o que venha a ser demonstrado verdadeiro.

 

O livro de Deus está sempre pronto para ser lido e a sua leitura depende apenas das qualidades do leitor. A condição para que esse pensamento cósmico seja alcançado depende apenas da natureza e das condições do indivíduo, tornando-o apto à percepção.

 

O céu não se conquista gratuitamente, adormecendo na inconsciência; não desce até nós, se antes não tivermos lutado, nós mesmos, com a consciência integralmente despertada, para subir a ele; se não tivermos enfrentado a subida com a coragem que só nos pode ser dada por uma grande paixão.

 

Jamais se sente tanto a proximidade e a proteção da divina presença como nas horas de abandono humano.

 

 

A Lei de Deus (ver livro)

 

 

A forma mental moder­na tomou-se mais culta e astuta. Preten­de, por isso, olhar atrás dos bastidores da fé, para ver o que há de positivo, tanto mais quanto aquela fé implica em uma vida dura de virtude e sacrifício. O temor genérico de uma penalidade e a esperança de um ganho, sem saber onde e como, nos céus, começam a ser explorados e percorridos pela ciência, porque não convencem mais as consciências insatisfeitas.

 

No meio de muitas religiões, antes de tudo preocupadas em combaterem umas as outras a fim de conservar e aumentar o seu império espiritual, o mundo continua substancialmente ma­terialista, apegado sobretudo aos seus negócios.

 

Parece que nos milênios da sua vida religiosa, em vez de ser transformado pelas religiões ao realizar os princípios delas, o mundo as transformou para suas co­modidades. Em vez de aprender a viver nas regras da Lei, aprendeu a arte de evadir-se delas com a astúcia das escapatórias para enganar o próximo e, se fosse possível, o próprio Deus.

 

Esta ética, res­pondendo às nossas perguntas e oferecendo uma so­lução razoável aos problemas de nossa vida, ilumina o caminho a percorrer, de modo a poder vê-lo e nele avançar, não de olhos fechados, mas com as vantagens oferecidas pelo conhecimento da Lei e a certeza da sua justiça e bondade.

 

Seria absurdo os grandes ideais existirem para nada, como o homem pregui­çoso preferiria. Apesar da sua indiferença, ele não pode paralisar as forças da evolução na realização do seu objetivo fundamental, que é o progresso.

 

Então, o homem, mais consciente, perceberá a grande realidade que é Deus e, finalmente, para o seu bem, se colocará, obediente, na ordem da Lei.

 

O nosso lema é que o homem civilizado nunca agri­da o seu próximo, e que um ser evoluído nun­ca entre em polêmicas. Eis o que isto significa para nós: quem agride o próximo não é civilizado e quem entra em polêmicas para impor aos outros, à força, as suas idéias, ainda não é evoluído. Não significa ser mau, mas tão somente atrasado no caminho da evolução, como o prova o uso dos métodos que mais se aproximam da fera.

 

Quem destrói, acaba destruindo a si mesmo: quem agride o próximo, agride a si mesmo; quem faz o mal, o faz antes de tudo a si mesmo.

 

Os poderes do intelecto nos foram dados por Deus para compreender e demonstrar a verdade com provas reais, pois que a fé pode apenas vislumbrá-la.

 

Movimentando-nos acertadamente, evitaremos o sofrimento, que é o alarme para avisar-nos de que cometemos um erro; então, este deve ser corrigido para voltarmos à harmonia na ordem da Lei. Enquanto não regressarmos àquela harmonia, a dor não pode acabar.

 

O ser é livre, mas o universo é um concerto musical onde qualquer dissonância produz sofrimento.

 

Quanto maior for a revolta, tanto maior será o sofri­mento, até o homem rebelde aprender, a sua custa, a obediência.

 

O mundo po­de desmoronar e fracassar, mas o prejuízo é só de quem para isso contribuir, pois a Lei de Deus permanece imutável entre tantos crimes e injustiças. Os piores serão os que fracassarem, porquanto os justos e honestos, por não merecerem a reação da Lei, terão a inexorável justiça de Deus em sua defesa. Perante Ele, cada um fica so­zinho com seu destino, para colher o que semeou e receber o que mereceu.

 

Deus vem ao nosso encontro de braços abertos, com uma lei de bondade e de justiça, e receberemos felicidade quando a tivermos merecido, por termos semeado bondade e justiça.

 

Os únicos seres com os quais não podemos concordar são os que não concordam com coisa alguma e pretendem vencer o próximo impondo suas idéias.

 

O homem civilizado procura encontrar, os pontos de concórdia para colaborar, ajudando-se uns aos outros, e não os pontos de antagonismo para a luta e esmagamento recíproco.

 

Não se deve considerar maldade, nem chamar de mau o indivíduo que comete er­ros por não ter compreendido e não sabe fa­zer melhor, porquanto não é ainda suficientemente evoluído.

 

Quando acontece de o homem empregar toda a sua boa vontade, suas qualidades e esforços, colaborando com a vontade Divina, o restante será suprido por Deus.

 

Se procurarmos com­preender e seguir a vontade de Deus, certamente esta vontade virá ao nosso encontro para ajudar-nos.

 

Quem não está orientado nos grandes conceitos da vida não o pode estar tampouco nas coisas pequenas de cada dia, que são conseqüências das grandes.

 

É preciso usar com mais inteligência a nossa vida, tomando-nos ci­dadãos iluminados e conscientes deste nosso univer­so, colaborando com a vontade de Deus, que o diri­ge.

 

Não errar quer dizer não sofrer mais os choques dolorosos que são conseqüência do erro, que por sua vez é violação da Lei. Isso significa evitar sofrimento e proporcionar-nos tranqüila felici­dade, que só num estado de ordem é possível.

 

O verdadeiro êxito na vida consiste no problema de construção de destinos, um problema complexo de longo alcance, que só se pode resolver conhecendo o funcionamento das leis profundas que regem a vida e a posição de cada um dentro dessas leis, ou seja, o plano duma vida enqua­drada no plano geral do universo, em função de Deus.

 

A Lei é boa, sábia, paciente e misericordiosa, mas é tam­bém justa, de uma justiça inflexível, de modo a desencadear-se como um furacão, quando há abuso, a fim de coibi-lo.

 

Seguir a Lei quer dizer seguir a vontade de Deus.

 

Se soubermos a arte de viver em har­monia com Deus, a nossa existência se deslocará do plano da injustiça e da força em que vive o homem, para o plano da justiça e da bondade em que tudo fun­ciona com princípios diferentes.

 

Não importa se o mundo queira transformar-se, cada um pode modificar-se e salvar-se por sua conta. Cada um constrói o seu próprio destino. É lógico que Deus seja justo e as conseqüências ad­vindas de nosso comportamento sejam o efeito de causas engendradas por nós mesmos.

 

Para possuir o de que pre­cisamos e para alcançar sucesso não é necessário força ou astúcia; basta merecer, conforme os ditames da justiça Divina.

 

O mundo está cheio de necessidades porque está cheio de cobiça.

 

Para reconstituir o equilíbrio da Lei, surge a privação correspondente ao nosso abuso.

 

Tudo o que possuímos sem justiça - por não ter ganhado com merecimento ou por não ter feito bom uso - é gasto, consumido, corroído interiormente por esta falta de justiça que mais cedo ou mais tarde vai condu­zir ao fracasso.

 

A vida é uma força inteligente que só defende os que são úteis à sua conservação e desenvolvimento.

 

O que tivermos merecido com as nossas obras não é valor que fica espalhado ao acaso, aonde podem chegar os ladrões, mas está regular e ordenadamente guardado no banco do Céu, de onde nada se pode furtar.

 

Deus está presente para proteger a todos; mas, o benefício dessa proteção, como é natural e justo, só recebem aqueles que compreendem a necessidade de obedecer à Sua Lei.

 

É na aplicação desta nova lei, a do Evangelho, que consiste o segre­do da felicidade e o caminho para fugir dos muitos sofrimentos que nos atormentam.

 

A nossa vida e o nosso destino não se desenrolam ao acaso, mas são dirigidos por Deus.

 

Na vida, há para todos uma parte livre, mas também existe uma parte em relação á qual vigora o princí­pio de aceitação. Aí está a vontade de Deus, e o espírito de nossa desobediência não tem poder algum. Esta parte pode ser triste ou alegre, de satisfação ou de sofrimento, mas é sempre justa, obrigatória, impos­ta pela Lei.

 

O que domina tudo e todos é sempre a Lei, ou seja, a Vontade de Deus. Disso não se pode escapar. Mais cedo ou mais tarde temos de obedecer.

 

O método da acei­tação pacífica resolve o conflito entre a criatura e a Lei, de maneira mais rápida e tranqüila, qualquer que seja a pena a ser paga.

 

Os erros devem ser corrigidos, as dívidas devem ser pagas, a lição deve ser aprendida.

 

Todos obedecem a Deus - os crentes sabendo o que fazem, os descrentes sem o saberem; os bons, de boa vontade, de olhos aber­tos, por amor, sustentados pela justiça de Deus; os maus, de má vontade, nas trevas, revoltados, com raiva, esmagados pela mesma justiça de Deus.

 

Construtores e destruidores, apesar de o fazerem de forma oposta, colaboram dentro da mesma Lei, para realizar a mesma construção.

 

A Lei é sempre boa e justa; se, às vezes, usa o chicote, é para o nosso bem, porque, devido à nossa dura insensibilidade, não há outro meio para nos corrigir.

 

Há dores feitas sob medida para os pobres, os ignorantes, os fracos, os ricos, os homens cultos, os poderosos etc.

 

Deus pode perdoar muito mais facilmente a um pobre ignorante e fraco do que àqueles que possuem recursos, conhecimento e posição de domí­nio. Aos que mais conseguem, materialmente, subir na vida, estão muitas vezes destinadas provas mais difíceis e dores maiores.

 

Qualquer que seja a nossa posição, tudo tende a resolver-se no sofrimento da in­satisfação.

 

Se não houvesse a insaciabi­lidade, tudo ficaria parado na satisfação atingida, estagnado, inerte, num estado em que tudo acabaria apodrecendo.

 

É preciso compreender que este é o esco­po da vida: a busca da própria perfeição.

 

A dor existe porque é um meio para progredir; nele se baseia a evolução, tendo exatamente a maravilhosa função de destruir a dor. Se a dor, que todos percebem e tantas coisas ensina, é meio de evolução, a evolução é meio de salvação.

 

Uma felicidade, ao ser atingida, não é mais felicidade. O homem se acostuma a tudo e tudo perde o valor com o hábito. A satisfação habitual de todos os desejos acaba no enfado. Tudo vale e satisfaz enquanto é luta de conquista, esforço para realizar.

 

Na justiça da Lei está escrito: desfrutaremos de uma satisfação em proporção à necessidade que ela vai compensar e ao esforço que fizermos para atingi-la.

 

Só os ignorantes podem acreditar que seja possível ganhar o que não se merece.

 

O sonho de felicidade aninhado no fundo de cada alma não se encontra ali sem esperança de ser satisfeito, não sendo um im­pulso traidor que tenha a função cruel de nos levar ao engano. Esse instintivo e irresistível desejo de felicidade tem um sentido sadio e verdadeiro, por­que o seu escopo é o de nos empurrar para a frente, constrangendo-nos a experimentar muitas formas en­ganadoras de felicidade, até encontrarmos a verda­deira.

 

Cada desilusão é uma lição aprendida, um erro no qual não cai mais, um degrau ultrapassado na escada da evolução. Se tudo isso parece ser traição, não o é na realidade, e a Lei atinge, assim, o seu verda­deiro objetivo: fazer evoluir o homem.

 

A Lei é justa e nada concede gratuitamente.

 

Cada prova superada representa uma conquista de sabe­doria, um desenvolvimento de inteligência, um enri­quecer de experiências e um amadurecimento supe­rior, que nos conferem novos poderes, os quais nos ajudam a subir sempre mais rápida e facilmente.

 

Quanto mais ascendemos, tanto mais diminui o esforço necessário para continuar a ascen­der, aumentando, ao mesmo tempo, o rendimento de nosso trabalho. Com a evolução, tende a diminuir o esforço requerido para continuar a evoluir, tornando-se todos os benefícios cada vez mais favoráveis.

 

A construção que o ho­mem realiza não está na Terra, mas dentro de si mes­mo.

 

O verdadeiro fruto de nosso trabalho não está na obra realizada, mas na lição aprendida, na qualidade adquirida, no pro­gresso atingido.

 

A Lei não cuida da conser­vação do fruto material, porque é o fruto espiritual que tem valor, e este fica gravado na alma de quem realizou o trabalho.

 

Assim, todas as coisas só nos são dadas por empréstimo, em usufruto temporário. Nosso é o bom ou mau uso que tivermos feito do que recebemos.

 

Tudo o que possuímos na Terra é somente material escolar, meio para aprender.

 

Esta é a lógica da Lei, ou seja, o caminho para chegar à abundância é o desapego.

 

Tudo pode ser obtido e com facilidade, mas só quando não o desejarmos mais com cobiça, porque só então, neste caso, o possuir não representará um perigo para nós.

 

O que impede a chegada da infinita abundância existente em todas as coisas é a nossa incapacidade de saber fazer bom uso delas, esquecidos da verda­deira razão pela qual as possuímos.

 

Por que deveria a Lei atormentar-nos sem uma finalidade útil para o nosso bem? Deus não pode querer isto.

 

Na sabedoria da Lei, o desejo existe para ser sa­tisfeito, e não para ser traído com enganos.

 

A finalidade da posse das coisas não é a de gozá-las, mas a de aprender a ar­te de possuí-las conforme a Lei, fazendo delas não uma prisão que nos prenda em baixo, mas um meio de experiência para evoluir.

 

Nesse ambiente, quem julga ser vantagem cuidar somente seus negócios, sem inquie­tar-se pelo dano alheio, fica automaticamente isola­do e não pode viver senão cercado de armas para ataque e defesa.

 

Na vida não se pode isolar o dano de ninguém. O da­no dos outros acaba, mais cedo ou mais tarde, sendo nosso também. Quem desconhece esse fato sofre também as conseqüências de suas más ações.

 

A Lei propicia as provas na medida da sensibilidade dos indiví­duos e ensina de acordo com a inteligência dos alunos.

 

A Lei é sempre boa e construtiva.

 

No quadro do universo tudo está correto quan­do colocamos cada coisa no seu devido lugar.

 

Há um caminho de libertação da dor: o da evolução.

 

Quando se atinge novo po­der e a posse de maiores recursos, a inteligência necessária para usá-los tem de crescer paralelamente, se não quisermos cair num desastre, cuja finalidade é precisamente a de tirar poderes das mãos daqueles que não merecem.

 

A causa primeira dos nossos males advém do estado de involução em que nos encontramos e para nos libertarmos deles só há um remédio: evoluir.

 

Não há dúvida também que na­da se perde do que tivermos feito com boa von­tade para subir.

 

A Lei é justa e imparcial. Logo, quem semeia o mal colhe o mal, quem semeia o bem colhe o bem.

 

Se sofremos em nossa vida atual, na lógica da Lei tem de possuir um significado e um objetivo. O significado é este: a dor tem como origem as más qualidades por nós ad­quiridas, e o objetivo é explicado pela sua própria função - corrigir os nossos defeitos.

 

O mal e a dor, na perfeição da obra de Deus, são defei­tos que não podem ser admitidos senão como imper­feição relativa e transitória, como qualidades passa­geiras próprias da criatura, ao longo do caminho de sua evolução. Isto é, o mal e a dor exis­tem só para serem corrigidos, transformados em bem e felicidade.

 

Seria um absurdo blasfemo admitir que fosse permitido ao mal e à dor man­charem, de forma definitiva, a obra de Deus, vencendo Sua infinita sabedoria e bondade.

 

A vida exige que o fruto brote de sua própria origem. Para transmi­tir a chama da própria convicção, é necessário possuir essa chama; de outra maneira, não se poderá transmitir senão o gelo da própria indiferença.

 

Quem manda é Deus, e a vida não é dirigida pela prepotência do homem, mas pela sabe­doria, bondade e justiça divinas.

 

Em realidade, a injustiça é fe­nômeno transitório e aparente. Quem verdadei­ramente manda é Deus, isto é, o bem, e as próprias forças do mal acabam trabalhando apenas em função do bem.

 

A revolta con­tra a ordem, permitida por Deus, não consegue, como o homem quereria, subverter essa ordem para sua vantagem, mas o arrasta ao próprio dano.

 

Nossa luta é vencer o mal que inunda o mundo, com as armas da inteligência, da sinceridade e da bondade.

 

Não há somente um funcionamento físico e dinâ­mico, mas também um funcionamento moral e espi­ritual do universo, com as suas leis exatas e fatais, como são as leis do plano físico e dinâmico que a ci­ência estuda.

 

Queiramos ou não, estamos irma­nados à força no mesmo mundo, respirando todos uma mesma atmosfera de fenômenos, sejam físicos, dinâmicos ou espirituais, entrelaçados entre si, de modo que qualquer movimento ecoa e re­percute em todos os sentidos, não podendo parar en­quanto não atingir seus últimos efeitos.

 

Não é possível construir paredes suficientemente fortes que possam separar seres feitos da mesma vida e sujeitos à mes­ma Lei, paredes capazes de isolar a nossa vantagem da vantagem dos outros, ou nosso dano do dano dos outros. Tudo, enfim, se precipita na mesma atmosfe­ra, de onde cai a chuva para todos.

 

O que condiciona nossos julgamentos e idéias em todos os campos é a natureza, as capaci­dades e o desenvolvimento do intelecto. Cada ser não pode viver senão em função da compreensão que possui. Assim, muitas vezes aceitamos como ver­dades absolutas, axiomáticas, idéias que são frutos relativos da nossa forma mental. É neces­sário um controle contínuo, sabendo olhar em profun­didade, para se chegar a compreender a falsidade de tantos conceitos que cegamente aceitamos e que dirigem nossa vida.

 

Quanto mais somos ignorantes, menos elementos pos­suímos, e quanto menos elementos possuímos, mais rá­pidas e absolutas são nossas conclusões.

 

Quem mais se aproxi­ma da verdade é quem julga lentamente, sem abso­lutismo, mas com profundidade.

 

Quando alguém cai na ilusão de supor que, julgando os outros, está assim revelando-os e colocando-se acima deles, na rea­lidade apenas está submetendo-se a julgamento, descobrindo-se e mostrando a todos seus próprios modos de ser.

 

Se a vida do homem não fosse dirigida por uma men­te superior à dele, como organismo físico, como estru­tura social, como desenvolvimento histórico e como ascese es­piritual, este mundo já teria fracassado há muito tempo.

 

Pertence­-nos então o poder de nos construirmos como quiser­mos. É lógico, portanto, que nos pertençam a responsabilidade e as conseqüências dessa escolha.

 

As qualidades e os instintos adquiridos, por automatismos, constituem nossa personalidade com todos os seus recursos, por meio dos quais ela continuará funcionando com a característica automática desses instintos, pelo menos até que não sejam corrigidos.

 

Em cada momento de nossa vida estamos construindo, com os nossos atos, o edifício de nosso eu, isto é, nosso espírito, nossa psicologia e também, como conseqüência, o corpo onde moramos.

 

De­pois de praticada uma ação, qualquer que seja sua na­tureza, temos de colher seu resultado, bom ou mau. Se tivermos semeado o bem, a alegria será nos­sa e ninguém dela nos privará. Se tivermos se­meado o mal, o sofrimento será nosso e ninguém no-lo poderá tirar. No caso de erro, há um só remé­dio: a dor estará ali para nos avisar de que erramos. À nossa frente há sempre um caminho virgem, onde teremos oportunidade de endireitar o passado. Mas, o impulso renovador tem de partir da nossa vontade que, como vimos, é a primeira força geradora do nos­so destino.

 

O aviso tem de ser entendido e o sofrimento cresce em proporção à surdez.

 

Os erros cometidos no passado, próximos ou remotos, são a causa dos nossos sofrimentos atuais, podendo ser corrigidos e significar a libertação da dor. De outra maneira não necessitaríamos estar presentes na Terra.

 

Importante não é a posse material conseguida, relacionada com nosso corpo e perecível como ele, porém nossas qualidades boas ou más, imperecíveis e inseparáveis da nossa individualidade espiritual.

 

É mais rico um pobre merecedor da riqueza, porque ela lhe chegará, do que um rico merecedor da pobreza, porque esta também lhe terá de chegar.

 

O que recebemos na vida não é um fim em si mesmo, objetivando nos­so gozo, mas um instrumento de experiência e aprendizado para evoluirmos.

 

Os meios de que a Lei usa para ensinar são proporciona­dos ao grau de sensibilidade e compreensão atingido pelo ser.

 

Cada movimento do ser repercute na Lei e, conforme a natureza e o ti­po de vibração irradiada, movimenta determinado sistema de forças nos diferentes pontos correspondentes, ge­rando uma resposta a essa excitação, respos­ta feita sob medida à vibração corretora dos nossos er­ros.

 

Quando foi dada origem a uma causa, conseqüentemente foi movimentada uma força; para anulá-la, é necessário exau­ri-la até seus últimos efeitos.

 

Para cor­rigir o velho caminho é necessário percorrê-lo todo, em sentido contrário.

 

Não é possível construir sobre novos alicerces, desprezando os já conquistados.

 

Existe um paraíso para todos, mas a maioria não quer realizar o esforço de subir até ele.

 

A felicidade que alcançamos por meios ilícitos ou atalhos, para escapar a Lei, não é o salário merecido de nosso trabalho, mas sim um roubo, como algo conseguido fraudulentamente.

 

Não se pode evadir da justiça de Deus. O dia da prestação de contas acabará por chegar e tudo terá de ser pago.

 

Tudo, em cada momento, é efeito e causa ao mesmo tempo, fruto do passado e semente do futuro.

 

Quanto maior for a ve­locidade adquirida, tanto mais difícil será parar e mudar a direção da queda.

 

A sabedoria e perfeição da Lei manifestam-se também na capacidade de recuperação, a qual deixa o ser livre para experimentar as conseqüências do mal e lhe permite, desse modo, adquirir uma sabedoria sempre maior e assim reconstruir o que ele, na sua ignorância,  destruiu.

 

Não há coisa tão difícil como a de sair da própria forma mental. Ninguém compreende além de suas possibilidades, constituindo o próprio acervo adquirido com sua experiência e evolução.

 

O maravilhoso é que a Lei de Deus está pronta a entrar em ação em qualquer lugar, inclusive em nosso mundo inferior, tão logo a aceitemos e a vivamos.

 

Viver e agir ao lado da Lei e de Deus quer dizer operar con­forme a justiça.

 

Deus protege os justos, os quais merecem, por sua vez, a Sua prote­ção. Quando um homem se coloca, pela sua con­duta, do lado oposto ao da Lei, do lado da anti-Lei, emborca-se a situação. Deus não o protege, não o pune, nem se vinga. Deixa o ser na posição escolhi­da por ele mesmo, a de quem esta fora da Lei. Então, ele fica abandonado, sozinho, entregue apenas às suas pobres forças, o que quer dizer perdido e sob o poder de todas as forças negativas que procurarão unicamente destruí-lo.

 

Tudo fica submetido a sanções invencíveis e absolutas, que o ser não pode, de boa ou má vontade, repelir.

 

A evolução se reali­za da matéria para o espírito, sendo nós próprios os construtores desse caminho.

 

Se adotamos um bom com­portamento e não cometemos mais erros, violando a Lei, vemos que está ao nosso alcance criar para nós destinos sempre menos duros, porque estarão menos carregados de erros a corrigir e culpas a expiar.

 

Está em nossas mãos o poder de criar nossa felicidade.

 

O problema da salvação é problema absolutamente individual, independente da vontade dos outros.

 

É possível ter boa conduta e ser justo em todas as religiões. O que importa é a substancia, é preciso ser justo.

 

Muitos males acontecem ao homem por falta de entendimento. Mas, quem sofre é levado a pensar por que está sofrendo. Pela experiência que se vai adquirindo aprende-se a cometer sempre me­nos erros.

 

É um dever esclarecer os mistérios, iluminar as mentes e orientar o próximo. Ficar na ignorância significa permanecer nos níveis mais baixos da vida, cheios de erros, ferocidades e sofrimentos.

 

Procuremos conquistar nós mesmos as virtudes, antes de exigi-las do próximo.

 

Ninguém pode lançar o peso de seu destino sobre nós, como nós não pode­mos lançar o peso de nosso destino sobre os outros. Se assim fosse não haveria justiça.

 

Podemos ficar tranqüilos, pois ninguém pode fazer-nos mal algum que já não esteja dentro de nos, por nós bem merecido, por termos sido os primeiros a querer realizá-lo.

 

A nos­sa tarefa não é fazer mais um tratado de mo­ral ou de religião. Não é deles ou de pregações que temos falta, mas da sua aplicação na vida pratica.

 

A grande maravilha da Lei é que ela responde a cada um conforme sua natureza.

 

Os bons, se é verdade que podem ser esmagados pelo mundo, nada têm a temer de Deus; enquanto os maus, se, por um momento, podem vencer no mundo, muito têm a temer por parte da justiça de Deus, que os constrangerá a pagar até o último ceitil.

 

As forças da vida são movimentadas pela Lei, de maneira que a compreensão terá de chegar.

 

Quando resolverá o homem, vítima do seu atraso, avançar para a conquista aos novos continentes do espírito, que o esperam? Quando conseguirá ele, pre­so na sua forma mental, quebrar as paredes dessa sua prisão? Quando quererá resolver de uma vez para sempre todos os seus problemas, evoluindo? Tudo depende da boa vontade e do próprio esforço.

 

A Lei esta acima das religiões e filosofias particulares, as quais abrange, por ser lei univer­sal da vida e dela ninguém pode fugir.

 

Não há coisa alguma que esteja ausente do pensamento de Deus.

 

O ser humano é relativo e cada um precisa acreditar na verdade que seja mais adaptada à sua forma mental.

 

 Podemos oscilar livremente de um pólo a outro, do bem para o mal, da luz para as trevas; po­demos deslocar-nos para qualquer posição da vida, mas ficaremos sempre dentro do Pensamento e da Vontade de Deus, isto é, dentro da Lei, atmosfera espiritual em que todos vivem e existem no universo e da qual ninguém pode sair.

 

Um dos maiores problemas que o mundo de ho­je tem de enfrentar e resolver é o da unificação em todos os campos: político, econômico, demográfico, religioso, social.

 

A evolu­ção quer todos os egocentrismos separatistas fundi­dos num estado orgânico, situação futura da huma­nidade.

 

De todos os lados, tudo nos confirma que a vida progride do caos para a ordem, da desenfrea­da liberdade para a disciplina. Nisto consiste o progresso, que e a realização da Lei.

 

Quanto mais um homem é civi­lizado, tanto mais deve considerar a presen­ça, exigências e direitos dos outros; deveres que exigem, também, reciprocidade. Tanto menos lhe é permitido ser individualista, egocêntrico, indiferente à vida dos outros.

 

Ter de respeitar os direitos dos outros pode constituir, às vezes, uma renúncia a própria liberdade; porém, esse sacrifício torna-se bem pago quando por ele recebemos, como recompensa, respeito para com nossos direitos.

 

A disciplina é ainda formal, exterior, de su­perfície. Representa tudo o que o homem conseguiu alcançar até hoje, mas, com o progredir da civilização, a ordem terá de tomar-se sempre mais subs­tancial, interior e profunda, até transformar-se de simples regra de boas maneiras em compreensão recí­proca, em psicologia de colaboração e unificação, até atingir o nível do amor para com o próximo, anuncia­do como meta final pelo Evangelho de Cristo.

 

Quanto mais o homem for evoluindo, tanto mais perceberá que, para sobreviver na luta pela vida, há uma força mais po­derosa do que a violência, a prepotência, a astúcia, a mentira e a traição: é a força da inte­ligência, da honestidade, da bondade.

 

Quanto mais evoluímos, tanto mais a Lei nos discipli­na, irmanando-nos e conduzindo-nos à unificação.

 

A vida oferece lições proporcionadas ao plano de existência em que o ser se situa, de acordo com suas vicissitudes.

 

Cada nível tem de cumprir um gênero particular de experiência, conforme o tipo biológico que o ser deve construir.

 

En­quanto o ser permanece em determinado plano, ele adota a moral desse plano com naturalidade, mas quando sobe para um plano superior, escandaliza-se com a moral do inferior, que se torna corrompida e ilícita. Tudo depende do nível de onde parte o julgamento.

 

A punição e o prêmio são inerentes à própria natureza do indi­víduo e se realizam automaticamente, sem castigo nem vingança, correspondendo à posição de ca­da um.

 

Cada um recebe conforme a justiça, segundo o que é, porque, de acordo com o seu nível, se coloca no de­grau que lhe pertence ao longo da escada evolutiva. Justiça automática, inflexível e perfeita, porque cada um traz em si mesmo o julgamento, a pena ou a recompensa nas condições de vida que merece.

 

Se os instintos não se modificarem paralelamente à evolu­ção, as qualidades que antes eram úteis à vida tornam-se prejudiciais, à medida que ela progride.

 

O egoísmo separatista e o desenfreado in­dividualismo do homem primitivo devem transformar­-se no altruísmo unificador, indispensável ao homem evoluído, habitante do estado orgânico da futura humanidade.

 

A função da Providência Divina é a de conduzir o ser para sua salvação final , levando-o à felicidade.

 

Não é escra­vizando-nos que a Lei nos guia para nosso bem, o que não se poderia conciliar com a bondade de Deus, mas compelindo-nos indiretamente, sem violar nossa liberdade.

 

Através da própria experiência, o ser vai cada vez mais relacio­nando sua dor com o erro cometido.

 

Todos procuramos atingir a maior satisfação, e isto não é contrário à Lei, pois que esta quer a nossa felicidade. O que está errado não é esse desejo em si, mas, devido a nossa ignorância, os meios escolhidos para realizá-lo.

 

Todo abuso fere e machuca para nos ensinar a lição da ordem e desenvolver em nós o instinto do au­tocontrole e o sentido do equilíbrio. Vamos assim aprendendo, através de tantas experiências de uso e abuso, a viver na ordem, fazendo de tudo bom uso.

 

A vida não pode basear-se em valores fictícios, mas exige valores reais. Quem não faz nada, não recebe nada, até aprender a fazer alguma coisa com valor. Esta é a justiça da Lei de Deus.

 

A reação corretiva corresponde exatamente à natureza e proporção da culpa.

 

A Lei é o pensamento e a vontade de Deus, e se fosse possível destruí-la com a revolta, seria possível também destruir Deus, o que é o mais inaceitável dos absurdos.

 

Quanto mais o ser é involuído, tanto mais tem de sofrer, experimentar, aprender é, com isso, evoluir.

 

A correção dos erros e a retificação do caminho errado são automáticas, progressivas e absolutamente necessá­rias.

 

Quanto mais o ser sobe e aprende, tanto mais reduzida se torna a amplitude do erro, até desaparecer. Com a evolução, o mal vai sendo progressivamente cercado, sitiado sempre mais de perto, até não lhe sobrar mais espaço, acabando por ser eliminado.

 

Para amadurecer os involuídos, são necessários choques proporcionados à sua ignorância e insensibilidade.

 

É bom que o mundo sofra as conseqüências dos seus erros, porque assim, para seu bem, ele vai aprenden­do a não errar mais.

 

Se não existisse a dor, se não houvesse esse nosso irresistível desejo de fe­licidade e essa triste insatisfação enquanto ela não é atingida, quem nos movimentaria ao longo do caminho da evolução e quem nos impulsionaria pa­ra a subida? Sem a insatisfação e a dor, a nossa pre­guiça paralisaria tudo, que ficaria estagnado na mor­te.

 

Quem se revolta contra a disciplina da Lei se rebela contra sua própria sal­vação.

 

A maior inclinação do indivíduo pa­rece consistir em pensar só em si, descuidado dos prejuízos que pode causar aos outros. Surgem assim os astutos seguidores do caminho mais curto. A sua maior tentação é a de passar a frente dos companheiros de viagem. Escolhem as estradas mais fáceis, que encur­tam distâncias, para serem os primeiros a chegar a qualquer custo. Infelizmente, a inteligência deles está se desenvolvendo só neste nível primitivo do individualismo caótico, ainda incapaz de compreender qual­quer forma orgânica de funcionamento coletivo.

 

Os primitivos estão apegados às verdades pequenas que se podem tocar com as mãos, às que eles julgam como realida­de objetiva e única, enquanto negam, porque lhes escapa, qualquer outra realidade mais vasta e longín­qua.

 

A ferocidade fica abandonada nos planos inferiores para os atrasados que ali ainda permanecem, desenvolvendo-se sempre mais a inteligência e valorizando-se as qualidades da mente.

 

 Com a evolução, desaparecem mandíbulas e garras, agressividade e ferocidade, armas e destruição, para que vença a inteligência cria­dora e pacífica.

 

Tudo na vida existe porque tem uma função a cumprir. De outro modo não existiria.

 

A evolu­ção conduz à união, e o indivíduo quanto mais evo­luído, tanto melhor sabe viver em forma orgânica.

 

A baixa in­teligência de luta e as astúcias que conduzem à de­sordem se transformarão na superior inteligência da disciplina na ordem.

 

Para que o pro­blema seja resolvido, eliminando em definitivo os efei­tos, logicamente é necessário que seja removida não somente a causa próxima deles, mas também a causa primeira, de que tudo deriva.

 

Como pode Deus deixar uma função tão impor­tante, como a da Sua justiça, ficar abandonada nas mãos dos agressores, dando-lhes o poder de julgar e punir o que só a Ele pode pertencer, por­que é o único que sabe o que faz?

 

Não pode surgir um ataque contra nós se não o tivermos merecido.

 

Ninguém poderá atingir-nos, se não tivermos, com nossos erros, praticado injustiças.

 

O remédio, então, é um só: não merecer a ofensa, isto é, tomar cuidado em preparar o futu­ro, não errando em ir contra a Lei e não merecendo, assim, sua reação.

 

O inimigo que nos agride somos nós mesmos, que, com o erro, provocamos a reação da Lei que, por sua vez, movimenta os elementos apropria­dos para executar essa reação.

 

Quem faz o bem, como quem faz o mal, o faz a si mesmo.

 

Quem compreendeu, ao receber o ataque, aceita-o como li­ção das mãos de Deus, que isso não quer vin­gar-se, nem punir, mas endireitar-nos, para que saia­mos do erro e do sofrimento.

 

Quando alguém nos ataca, isso acontece conforme a justiça de Deus. Nossas contas são com Deus e não com nosso inimigo.

 

Ninguém pode receber ofensa que não tenha sido merecida

 

Há uma Divina Providência para cada um. Mas, para ser justa, ela providencia o bem para os bons e o mal para os maus.

 

O Evangelho não tem só um sentido moral e religioso, mas também biológico e social, que a ciência um dia terá de compreender.

 

Se o Evange­lho não nos impele contra o ofensor, antes nos leva ao perdão, encontra plena justificativa no fato de que a verdadeira causa que devemos comba­ter não é o ofensor, mas nós mesmos, que, perante a Lei, merecemos a ofensa.

 

Tudo o que se faz contra a ordem da Lei tem de ser pago, porque só assim pode ser reconduzido à sua ordem.

 

A primeira coisa a fazer para alcançar a justiça é renunciar à vin­gança.

 

O primeiro passo, então, é renunciar a vingança. O segundo é perdoar a ofensa. Mas, há ainda mais. Embora renunciando à vingança e perdoando a ofensa, não devemos reter sua lembrança, nem guardar rancor e ódio por ela gerados.

 

O importante é ficarmos isentos de qualquer dívida; o segredo da vitória não está na força que possuímos, mas no fato de estarmos limpos de qualquer mancha.

 

À força de injustiças, nunca será possível chegar à justiça, ao passo que, perdoando e es­quecendo, entregando tudo à Lei, não poderão ser derrogados e terão de ser solvidos, em perfeita justiça, o débito do ofensor e o crédito do ofendido.

 

Cada um está adaptado ao seu plano de vida, sem destruir as vantagens do progresso.

 

Para que, em relação a nós, possa funcionar a Lei da jus­tiça, é preciso antes de tudo nos coloquemos dentro da justiça desta Lei e não fora dela.

 

Para poder reclamar justiça é indispensável viver no terreno da justiça.

 

Para a Lei funcionar a nosso favor é necessário que sejamos inocentes, e que não tenhamos culpas a ressarcir.

 

Para que possa funcionar o método da não-resistência, é necessário, primeiramente, termos pago à justiça da Lei todas as injustiças que antes praticamos contra o próximo.

 

Só ao mundo pertence o erro de enre­dar-se no sistema desequilibrado de reações e injus­tiças recíprocas, num encadeamento sem fim, porque não se pode reequilibrar o desequilíbrio acrescentan­do novos desequilíbrios. E ao equilíbrio não se pode chegar a não ser pelos caminhos reequilibrastes da não-resistência.

 

A grande loucura do mundo é querer chegar à justiça pelos caminhos da injustiça.

 

A justiça tem de ser absoluta e imparcial, e não relativa e partidária, em função de interesses particulares.

 

A maioria acredita viver no caos e procura agarrar no momen­to o mais que pode, não  suspeitando que vive num universo orgânico, onde há de tudo, de sobejo e sem­pre a nosso dispor, se fizermos movimentos certos con­forme as normas da Lei.

 

Se a posição se baseia na força e na astúcia, ela vai durar enquanto houver força e astúcia.

 

Esta é a justiça do mundo. Neste, um santo não pode ser chefe, porque não pertence ao nível evolutivo da maioria, não possuindo a sua forma mental, nem os métodos de domínio que ela pode compreender e exigir.

 

Tratando-se de um plano inferior de vida, quem nele vive não pode deixar de ficar sujei­to às ilusões que lhe são relativas.

 

Quando o ser atingir determinado nível evolutivo, deve elevar-se ao seguinte.

 

Enquanto existir ovelhas inexperien­tes, sem conhecimento, precisando de pastores, é lógico que estes apareçam para dirigi-las.

 

Se a opressão dos chefes gera a dor nos seus subordinados, nestes ela acorda a inteligência que os fará vencedores. Assim, a posição de dominantes e dominados é posição per­corrida por todos, para que todos aprendam a mesma lição na escola da vida.

 

Um direito é considerado tal somente quando quem o sustenta possuir os meios para reali­zá-lo.

 

Bondade, carida­de, compreensão recíproca, aparecem só em níveis superiores de vida.

 

O mundo progri­de, assim, para a justiça social, a igualdade, o altruís­mo, as formas de vida organizada, coisas que perten­cem a níveis evolutivos mais adiantados.

 

Ter experimentado as conseqüências do abuso representa o melhor meio para não ter mais vontade de re­petir o abuso.

 

Parece que em todos os planos, cada impulso tende automaticamente a voltar à origem de onde partiu e este seja um dos princípios fundamentais da Lei.

 

Não somente para o indiví­duo é verdade que quem faz o bem ou o mal o faz a si mesmo, mas também o é para as diferentes classes, camadas ou grupos sociais.

 

O processo é sempre o mesmo O homem tem de experimentar os dolorosos efeitos da injustiça, da desordem, do egoís­mo, para chegar a compreender que o mais provei­toso para si mesmo é que se realizem a justiça, a or­dem, o altruísmo.

 

Acima de todas as rivalidades do formigueiro humano, permanece res­plandecendo a sabedoria da Lei, invisível, poderosa, inflexível, sempre presente. Nela tudo se compensa, se coordena, se resolve.

 

A finalidade de qualquer religião deveria ser sempre a de pacificar e unificar. Qualquer religião que não trabalhe nesse sentido pode considerar-se irreligiosa, realmente contrária à reli­gião.

 

Também no terreno religioso, a evolução dirigir-se-á cada vez mais para a uni­ficação, dado que esta é sua direção.

 

O maior erro é considerar errado tudo o que está fora do grupo; a maior heresia é considerar heréticos todos os que pensam diferentemente; o maior pecado é não respeitar as consciências alheias.

 

 

A Técnica Funcional da Lei de Deus (ver livro)

 

 

Enquanto o involuído permanecer fechado nos estreitos confins da pequena verdade individual, em antagonismos com a dos seus semelhantes, o evoluído é, ao contrário, levado a conhecer verdades sempre universais.

Cada um no seu nível está certo e, na sua ignorância, tem razão. Ele é, pois, a seu modo, inocente.

A vida costuma usar a mentira, quando não há outro meio, como elemento de conciliação entre opostos.

Mentir não é honesto e é necessária muita insensibilidade moral para adaptar-se à mentira.

É preferível um ateísmo sincero e convicto a uma falsa religiosidade.

Todo abuso produz uma privação na mesma proporção.

Toda generosidade produz abundância.

Diante do abuso não há outro remédio senão o justo pagamento que corrige a inversão recolocando-nos na ordem, de acordo com a Lei.

Orar e invocar é útil, mas só como acessório. O problema não será resolvido até que todo o trabalho da subida e do pagamento tiver sido realizado.

A dor desenvolve a inteligência e isto significa evoluir, representando conseqüentemente a solução de todos os males e o maior bem possível.

Não se podem abraçar direitos senão quando se faz tudo para merecê-los.

Ninguém pode escapar da obediência à Lei sem pagar as conseqüências.

O ateísmo não é contra Deus, mas somente um anticlericalismo, isto é, contra a concepção eclesiástica de Deus.

Deixemos de lado o Deus fabricado pela religião para seu uso eclesiástico. Seus fins e funções são limitados ao grupo que o elegeu como cabeça para satisfazer suas necessidades.

A ética poderá tornar-se uma ciência exata e isso é possível porque ela faz parte de uma lei justa.

A Lei responde restituindo o que lhe foi dado e dando o que foi merecido.

Fundamental na Terra é o problema biológico da luta pela vida, e não o da busca da verdade.

Interessa ao homem a satisfação imediata das suas necessidades, não conhecimento por si mesmo.

Tanto o realizador prático quanto o idealista têm, cada um, sua sabedoria, mas em função de pontos de referência diversos.

A justa posição é a de usar os valores do mundo, mas não como única finalidade, e sim apenas como meio para conseguir um fim mais alto e longínquo, aquele proposto pelo ideal. Aceitar assim o mundo, mas em função de uma superação.

Para redimir-se é fundamental a correção das trajetórias erradas.

O que cada um faz, bem ou mal, fá-lo para si mesmo, por sua conta, sob exclusiva responsabilidade de suas próprias conseqüências.

Aprende-se sofrendo o que não se é capaz de aprender raciocinando.

Não é a Lei que inflige a dor, mas o indivíduo que a inflige a si mesmo, indo bater a cabeça contra o muro imóvel da inviolável resistência da Lei.

Se a primeira fase é a de livre plantio das causas, a segunda fase é a da fatal colheita dos efeitos.

A lei, sendo um conceito ou princípio imaterial, não se manifesta em nosso plano, senão através das forças e formas que a exprimem.

Na sabedoria da Lei, mesmo o mal termina por desempenhar uma função de bem.

À felicidade não se poderá jamais chegar pela via fácil da descida, mas somente pela via difícil da subida, como é adequado, ganhando a felicidade.

Não basta receber uma lição; é preciso também absorvê-la. Não basta obter resultados; é preciso também assimilá-los e fixá-los na própria personalidade, transformando-os nas suas qualidades adquiridas.

A cada um corresponde a responsabilidade pela sua culpa e a fadiga da redenção.

Tudo é justo, porque a primeira causa de tudo é nossa.

O bem não pode passar gratuitamente de quem o quer fazer a quem não o mereceu.

Para eliminar a dor bastaria compreender quais são as suas causas, e não provocá-la mais, semeando-a.

Somente na ordem é possível ter, sem prejuízo, uma liberdade completa. Essa não se pode conceder na desordem, porque seria desastrosa pelo fato de que gera subitamente abuso, o que somente num regime de perfeita disciplina não ocorre.

Ser ateu ou crente é a mesma coisa quando o somos honestamente. Salva-se quem é honesto, ainda que ateu, e perde-se quem é desonesto, mesmo se religioso e crente. Compreende-se assim que as religiões de nada valem quando não são vividas honestamente, e que a hipocrisia representa para elas um perigo mortal, um mal que termina por matá-las.

Diante das leis dos fenômenos, as ideologias de nada servem. Só por ignorância se pode crer que nossa fé e nossas opiniões podem mudar alguma coisa no funcionamento da realidade.

O destino é realmente fatal. Ele é fatal, porém, na sua fase de efeito e não na fase de causa.

Torna-se necessário ter uma conduta reta, porque as nossas obras nos seguem, e suas conseqüências não nos deixam mais até que as tenhamos exaurido plenamente.

Sobre a nossa liberdade prepondera a Lei, que, se não nos limita na escolha das causas, nos liga aos seus efeitos, de que não nos permite evadir.

O verdadeiro rico e poderoso é aquele que é proprietário de um bom destino, é o indivíduo cuja personalidade é composta de forças benéficas, positivas, sadias, que, por sua vez, lhe atraem eventos favoráveis.

É certo que o destino, pela lei de causa e efeito, é fatal; porém se soubermos lançá-lo na direção justa, ele será fatal a nosso favor, ao passo que o é em nosso prejuízo se, como freqüentemente acontece, o lançarmos na direção errada.

Pode-se, pois, passar do egoísmo a um verdadeiro altruísmo sem hipocrisia, levando em conta a realidade biológica e pedindo apenas o que a vida pode dar. Só se pode passar do egoísmo ao altruísmo através da dilatação do primeiro, e jamais por sua negação antivital, contra qual o ser se rebela, concedendo apenas uma aceitação fictícia em forma de mentira.

Tentar aproximar-se da perfeição, embora vivendo num estado imperfeito, é a solução. Não é necessário que o homem compreenda aquilo que faz. A vida se ocupa de obrigá-lo a fazer aquilo que para ele é o melhor e isso automaticamente.

A hipocrisia, que desejaria usar o Evangelho como um refúgio para poltrões, pode valer no plano humano diante do mundo, mas jamais diante da Lei.

A inocência não exime das provas, sendo o estado que mais precisa da escola para aprender.

A dor não deve, pois, ser entendida como uma punição por parte de um Deus ofendido, mas como uma benéfica salvação daquele que se queria perder.

O fim é a sua salvação e não uma vingança pela ofensa recebida. Deus não pune e muito menos se vinga, porque ninguém tem o poder de ofendê-Lo.

O mal não pode fazer o mal a um bom que não o mereça, mas pode acrescentar o mal a quem o merece, somando-se a ele, porque, neste caso, são-lhe abertas as portas para entrar, em vez de fechá-las para impedi-lo.

Por mais que se tente fazer o contrário, não é possível fazer o mal senão a si mesmo, nem fazê-lo a um bom que o não tenha merecido.

A Lei não permite a injustiça, nem que se sofra sem culpa, porque não há sentido em corrigir um erro não cometido.

O bom não pode fazer o bem a um mau que o não haja merecido, e, quando pode fazê-lo, isso só acontece na medida em que este o mereceu.

O destino nunca atinge globalmente, mas apenas em dados pontos, poupando-nos, favorecendo-nos e até mesmo ajudando-nos em outros.

Quando somos justos, Deus nos ajuda e, para sermos ajudados, é preciso tê-lo merecido.

A cada santo é necessária a colaboração de um diabo. Este, com a sua perdição, se sacrifica como instrumento agressor – necessária condição daquela santidade – instrumento que funciona como resistência a vencer, prova a ser superada, a fim de que se estabeleça o triunfo do santo.

O rebelde terá uma pena proporcional a culpa, nunca ilimitada, mas limitada segundo a justiça, tanto mais que a finalidade da Lei é educar, corrigir e não usar de inútil crueldade.

Quem se mete a esperto acreditando de tal modo conseguir a felicidade sem esforço, viola a ordem, vai contra a justiça, faz o mal e assim termina, na realidade, por fazê-lo a si mesmo, colhendo,ao contrário, dor.

Não seria justo que a lição salvadora se pudesse gratuitamente tomar da ciência alheia, enquanto a justiça quer que aquela lição não se possa aprender senão por experiência própria, através da própria dor.

O mal camuflado se torna mais corrosivo do que aquilo que é escandalosamente visível.

Só é válido o método de recebermos segundo a justiça, sem a qual nada se obtém.

Uma redenção gratuita seria uma violação da justiça do Pai.

Para compreender é necessário ter a forma mental adequada e a do mundo está emborcada, levada, pois, a conceber e entender tudo segundo uma perspectiva deformada.

Pode-se violar a Lei, mas ninguém se pode furtar às conseqüências, proporcionais à violação.

A finalidade da dor não é a vingança nem a punição, mas a de ensinar, para não repetir o erro e assim evitar o próprio dano, a fim de seguir na direção do bem e da própria felicidade.

A ordem, num certo sentido, é violável, mas tende automaticamente a reconstituir-se.

A evolução não é uma realização ociosa, mas uma vontade obstinada, uma tendência constante a realizar-se.

A Lei não é um código morto escrito, mas uma corrente viva e pensante, sempre em ação, funcionando no íntimo de tudo o que existe no incessante processo do seu desenvolvimento.

Não é possível atingir subitamente a zona do ideal sem ter antes vivido as experiências terrestres necessárias à maturidade.

Na ascensão evolutiva, a Lei não admite fugas fáceis do cumprimento do dever que nos compete.

Todas as experiências terrestres são necessárias e as místicas fugas, salvo condições especiais do ser, são contraproducentes.

Seria injusto que o homem pudesse redimir-se somente ouvindo um belo ensinamento que outros gratuitamente lhe oferecem. A justiça, no entanto, quer que tudo seja conquistado e merecido.

É evidente que a inteligência que serve apenas para prejudicar os outros e aqueles que a possuem, não é inteligência, quando muito é a inteligência do louco, cuja finalidade é unicamente a autodestruição.

Mesmo os loucos, a seu modo, são astutos. Mas seria justo chamar-se isso de inteligência?

Um organismo não se pode construir senão sobre a coesão, entre termos que se atraem, nunca sobre a guerra, entre termos que se repelem.

O homem se torna consciente da presença do pensamento diretivo da existência, compreende a técnica do funcionamento de tudo, pode, portanto, inserir-se nele, harmonicamente, dirigindo-se para os fins aos quais tende, sem os erros e as dores que acompanham o processo. Em lugar de ser dirigido sem saber, o homem pode dirigir a sua vida, sabendo. Em vez de receber inconscientemente a orientação das forças da Lei, ele pode conscientemente funcionar paralelamente com elas, permanecendo de forma espontânea na ordem ao invés de ser a isso obrigado pelas sanções corretivas.

As religiões representam, ao contrario, a fase infantil da humanidade. Mas elas são úteis no seu tempo, justificadas pelo fato de constituírem um degrau necessário para chegarem, elas também, à fase adulta, em que fundirão com a ciência.

Apenas aparece a cultura, desaparecem o fanatismo e a superstição.

Para dar-se conta de um erro, é preciso experimentar-lhe as conseqüências.

A ciência, com a mente racional e objetiva, desempenha a função de indagar para compreender e depois aplicar com a técnica as suas descobertas, utilizando-as para a vida. A fé, com o sentimento e a intuição, desempenha a função de revelar realidades espirituais inacessíveis à razão, lançando pontes para o futuro da evolução.

A maturação evolutiva leva à criação de uma imagem diferente de Deus.

A vida sabe o que quer. Ela maltrata quem desobedece, mas ajuda quem a segue.

O melhor é quem tem mais méritos por ter conquistado valores pessoais, que põe a serviço de todos num regime de ordem.

Uma concepção antropomórfica da divindade é necessária para as massas subdesenvolvidas que, para poder imaginá-la, precisam reduzi-la a seu nível mental.

Cada um, automaticamente, provoca o próprio prêmio ou a própria condenação, na justa medida, segundo o próprio mérito.

 

 

 

 

Princípios de Uma Nova Ética (ver livro)

 

O destino de cada um está em suas mãos.

Só se pode afirmar a não-existência daquilo que sabemos existir.

Hoje está acontecendo isto: a ciência está constrangida pelos fatos, que não pode negar, a abstrair-se cada vez mais da materialidade sensória para chegar a entender a matéria como uma realidade imaterial, e a explicar a substância das coisas com um conceito que mais se aproxima e tende a coincidir com aquele imponderável inteligente, o espírito.

O biótipo dominante na Terra é o involuído que, sendo maioria, tem todos os direitos, afirma e pratica a verdade que deseja, não importa a sua teórica profissão de fé e as verdades eternas, as quais ele sabe, por longa experiência, torcer, adaptando-as às suas comodidades.

Nem Deus aparece na Terra para esclarecer e impor à força a Sua Lei, mas deixa que o ser a descubra experimentando à sua custa.

Pela dor, a mente humana irá aprendendo cada vez mais e, com isso, começará a entender quão louco e perigoso é o seu atual método.

Pela fatal lei do progresso, a mente humana terá de se abrir, a fim de poder chegar a dirigir a vida com métodos mais inteligentes, honestos e vantajosos.

Hoje, quando o homem começa a amadurecer, é cada vez mais necessária uma verdade demonstrada que tudo explique, responda aos porquês, resolva os problemas. Isto se não quisermos que ele vire as costas a qualquer princípio superior, acabando no ceticismo.

Não é que na alma, sobretudo na dos jovens, falte a sede de verdades eternas. Mas às velhas teologias não se propõem os problemas dos tempos atuais.

Quem faz o mal tem de pagá-lo à sua custa, não importando se é crente ou não. A nossa opinião, a nossa fé religiosa ou filosófica, não pode fazer mudar as leis da vida. Ninguém pode iludir Deus e a Sua Lei.

Deus abandona ao poder de reação da Lei quem quer fugir à obediência, enquanto defende os sinceros e os honestos.

Deus protege quem Lhe obedece. Quem observa a Sua Lei, por Ele está defendido. A defesa de Deus representa a arma salvadora dos honestos, o grande poder dos que abandonaram as armas da força e da astúcia.

A Lei sempre responderá, com exatidão, aos movimentos do ser, consoante os princípios estabelecidos, e sempre em proporção ao merecimento do ser.

Quem não aceita o método da luta tem de repudiá-lo, mesmo quando não haja outro meio para tirar a cegueira aos cegos — há que deixá-los ser o que quiserem ser.

Para que incomodar a fera com sábias pregações, quando se ofende em ouvi-las e se revolta?

Por que lutar contra os inferiores, se isso só serve para lhes excitar as reações e enganos? Por que lutar, forçando o entendimento, se pelo seu nível evolutivo não podem entender?

Tudo o que podemos fazer é explicar, para os que têm ouvidos para ouvir e inteligência para entender, os imensos prejuízos que derivam da ética vigorante.

Que rendimento pode dar um sistema de enganos e atritos recíprocos, quando a energia tem de ser desperdiçada nessa luta para se explorarem um ao outro?

Quem estaciona, para conservar, envelhece e morre.

Os verdadeiros revolucionários não são destruidores, mas construtores para o amanhã, sobre as ruínas das velhas religiões que estão desmoronando, juntamente com os seus sistemas éticos, nelas apoiados.

Quanto mais a mente se desenvolve, tanto mais o homem se torna exigente em querer conhecer as razões pelas quais tem de se conduzir de uma dada maneira, suportando os deveres e seus sacrifícios.

Quanto mais o ser é evoluído, tanto mais se torna consciente dessa presença e vive em contato direto com Deus, fundindo-se na Sua vontade e, ao invés da criatura egocêntrica e rebelde, torna-se fiel instrumento Dele.

É mais satisfatória uma conduta livre, uma obediência espontânea, dirigida por conhecimento e convicção, do que uma disciplina imposta à força, pelo terror da punição.

Qualquer que seja a nossa astúcia, nada podemos obter se não for merecido.

Antes de ter o dever à obediência, o ser tem o direito de saber, em proporção ao seu merecimento, desenvolvendo com o seu esforço a sua capacidade de entendimento.

Buscar a vontade de Deus é submeter-se à Sua Lei.

A cada nível biológico corresponde a sua ética relativa, moral de conduta, que se transforma, tão logo o ser ascende a um nível de evolução mais adiantado.

Quanto mais o ser ascende, tanto mais a sua ética é perfeita, porque tanto mais concorda e coincide com a Lei.

O resultado da revolta foi, então, que o ser emborcou não a Lei e a ordem, para serem substituídas, mas emborcou-se a si próprio, semeando para si somente a desordem dentro da ordem, que no seu conjunto permaneceu inviolável e inviolada.

Quem faz o bem, como o mal, a sim próprio o faz.

O tormento da insatisfação é o que mais impulsiona, por uma irresistível e instintiva ânsia de libertação da dor, para o progresso do ser no caminho da evolução.

O ser está constrangido a conquistar, de novo, a sabedoria perdida, embora atormentado pela dor que o impulsiona a procurar libertar-se dela, por tentativas, como só pode fazer um ignorante das leis da vida.

No plano humano também as éticas não são todas iguais, mas dependem da forma mental no indivíduo, da sua maneira de conceber a vida conforme o seu nível biológico.

Quem faz mal uso de uma posição de vantagem, não a utilizando para a finalidade concedida (isto é, para ajudar os outros a subir), perca aquela posição e retroceda do plano de vida mais adiantado, no qual não se mostrou digno de permanecer, ao plano de vida inferior, ao qual, com a sua forma mental atrasada, egoísta, deu prova de afinidade.

Não é possível ficar em posições sociais não merecidas, sem cumprir a função evolutiva que a vida confia a quem nelas se encontra.

Os chefes não são seres superiores, biologicamente mais evoluídos, que, por isso, possuem o direito de dirigir os mais atrasados. A posição de comando não depende do Alto, mas da delegação de poderes a alguns escolhidos, por quem é julgado verdadeiro dono, a massa de cidadãos da nação.

A natureza deixa que sejam explorados os povos atrasados, porque são eles os que mais precisam aprender a lição, necessária para evoluir, através da dor.

Sem ter lutado e merecido não se pode ter direito a melhoramento algum.

A grande máquina da ordem social, civil ou religiosa, não pode funcionar senão por disciplina imposta à força ao indivíduo, naturalmente rebelde a qualquer obediência. E os povos têm de carregar esse peso, à força, mas merecido, porque outro meio não há em nosso mundo, para manter um início de ordem, necessário para se encaminhar a um nível mais adiantado de vida.

O evoluído, pela sua própria lógica, tem de exigir virtude antes de tudo de si, porque a sua finalidade é subir. O involuído, pela sua forma mental diferente, é levado a exigir virtude, antes de tudo, dos outros, porque a sua ética é de luta, para os sobrepujar. O primeiro procura a honestidade antes de tudo em si mesmo, para benefício dos outros. O segundo procura a honestidade antes de tudo nos outros, para melhor explorá-los em seu proveito. O evoluído pede que os outros pratiquem a honestidade, já experimentada por ele em seu próprio benefício, enquanto o involuído pede que os outros pratiquem a honestidade, que ele não conhece, em seu proveito.

Cada vitória, em substância, não é uma vitória, mas uma derrota. Isto porque se trata de um mundo ainda situado perto do AS, onde vigora o princípio do emborcamento.

É necessário superar a sua atual forma mental e a ética da força a ela relativa, para assumir a forma mental do evoluído, hoje julgada utópica, e respectiva ética de justiça.

Continuemos, pois, a deixarmo-nos dirigir pela nossa ignorância das leis da vida, só para atingir sempre novas ilusões e termos de aprender apenas pela dura escola dos sofrimentos a que elas nos levam.

O problema não é de criar novas armas para dominar o mundo, mas de criar homens justos que não queiram usar mais armas. O problema não é o de se tornar astronauta, mas de não haver ladrões e delinqüentes. O que interessa para a nossa civilização é mais a conquista da honestidade do que a do espaço.

Existe hoje o fato positivo de que a estrutura do sistema nervoso-cerebral e a inteligência para entender estão a desenvolver-se. Trata-se de um profundo amadurecimento biológico, que deverá levar o homem a compreender que, enquanto continue concebendo a vida com a sua forma mental atual e realizando-a com a respectiva conduta, os problemas que o atormentam não poderão ser resolvidos, como é justo que não sejam até que o homem, com o seu esforço, tenha desenvolvido a inteligência necessária para os resolver.

Um homem desonesto permanecerá sempre um perigo social, em qualquer partido ou religião a que pertença. O contrário acontecerá se o indivíduo for honesto.

A nova revolução não é para vencer os semelhantes com os seus mesmos métodos, ficando todos no mesmo nível evolutivo, mas é para mudar de método, subindo a um nível de vida superior.

Quando for conquistado o sentido da verdadeira honestidade, com uma forma mental evoluída e uma ética inteligente, os justos se reconhecerão entre si pelas suas qualidades, que representarão o seu bilhete de reconhecimento, impresso de forma indelével como um marco de fogo na sua própria natureza.

Entre honestos se encontra sempre o ponto onde concordar, baseando-se na sinceridade e boa vontade de colaborar, ao passo que entre desonestos, movidos pelo instinto de domínio egoísta, se encontra sempre o ponto onde discordar, porque se baseiam no engano e na vontade de explorar.

A renovação é grande, porque não se trata de mudar de roupa, passando de uma religião a outra, de um partido ou grupo humano a outro, ficando mais ou menos como antes e usando os mesmos métodos, mas trata-se de se renovar completamente, pensando com outra forma mental e agindo conforme uma ética diferente.

Trata-se de acabar com essa contínua mentira, adquirindo outra natureza, personalidade e ética, a do homem justo e sincero.

Nunca, até hoje, o homem dirigiu o fenômeno da sua evolução, mas foi dirigido, no seu estado de subconsciência instintiva, pela sabedoria das leis da vida, que conhecem qual é o seu objetivo final e o caminho para o atingir.

Então o homem não será mais um menino dirigido por leis e forças que não compreende, mas poderá ser ele próprio a dirigir o fenômeno da sua evolução, superando o método atual da tentativa de cegos, dos erros que disto derivam e de todos os sofrimentos a eles relativos.

O espírito de agressividade é a primeira coisa que deve desaparecer em quem procura superar o nível animal-humano.

O novo galho não agride o velho para o destruir. Quer apenas desenvolver-se, deixando o velho apodrecer por si mesmo.

Não adianta o velho lutar para sobreviver, porque o impulso mais poderoso, destinado a vencer, é o do S, isto é, o da vida e não o da morte, o de Deus não o da revolta.

Quem polemiza, mesmo que seja para sustentar a mais sagrada das verdades, revela a sua natureza de involuído, que nunca consegue afastar-se do método do seu baixo nível evolutivo.

Querer impor a alguém uma verdade nossa destruindo a sua, significa atacar o patrimônio das suas verdades e, pois, a sua personalidade.

O método da polêmica não representa uma procura da verdade, juntando os esforços para a encontrar, mas é uma peleja para destruir a verdade do antagonista.

Cabe aos mais adiantados o dever de ajudar os menos adiantados, não os condenando, mas indo ao seu encontro com a devida compreensão.

Se a vida não abandona ninguém, alguém tem de tomar conta do involuído. É dever, então, dos irmãos maiores cuidar dos menores.

O método que o evoluído pratica para vencer é, pelo contrário, o da justiça e da honestidade.

As leis humanas representam uma primeira tentativa de evolução do estado caótico do involuído ao orgânico do evoluído. É o direito que se sobrepõe à força para domesticá-la. Mas o fenômeno, no seu transformismo, encontra-se hoje ainda perto do seu ponto de partida, a força, e vai lentamente encaminhando-se para o seu ponto de chegada, a justiça.

Hoje, uma lei que atue nos cidadãos só pela força do convencimento daqueles que espontaneamente a cumpram, é utopia absurda, coisa fora da realidade.

Quanto mais o ser usa a força, e quanto menos pratica a justiça, tanto mais ele é atrasado; e quanto mais se apóia na justiça, em vez de se apoiar na força, tanto mais é adiantado.

Mas é culpada a fera, pelo fato de ser fera? Decerto que não. A ferocidade faz parte da sua ética, porque é necessária para sua sobrevivência, que faz parte de sua evolução.

O que se chama educação em nosso mundo é a arte de esconder os verdadeiros pensamentos.

Quando em nosso mundo de luta cada um fala de justiça, está, sem querer, falando de uma sua justiça particular, conforme a sua verdade e em seu favor, contra a justiça de todos os outros, que a concebem também em seu próprio favor. Isto quer dizer luta entre justiças opostas, que é o que vemos ocorrer nos tribunais.

Para estabelecer a responsabilidade e culpabilidade do indivíduo, é necessário levar em conta a sua posição na escala evolutiva e a ética dessa posição, tudo em função desse mundo relativo e em evolução.

Quanto mais o ser é primitivo, tanto menor é o patrimônio de idéias que possui para se orientar e resolver os casos da sua vida.

Quanto mais o ser é primitivo, tanto mais ele está fechado e isolado no seu egocentrismo.

Ninguém pode sair, se não por lenta evolução e duro trabalho, da sua forma mental, na qual está aprisionado.

O indivíduo pode começar a perceber que faz o mal apenas quando dos seus maus atos derivar um mal também para ele.

Para o homem confraternizar-se com o próximo, é necessário tê-lo compreendido, por ter experimentado, em si próprio, todas as dores que podem atormentar os outros, porque enquanto não tiver feito tal experiência não poderá entender o que se está passando com eles.

O que mais sabe, porque mais experimentou, torna-se instrumento da evolução, ensinando aos que menos sabem, porque menos experimentaram.

Muitas vezes a ferocidade das leis é devida à ferocidade dos indivíduos.

Onde tudo não pode existir senão em forma de luta, a vida não pode ser senão um inferno.

O imenso peso do imponderável não pode ser percebido senão em planos de vida mais adiantados. Como se pode exigir que ouçam os surdos, que o são porque ainda não desenvolveram o sentido do ouvido? É compreensível que eles reconduzam tudo ao seu nível, entendendo e praticando só as leis deste, ficando insensíveis onde para um evoluído espiritualizado se desencadeiam as maiores tempestades e se revelam as mais altas belezas da vida.

O fato de que ficou de pé somente uma forma exterior, não sustentada por qualquer substância, pode representar a última fase da decadência de uma religião.

O trabalho da íntima auto-elaboração representa a nossa fadiga de hoje, mas o seu fruto será o nosso triunfo de amanhã, para o qual nos leva uma irresistível atração.

Não é possível entender e resolver qualquer caso particular se não o soubermos orientar no plano universal.

Quem semeia causas de um dado tipo terá depois de aceitar os seus efeitos, até que sejam completamente esgotados os impulsos movimentados.

Para saber qual deve ser a nossa conduta na vida, com as suas responsabilidades e conseqüências, é necessário conhecer a estrutura de nossa personalidade e a linha de nosso destino, dois problemas que somente podem ser resolvidos um em função do outro.

É tarefa das religiões e da ordem social a de educar o indivíduo, para que ele adquira, como hábitos seus, as qualidades de um nível superior, até que elas, pela longa repetição, fiquem gravadas na personalidade, na forma de instinto do subconsciente.

Se não quisermos perder-nos no absurdo, qualquer que seja o lado do qual olhemos o problema, teremos de aceitar a teoria da reencarnação.

Não há dúvida que vivemos num mundo que é a negação de Deus, onde não é o bem, mas o mal que triunfa.

Vivemos para construir o nosso eu e cada um o constrói como quer, mas depois fica cristalizado naquela forma, como uma estátua, até realizar outro trabalho para modificá-la.

O método da natureza é o de derivar tudo de um seu precedente, aperfeiçoando-o por meio da repetição.

Entre indivíduos do mesmo nível não ocorre choque de sistema, e a compreensão é fácil: mas o choque é vivo entre indivíduos de níveis evolutivos diferentes, que praticam sistemas e falam linguagens diferentes.

A sensibilidade, o conhecimento, a capacidade de entender do indivíduo, o seu tipo de vida e destino, dependem da sua natureza, que corresponde ao nível evolutivo em que vive e funciona o seu eu. Cada um possui a linguagem do seu plano biológico e só ela o entende. O primitivo. que vive no nível do subconsciente, fala e entende somente a linguagem das emoções. Ele pode ser sugestionado por impressões, porém não convencido pelo raciocínio. Ele não age por entendimento seu, mas por imitação do que fazem os outros. Ele não se interessa pelos efeitos a longo prazo, mas pelos resultados imediatos. O que mais o convence é a linguagem dos sentidos, o seu prazer ou sofrimento. Além desses fatos para ele concretos porque bem perceptíveis, tudo lhe é um mistério imenso, e ele sabe que não pode penetrar. Para ser entendido por tal indivíduo é necessário usar a sua linguagem, a do seu lucro ou dano, prêmio ou pena, paraíso ou inferno.

É inevitável que qualquer ideal, descido do alto, não possa sobreviver na terra senão em forma torcida, adaptando-se às condições biológicas dos indivíduos que têm de realizá-lo.

Só é possível falar com os animais se falarmos a sua linguagem, a dos instintos fundamentais da vida.

O ser não pode compreender o que está acima do seu nível de evolução.

Na propaganda política, nas campanhas eleitorais, na venda dos produtos comerciais, para convencer o povo se usam slogans simples, que não querem raciocínio nem esforço de pensamento, repetidos em forma de sugestão hipnótica, dirigidos ao subconsciente, apoiando-se nos impulsos elementares deste.

Com a sua conduta cada um revelará a que plano pertence, quem é e qual é o seu grau de evolução.

A vida é tanto mais protegida quanto mais o ser evolui.

Pode acontecer que os melhores sejam condenados como inimigos das religiões, enquanto talvez sejam os poucos que possuam a verdadeira espiritualidade.

O nosso destino, seja nos seus princípios universais, seja no caso particular de cada indivíduo, contém nem mais nem menos o que nos pertence, conforme o nosso merecimento e justiça.

O princípio da evolução é que todo esforço, executado pelo ser para subir, está compensado por um proporcionado melhoramento das condições de sua existência.

O passado, como pode ser observado, ressurge indestrutível no presente. Poderemos corrigi-lo com novos impulsos pela nossa vontade, mas não aniquilá-lo, porque um impulso, uma vez lançado, não pode ser detido nos seus efeitos até que estes se esgotem.

Onde hoje há uma dor, aí esteve no passado o nosso correspondente erro contra a Lei.

Onde hoje se comete um pecado contra a Lei, aí estará no futuro a nossa correspondente dor, penitência encarregada de corrigi-lo.

A prática é diferente da teoria, a pregação é uma coisa e a vida vivida é outra, e os princípios superiores das religiões acabam sendo aplicados como exigem os instintos inferiores da animalidade.

Poder-se-ia então definir o fenômeno biológico como um processo de transformação da energia em conhecimento, pensamento, inteligência.

Quanto mais o ser evolui, tanto mais vastos e longos são para ele os períodos de consciência.

Imortalidade de fato não é senão um estado contínuo de consciência acordada, de conhecimento da própria existência e da dos outros, de mente que percebe e de inteligência que entende.

A sensação da sobrevivência, como capacidade de introspecção no período de desencarnado, depende do grau de desenvolvimento de consciência atingido pelo indivíduo.

Cada qualidade, impulso, movimento no presente, não é senão a conseqüência de tudo o que foi vivido no passado.

Para os involuídos, ainda não possuidores de uma consciência para se dirigir, quem os impulsiona por um caminho certo, para o seu futuro, é o pensamento e a vontade da Lei.

O conhecimento aparece quando o ser está bastante adiantado e o mereceu pelo seu esforço e caminho percorrido. O surgir da consciência é um efeito e não é a causa do amadurecimento.

Deus não pode permitir que seja violada a justiça da Lei, pela qual cada um pode semear e colher somente no seu terreno, não dos outros, e receber conforme seus méritos e culpas.

Cada um tem de pagar pelas suas culpas e não pelas dos outros, tem de ser premiado pelas suas virtudes e não pelas dos outros. Pela justiça de Deus, tudo o que nos acontece na vida é merecido por nós, a causa deve estar em nós mesmos. É em nosso passado que temos de procurá-la, e não nos outros.

Cada um paga pelas suas culpas e não pelas dos outros, é premiado pelas suas virtudes e não pelas dos outros.

É na profundidade de nossa psique onde se encontra a primeira raiz de nossos atos.

Não é possível acompanhar o significado dos nossos atos sem ter compreendido de que impulsos interiores a conduta humana deriva.

A evolução leva ao aperfeiçoamento ela especialização, não para afastar os indivíduos uns dos outros, mas para depois juntá-los em unidades coletivas, em que cooperam como elementos complementares.

Cada inversão de rota do ser no caminho evolutivo gera, para ele, uma correspondente inversão de valores, o positivo se torna negativo, a alegria, qualidade do S, se torna dor, qualidade do AS.

Onde há uma carência, hoje, ela é o resultado de excesso no passado.

O problema fundamental para atingir a nossa felicidade, que mais nos interessa, é o de saber dirigir a nossa escolha, da qual tudo depende; é o de saber intervir no terreno das causas, no momento da semeadura e da formação de um destino, no ato do lançamento das forças, porque disto depende e depois vem o automático desenvolvimento da trajetória estabelecida pelo primeiro impulso.

Para doenças psíquicas são necessários medicamentos psíquicos.

O nosso passado nos escraviza, porque lança o eu numa dada direção, assim congelando em determinismo o nosso livre arbítrio, até que, em novas vidas, consigamos libertar-nos da escravidão desse determinismo.

A primeira causa do que nos acontece se encontra, antes de tudo, dentro de nós. Seria suprema injustiça de Deus que aos outros fosse entregue o poder de nos infligir um destino por nós não merecido. Se aos outros fosse dado o arbítrio de modificar o nosso destino à vontade, eles poderiam alterar o caminho da evolução, destruindo a responsabilidade do indivíduo e a justiça de Deus.

Evitando resistências, evita atritos, choques com a Lei, para que o ser não seja atingido em cheio pelo seu duro método, a correção pela dor.

É o próprio homem que, pela sua natureza, carrega sua punição.

É lícito, para eliminar os choques com um mundo inferior, sacrificar valores superiores?

Ele nunca aceitará o mundo como é, mas procurará, cada vez mais, afastar-se dele, prosseguindo em sua trajetória. Ele nunca renunciará ao seu direito de fazer parte de outras humanidades mais adiantadas. É preferível retroceder o ser e ficar depois condenado a vir no atual nível humano. Para o biótipo evoluído não há outro caminho.

Uma verdadeira psicanálise, se quiser ser completa, deve abranger horizontes de amplitude bem maior que os atuais. Ela não pode ser entendida somente como fenômeno psicológico, mas também como fenômeno ético, religioso, biológico, evolutivo, social etc.

Depois que a livre vontade do ser movimenta o primeiro impulso, todas as conseqüências, até esta última que é a doença, desenvolvem-se automaticamente, em forma determinística, fora da vontade e liberdade do indivíduo.

Corrigindo o erro, a causa, elimina-se a doença, o efeito.

Se a primeira causa de uma doença foi um impulso negativo, oposto, de desordem e desequilíbrio, provocando um movimento contra as leis da vida, que no plano ético se chama culpa, pecado, então a doença, sob a forma de dor física ou moral, não é somente a lógica conseqüência do erro, a justa e fatal reação compensadora da Lei, mas é também o pagamento da dívida, a devida penitência pela culpa, a necessária expiação, o corretivo do erro, que é mais idôneo para reconstituir a ordem e o equilíbrio.

Procurando eliminar somente os efeitos, sem neutralizar suas causas, sem cortar na raiz o impulso que gera doenças, suprimindo-as à força, tratar os últimos resultados, ignorando suas origens longínquas, com tais métodos acabaremos gerando sempre novas doenças.

O primeiro remédio é não ter merecido a doença com os nossos erros.

A doença é uma experiência e uma salvação, em que se manifesta a sabedoria da vida para tirar o indivíduo do impasse em que ele, por ter errado, caiu.

As neuroses podem ser tratadas com o método da obediência à Lei e da sublimação, corrigindo os velhos impulsos ensinando a praticar novos, de um plano biológico superior.

A evolução não pode ser uma criação de coisa nova. Sua trajetória já está marcada antes de ser percorrida. Trata-se de percorrê-la em sentido oposto, repetindo em subida o caminho que já foi percorrido em descida.

A vida no além-túmulo significa um acordar na profundeza do inconsciente, enquanto no período de vida na matéria, a consciência fica limitada à superfície do eu.

O ser entende e pode livremente dirigir-se em proporção ao seu grau de desenvolvimento.

O evoluído vive sabendo, o que representa uma imensa vantagem, porque o conhecimento evita o erro do qual deriva a dor. O involuído vive sem saber, o que significa errar a cada passo e ter de pagar o erro com a dor.

É preciso procurar educar de novo o indivíduo, até chegar a imprimir na sua personalidade novos hábitos, que serão amanhã suas qualidades e impulsos instintivos, o que significa libertação do mal e a cura da doença.

Os sonhos representam um trasbordamento do subconsciente, além dos limites impostos pelo consciente, quando se adormece e, na sua passividade, deixa a personalidade sem o seu controle, livre de se manifestar à vontade.

Trata-se de substituir a velha por uma vida nova, diferente, para educar o indivíduo, de modo que com uma nova experimentação possa assimilar, transmitir e armazenar no subconsciente qualidades melhores.

A função da sociedade deveria ser a de educar, melhorando as condições de vida onde nasce o crime, seguindo, quanto possível, a técnica da superação, que eleva para o melhor, ao invés do método do esmagamento, que confirma o direito à revolta, leva o ser para trás, para o pior.

Qualquer destruição é elemento negativo, antivital, que pode ser tolerado somente como condição de progresso.

Doença e sofrimento são meios naturais e inevitáveis, inerentes ao processo evolutivo, indispensáveis instrumentos de progresso; são as feridas do guerreiro, saudáveis, porque só descendo à luta se pode realizar a coisa mais importante da vida, a evolução.

O paciente será sustentado pela idéia de que a sua doença não é doença, mas uma crise de evolução, não é um doente, mas um indivíduo em crescimento, e os seus sofrimentos são a condição necessária de seu progresso.

Os maus hábitos podem ser transformados em virtudes, com a repetição podem ser gravadas no subconsciente novas e melhores qualidades, sendo possível educar o homem e realizar a evolução, construindo a personalidade em formas cada vez mais adiantadas.

Parece que em nossa sociedade é dever ser involuído. Este é o modelo para todos, a unidade de medida que a maioria, porque lhe convém, escolhe e impõe a todos.

A destruição do que é inferior, sem uma contemporânea substituição pelo que é superior, é somente negatividade suicida, contra a qual a vida tem razão de se rebelar, defendendo-se com as suas reações, porque a perda causada pela destruição não é compensada por uma paralela construção positiva.

Algumas vezes o que parece doença se assemelha às dores do parto, necessárias para gerar um novo ser.

O amor tem menos egoísmo, avidez de possuir, agressividade e ciúme, e mais altruísmo, generosidade, benevolência e desejo de ajudar; tudo isto acontecerá mais acentuadamente quando estivermos mais próximos da espiritualidade, afastando-nos dos níveis inferiores onde vigora a animalidade.

Nada há de errado nas leis da vida, cada um tem a sua tarefa a realizar.

Quando o ser tem, por qualquer razão, de cumprir um esforço, deve canalizar todas as suas energias nesse sentido, evitando qualquer desperdício fora dele.

Quando um indivíduo ou povo tem de fazer um esforço que lhe é necessário para vencer na luta pela vida, deve concentrar as suas energias, canalizando-as para essa finalidade, evitando todo desperdício, e por isso desinteressando-se da sexualidade que o enfraquece.

É perigoso esquecer que atrás dos bastidores, das aparências exteriores e das teorias religiosas e filosóficas, há uma invencível realidade biológica que reage, se ofendermos as suas leis. Não é lícito ignorá-las sem pagar as conseqüências do erro.

Para quem possui apenas instinto de revolta, é necessário salientar, não a bondade de Deus, mas o seu poder punitivo, com a ameaça do inferno.

O conceito da sublimação dos instintos se tornará sempre mais compreensível, à medida que a humanidade for evoluindo.

Ninguém se escandaliza e se ofende ao que corresponde à sua natureza; isto só acontece quando nos encontramos numa posição diferente.

A imposição origina reação defensiva, não educa; gera, por defesa, a mentira, a sinceridade e a inverdade; produz a revolta e não a colaboração.

A longa repetição gera automatismo e, com isso, a assimilação no subconsciente de novas qualidades, que constituem novos instintos.

A sublimação do espírito não se pode atingir com uma agressividade destruidora da vida, mas educando-a e ajudando-a a levantar-se.

Isso significa mudar a ignorância em conhecimento, desenvolver a inteligência, atingir a compreensão de tudo o que pertence à vida, ter sabedoria para se orientar com consciência de si próprio a fim de evitar o erro e o mal, que trazem sofrimento, e praticar a verdade e o bem, que trazem felicidade.

É necessário um rebanho de seguidores continuamente rebeldes para converter, mas que nunca se convertem. É preciso um estado de pecado universal e permanente, que deixe o problema sem resolver, à espera de solução. Com isto concorda perfeitamente a maioria, que nada mais almeja.

Não se pode exigir que um involuído obedeça às leis superiores, que estão fora da sua forma mental, situadas acima do seu nível de evolução.

Para a vida tudo é natural e justo, se colocado no seu devido lugar e julgado a respeito do seu e não de outros planos de evolução.

Na obra de Deus não se pode dizer que coisa alguma não seja perfeita, enquanto estiver cumprindo a sua função.

Para o homem evangélico, que toma Cristo a sério e o segue, não há outra posição a não ser a Dele, isto é, a do crucificado.

À natureza pouco interessa a vida e o bem-estar do indivíduo. A sua finalidade é a seleção de uma raça de fortes e, por isso, o sacrifica.

Um impulso não pode ser destruído: quanto mais o comprimimos, tanto mais força adquire e se descarrega em direção errada, se não lhe for possível endireitá-lo corretamente.

O amor não é só uma necessidade fisiológica do indivíduo, mas também nervosa e espiritual.

É perigoso conceder liberdade a um ser que ainda não possui capacidade para dela fazer bom uso; pelo contrário, é instintivamente levado ao abuso.

Gerar é uma coisa séria, que leva a conseqüências graves e duradouras, e não se pode fazer levianamente.

Com o método da geração não mais casual, mas prevista, o primeiro direito pertence aos filhos. Quando não há filhos, o interesse do casal pode prevalecer, sem prejuízo para ninguém; mas quando há, é o interesse deles que se sobrepõe ao dos pais.

O homem não se rebela abertamente contra o ideal, porque não quer parecer nem mau nem atrasado. A presença de um sonho tão bonito embeleza a sua vida e satisfaz o seu orgulho de homem respeitável e respeitado. Mas, ao mesmo tempo, não toma o ideal a sério, e, por isso, não renuncia à sua satisfação, coisa bem positiva e sensível. Está bem apegado à realidade e resolve o caso de modo particular o que oficialmente condena em público nos outros; nesse jogo, desenvolve a sua inteligência.

No presente estágio de evolução da humanidade ainda vigoram leis bem diferentes daquelas biológicas mais evoluídas, do Evangelho.

O caminho para Deus está na harmonização e não nos atritos da luta, porque a vida evolui da desordem para a ordem, e não ao contrário. Por isso, é necessário não contrapor, mas harmonizar espírito e corpo, moralidade e sexo, misticismo e sentidos, ideal e instintos.

Não é fácil intervir nas leis da vida. É necessário vê-las com inteligência positiva, conhecê-las, de fato, na realidade biológica, baseando-se não apenas em abstrações filosóficas e teológicas.

A humanidade precisa de se equilibrar na harmonia, por dentro e por fora, isto é, o indivíduo consigo mesmo, e na sociedade cada um com os seus semelhantes.

O sofrimento está ligado à revolta e respectiva desordem, enquanto a felicidade à obediência e respectiva ordem. Na obediência, o sofrimento desaparece, porque então não tem mais razão de existir.

Numa sociedade que não é um organismo de seres conscientes, mas um amontoado de elementos inimigos, não pode haver lugar para o que se poderia chamar de um super-amor.

O homem tem a liberdade de continuar com o sistema atual, porém não está livre de fugir das respectivas conseqüências.

É urgente educar o ser humano para que, tornando-se mais consciente, seja possível confiar-lhe liberdades das quais hoje não pode gozar, porque tudo tem de ser proibido a quem de tudo está pronto a abusar.

Nunca destruir, mas tudo respeitar, enobrecer, dignificar, dirigindo-o para o bem. Devemos utilizar tudo, inclusive o amor, para chegarmos à sublimação cristã.

Tudo, por evolução, tem que se espiritualizar, e o amor, tornando-se prodígio de sintonização de almas e comunhão mística, com a essência criadora do universo, no mistério da gênese, cumpre, com a descida duma alma que se encarna, a função religiosa da ascensão para Deus.

Se destruirmos o amor, não resta senão egoísmo. Quem não irradia para os outros, concentra somente para si. Eis o orgulho, a cobiça de posse e de domínio.

Seria necessário levar em conta o que temos de pensar a respeito dos outros, para receber dos outros o que quereríamos que pensassem a nosso respeito.

O mal não se pode endireitar com o mal, a violência com a violência, mas somente com o bem e a bondade.

A mansidão nos outros nos tira a vontade de lutar, porque não mais motivo para isso.

Pregar, explicar, não basta para renovar o homem.

 

 

 

 

Cristo

 

 

Estamos vivendo em plena crise religiosa, crise de crescimento espiritual, pela qual o homem, de menino, torna-se adulto, assumindo a própria forma mental.

 

Sem uma nova e mais substancial interpretação, o Evangelho pode, em alguns pontos, pa­recer inaplicável no mundo moderno e ser assim liquidado como doutrina inútil à vida.

 

Outrora usava-se o método do autoritarismo e da obediência; hoje, tende-se ao da liberdade e responsabilidade. O Evangelho, que foi dirigido ao homem menino de então, há de ser relido e entendido com a mente do homem adulto de hoje, si­tuado perante problemas que não são mais os mesmos de outrora.

 

Deus não pode dese­jar a ignorância de suas criaturas e culpá-las por te­rem procurado a luz. O não compreender pode ter sido virtude no passado, porém não mais no presente.

 

Deus é necessariamente Tudo. Se ele não fosse tal, se algo pudesse existir fora e além dele, Deus não seria mais Deus.

 

Muitas verdades religiosas adquirem consistência e com isso durabilidade, porque elas são expressas como verdades racionais e positivas e não apenas cons­truções míticas.

 

É injusto, isto é, anti-Lei e anti-Deus, que um inocente pague por culpas dos outros, enquanto é justo, conforme a Lei de Deus, que cada um pague as suas próprias culpas. E é ainda mais injusto que tais culpados se apro­veitem da bondade daquele inocente para fazer de­le, perante a divina justiça, um bode expiatório, exi­mindo-se do pagamento que os espera.

 

Não é lícito para o homem — porque injusto e imoral — pretender fazer-se redi­mir pelo sacrifício de Cristo.

 

É impossível que eu me possa mudar a mim mes­mo pensando com o cérebro de outro, e aprender, fazendo sofrer um outro, a lição que deve corrigir a mim, que cometi o erro.

 

É compreensível, e perdoável que o homem do passado se tenha deixado levar por impulsos do subconsciente, mas isto não é mais perdoável hoje, pois ele está saindo da menoridade. É chegada a hora de ver em Cristo não apenas o seu amor e sa­crifício, que outrora tanto nos confortava, mas, antes e sobretudo, um exemplo de justiça que nos induza ao seu cumprimento e não a evadirmo-nos dela. Che­gou a hora de o homem se colocar com sua consci­ência perante o dever de evoluir com o seu próprio esforço, de reconhecer a sua posição, de compreen­der a sua responsabilidade, de assumi-la ele próprio perante a Lei, sem delegar sub-rogações.

 

Semelhante humanização de Deus é um produto do subconsciente que, por orgulho instintivo, teria levado a divinização do homem.

 

Quando não se po­de demonstrar torna-se necessário recorrer ao mistério e depois ao método da imposição pela fé, o que não convence.

 

Esta idéia que consiste em fazer descer Deus na Terra para se encarnar como homem, não será, então, uma espécie de repetição da primeira tentativa do ser de tornar-se igual a Deus, isto é, da revolta que deu origem à sua precipitação no AS?

 

Cristo nos fez ver quanto é perigoso na Terra dizer a verdade, quando, depois de termo-nos engajados na batalha, não permanecemos suficientemente ar­mados para sustentá-la e vencê-la. Dizer a verdade, então, é um luxo reservado aos fortes e negado aos fracos.

 

A verdade é relativa e progressiva. Assim como se passou da religião do Deus vingativo à do Deus de bondade, da mesma forma se passa hoje a religião da inteligência. Como se passou da fase do temer àquela do amar, assim se passa hoje aquela do compreender.

 

A revelação da verdade há de ser proporcionada à capacida­de de compreendê-la; por isso não deve ser con­cedida levianamente quando pode ser prejudicial às massas. Estas, com efeito, dada a sua ignorância, poderiam ser levadas a fazer um mau uso delas.

 

Que um espontâneo processo de desmitificação esteja hoje em ação, é mais que evi­dente. Ele revela a superação da fase infantil da humanidade, da qual está saindo. Em vez de se construírem mitos e impô-los, em seguida, em nome da fé, a ciência se colocara perante a Lei de Deus e estudara com objetividade seu funcionamento.

 

A mente infantil do passado queria envol­ver os fatos no encantamento do mito e acalentava o mistério, a fé, o prodígio, o estado emotivo, o senti­mento; enquanto à mente adulta repugna o inaceitável e concorda com tudo aquilo que, como a Lei, é positivo, racional, rigorosamente controlado, exige espírito crítico e processos de investigação da mesma natureza.

 

Na prática, cada nível evolutivo tem o Evangelho a ele relativo, que a evolução não pode deixar de fazer superar levando o ser a mais avança­das formas de vida.

 

O Evangelho transplantado e usado ao “pé da letra” em nosso mundo atual pode resultar anacrônico.

 

Quanto mais o homem é involuído, tanto mais vive uma vida de tipo AS, isto é, individualista, egoísta, separatista. E quanto mais é evoluído, tanto mais passa a viver uma vida de tipo S, isto é, coleti­vista, altruísta, unitária.

 

Os primitivos têm necessidade de ser guiados e não podem comandar, porque o seu instinto é de rebaixar tudo ao seu nível. Para ter direitos é necessá­rio ter conquistado o direito de ter direitos. Isso só pertence a quem é biologicamente útil, em sentido evolutivo, e é negado ao involuído, que tende a fazer retroceder em vez de avançar. A vida sustenta só quem serve aos seus fins.

 

É legítima a riqueza quando ela é um meio para realizar a ascensão evolutiva.

 

O valor da riqueza depende do uso que se faz dela.

 

É na intenção do homem, na vontade que dirige as suas ações, que está o bem e o mal, a virtude e o defeito, o mere­cimento e a culpa, a verdade e o erro.

 

A vida não nos quer ignorantes de nenhum de seus aspectos, até aos considerados inferiores.

 

O Céu não pode constituir-se de ingênuos, ignaros da realidade, mas de indivíduos que percorrem to­da a estrada conduzindo-os até lá, tendo superado todas as dificuldades que nela se encontram.

 

Para dedicar-se somente ao problema espiritual é indispensável ter resolvido o problema material.

 

O idealis­ta simplório deve aprender que o ideal não é um jogo e que a verdadeira pobreza pode matar também o espírito, porque pode impelir de novo o indivíduo até os mais baixos níveis sociais, tirando, desse mo­do, todo alento necessário às mais altas manifestações da vida.

 

Enquanto o homem finge perseguir o ideal, embora sem conseguir vivê-lo de verdade, ele o fixa na mente, o interioriza no espírito, executando, assim, aquele primeiro trabalho de maturação interior que é necessário para chegar à última fase, que é a da efetiva realização do ideal.

 

Conforme as leis biológicas, a pobreza não é uma virtude, mas um defeito, o estado atrasado e do­entio de uma coletividade que não soube vencê-la.

 

O voto que devemos formular para o bem da sociedade não é o da pobreza, fomentadora do parasitismo, mas a realização de trabalho produtivo, o único que a aju­da a progredir. A pobreza pode ser uma desgraça que merece ajuda, mas pode também ser o produto de ineptidão, preguiça ou má vontade, uma posição merecida de quem se recusa à fadiga da luta pela vida.

 

É fatal e conforme a Lei de Deus que as religiões nasçam e morram, sendo substituídas por outras.

 

Estamos no mundo do relativo e ninguém pode subtrair-se ao transformismo. Então, da verdade mais ampla não vemos senão momentos sucessivos, e ela é obtida pela soma de todas as verdades relativas, cada uma das quais se vai transformando na seguinte. Ela é verdadeira em outro tempo e em outro ambiente. E, quando ao longo do caminho da evolução, uma verdade fica velha e superada, a vida a rejeita porque não lhe serve mais e procura outra para substituí-la.

 

O Evan­gelho é uma expressão da Lei, contendo verdades válidas para todo tempo e lugar.

 

Ninguém pode impedir que da massa dos involuídos possa emergir casos isolados de evoluídos, lançados pela vida antecipadamente em direção do futuro, tendo em vista o objeti­vo de tentar uma realização de superamento.

 

Pode­mos ter indivíduos cuja lei natural - por suas quali­dades e nível biológico — coincida com a do Evange­lho, com sua técnica de defesa e com sua singular economia baseada no dar, em vez de no tirar.

 

Cada indivíduo se encontra ligado à lei particular que cor­responde à sua natureza. O involuído — pelo menos enquanto não evolve — não pode aplicar a lei do Evangelho porque em suas mãos não funciona.

 

O mundo usa o Evangelho com hipocrisia até evolver e um dia poder realizá-lo verdadeiramente. A hipocrisia se justifica e cumpre a sua função.

 

Um cristianismo feito de ver­dadeiros cristãos, isto é, imitadores de Cristo, pratican­do o Evangelho com plenitude, seria composto de mortos, de mártires na cruz. Eis porque o Cristianismo, se pretende existir sobre a Terra, não pode ser integrado de verdadeiros cristãos, mas só de cristãos aparentes  — na melhor hipótese — de aprendizes de cristãos que procuram exercitar-se na sempre reno­vada tentativa de aplicá-lo até os limites de suas pos­sibilidades.

 

O verdadeiro cristianismo é para fazer aquilo que Cris­to fez, isto é, para fugir do mundo inimigo, para Ele superado. Para quem está maduro, não há nada melhor, porque tal afastamento é vida que triunfa ressurgindo no S. Ora, para os imaturos isso só sig­nifica morte, porque nesse nível são ignorados tais superamentos em função de uma vida mais alta. Cristo, então, para o homem de tipo corrente sobre a Terra, não é aceitável como realização imediata — pois esta aniquila o imaturo — mas apenas como uma meta excelsa e longínqua em direção à qual se diri­ge, observada por ele como um farol a iluminar o seu caminho.

 

Quando a humanidade alcançar a mais avan­çada fase de evolução, os princípios do Evangelho, inteligentemente entendidos, serão a leis de todos, e será, assim, realizado o Reino de Deus.

 

O tratamento que rece­bemos depende de nossa conduta. O, o limite de uma péssima conduta é o de provocar, como seu efeito, a absoluta falta de tudo; enquanto o limite de uma ótima conduta é o de produzir, como efeito, a gratuita abundância.

 

A Lei não pratica injustiças e não dá nada de presente. Então, se ela provê, isto quer dizer que se trata de um ato de justiça.

 

A vida pode ser entendida de duas maneiras e ser assim dirigida pa­ra duas diversas finalidades: ou vivemos para reali­zar-nos imediatamente na Terra, tais quais somos, conforme nossos próprios instintos; ou então para al­cançar amanhã — através do superamento desses instintos — um outro tipo de vida, num plano evolu­tivo mais alto.

 

Quanto mais evolvemos, mais a existência se nos reve­la dirigida por leis amigas e justas, e não mais pelos caminhos da rivalidade e da força que imperam em nosso mundo.

 

Enquanto se está no reino da força vencem os fortes e perdem os débeis, mas quando se entra no reino da justiça per­dem os prepotentes e vencem os justos.

 

A primeira raiz do mal ou do bem está dentro de nós, trazendo cada qual o seu destino dentro de si, em sua natureza.

 

Quanto mais avançamos na evolução, tanto mais o esforço e as dores necessárias pa­ra realizá-las são aceitos livremente.

 

Para os seres do plano animal, renunciar à violência pode significar a mor­te. E isto, em certos momentos e ambientes, pode ser verdade também para o homem.

 

A vida para o homem espiritual não é só rejeição dos valores do mundo, mas é, acima de tudo, operosidade de conquista dos valores do Céu.

 

Cada pensamento e ação constituem a projeção de um impulso que, no desen­volvimento de nossa vida, estabelece uma trajetória, ou de tipo positivo, que redunda em nossa vantagem, ou de tipo negativo, que nos leva para o nosso prejuízo.

 

Uma riqueza alcançada por caminhos escusos esta inquinada de negativismo e é, por isso, perniciosa para quem a possui, sendo portanto conveniente que se liberte dela. Compreende-se então que, em certos casos, ser rico pode significar um débito a pa­gar, enquanto ser pobre pode constituir uma posição bem melhor, porque isenta de tal condenação.

 

O método da força é apropriado à defesa da vida no plano ani­mal, que é de tipo individualista, separatista, num re­gime de caos, enquanto o método da retidão visa à defesa da vida no plano do evoluído, que é de tipo coletivo, orgânico, atuante num regime de ordem. Assim, a vida é levada, por evolução, a passar do primeiro ao segundo método.

 

Uma vida terrena, eterna, representaria, ela sim, a verdadeira morte, porque deteria o transformismo ascensional da evolução.

 

O que realmente vale não é o fato de pertencer nominalmente a este ou àquele gru­po religioso, mas o nosso efetivo comportamento perante a Lei.

 

Desde o instante em que descobrimos a lei que regula o desenvolvimento de um fenômeno, começamos a ler o pensamento de Deus.

 

As religiões, devendo satisfazer as camadas sociais, intelectualmente menos desenvolvidas, representadas pelas massas que não sabem superar o estado emotivo, apóiam-se prevalentemente sobre o sentimento e so­bre uma aceitação passiva pela fé. A ciência, que se apóia no fator lógico e racional, encontra maior acolhida junto às classes mais cultas. Assim, religião e ciência são ambas unilaterais e incompletas, cada uma exclusivista e concebida apenas com a sua própria forma mental, pronta a repelir as verdades da outra que, afinal de contas, são complementares nos pontos que não são foca­lizados por uma ou por outra.

 

A visão de Deus pode ser tanto racio­nal (Ciência), como emotiva (Religião). Ela pode ser alcançada pelas vias da mente, como pelas do co­ração, e pode ser gozada tanto com o brilho do inte­lecto, quanto como a alegria de sentimento.

 

É inebriante be­ber na taça do conhecimento. Esta é uma exploração contínua perante a qual caí, passo a passo, o desco­nhecido; é uma corrida à superação de horizontes ca­da vez mais longínquos; é um mover-se livremente num oceano sem limites, onde cada gota é um mo­mento da sapiência de Deus.

 

 

 

 

Imitação de Cristo (Tomás de Kempis) (ver livro)

 

Na verdade, não são palavras sublimes que fazem o homem santo e justo; é a vida virtuosa que o torna agradável a Deus.

 

Quanto mais e melhor souberes, tanto mais rigorosamente serás julgado, se com isso não viveres mais santamente. Não te envaideças, pois, de qualquer arte ou ciência; antes, teme pelos conhecimentos que adquiriste. Se te pareces que sabes e entendes bem muitas coisas, lembra-te que é muito maior o que ignoras.

 

Não há melhor e mais útil estudo que conhecer-se perfeitamente e desprezar-se a si mesmo. Ter-se por nada e pensar sempre bem e favoravelmente dos outros é prova de grande sabedoria e perfeição.

 

Grande sabedoria é o não agir com precipitação, nem tão pouco se aferrar ao próprio parecer. Sabedoria é ainda não crer sem discernimento em tudo o que dizem os homens, nem encher os ouvidos alheios do que ouvimos ou acreditamos.

 

Não te ensoberbeças pelas boas obras, porque os juízos dos homens são muito diferentes dos de Deus, a quem não raro desagrada o que aos homens apraz.

 

Anda por onde quiseres: não acharás descanso senão na humilde sujeição e obediência ao superior.

 

É bem possível que seja acertado o parecer de cada um: mas não querer ceder aos outros, quando a razão ou as circunstâncias o pedem, é sinal de soberba e obstinação.

 

Quando for permitido ou conveniente falar, fala de coisas edificantes. O mau costume e o descuido do nosso progresso espiritual concorrem muito para o desenfreamento de nossa língua.

 

Bom é passarmos algumas vezes por aflições e contrariedades, porque freqüentemente fazem o homem refletir, lembrando-lhe que vive no desterro e, portanto, não deve por as esperança em coisa alguma do mundo. Bom é encontrarmos às vezes contradições, e que de nós façam conceito mau ou pouco favorável, ainda quando nossas obras e intenções sejam boas. Isso ordinariamente nos conduz à humildade e nos preserva da vanglória.

 

As tentações, porém, ainda que molestas e graves, são muitas vezes de grande utilidade para o homem, porque nelas se adquire humildade, pureza e experiência.

 

O ferro é provado pelo fogo, e o justo, pela tentação. Ignoramos muitas vezes o que valemos e a tentação faz-nos ver o que somos.

 

É custoso perder um costume inveterado, e ninguém renuncia, de boa mente, a seu modo de ver.

 

Procura sofrer com paciência os defeitos e quaisquer imperfeições dos outros, pois tens também muitas que os outros têm de aturar. Se não te podes modificar como desejas, como pretendes ajeitar os outros na medida de teus desejos?

 

Quanta virtude cada um possui, melhor se manifesta na ocasião da adversidade, pois as ocasiões não fazem o homem fraco, mas revelam o que ele é.

 

Enquanto tens tempo, ajunta riquezas imortais.

 

Procura tirar proveito de tudo; se vês ou ouves relatar bons exemplos, anima-te logo a imitá-los; mas, se reparares em alguma coisa repreensível, guarda-te de fazê-la e, se em igual falta caíste, procura emendar-te logo dela.

 

Alegrar-te-ás sempre à noite, se tiveres empregado bem o dia. Vigia sobre ti, anima-te e admoesta-te e, vivam os outros como vivem, não te descuides de ti mesmo.

 

Não julgues ter feito progresso algum enquanto te não reconheças inferior a todos.

 

Primeiro conserva-te em paz e depois poderás pacificar os outros.

 

Com duas asas se levanta o homem acima das coisas terrenas: simplicidade e pureza.

 

Se teu coração for reto, toda criatura te será um espelho de vida e um livro de santas doutrinas.

 

Repreendemos nos outros as faltas leves e nos descuidamos das nossas maiores. Bem depressa sentimos e ponderamos o que dos outros sofremos, mas não se nos dá do que os outros sofrem de nós. Quem bem e retamente avaliasse suas obras não seria capaz de julgar os outros com rigor.

 

Se queres ter paz e verdadeiro sossego, é preciso que tudo mais dispenses, e só tenhas a ti mesmo diante dos olhos.

 

Considera vã toda consolação que te vier das criaturas.

 

Grande tranqüilidade do coração goza aquele que não faz caso de elogios nem de censuras.

 

Agradece, pois, os menores benefícios e maiores merecerás. Considera como muito o pouco, e recebe o menor dom como dádiva singular.

 

Bem-aventurados os olhos que estão fechados para as coisas exteriores e abertos para as interiores! Bem- aventurados os que penetram as coisas interiores e se empenham, com exercícios contínuos de piedade, em compreender, cada vez melhor, os segredos celestiais!

 

Nada, pois, do que fazes te pareça grande, nada  precioso e admirável, nada digno de apreço, nada nobre, nada verdadeiramente louvável e desejável, senão o que é eterno. Acima de tudo te agrade a eterna verdade e te desagrade a extrema vileza. Nada temas, nada vituperes e fujas tanto como os teus vícios de pecados, que te devem entristecer mais do que quaisquer prejuízos materiais.

 

Não queiras discutir as obras do Altíssimo; examina antes as tuas iniqüidades, quanto mal cometestes e quanto bem deixastes de fazer por negligência.

 

Os que se têm por sábios raro se deixam dirigir pelos outros. É melhor saber e entender pouco, humildemente, que possuir tesouros de ciência e presumir de si. Melhor te é ter menos do que muito, se com o muito te vem o orgulho.

 

Nem todo desejo que pareça bom devemos logo seguir, nem tampouco a todo sentimento contrário logo havemos de fugir.

 

Trata de fazer antes a vontade alheia que a tua. Prefere sempre ter menos que mais. Busca sempre e roga que se cumpra plenamente em ti a vontade de Deus. Quem assim procede penetra na região da paz e do descanso.

 

É grande sabedoria não se deixar mover por qualquer sopro de palavras, nem prestar ouvidos aos traiçoeiros encantos da sereia, pois só desse modo prossegue a alma com segurança no caminho começado.

 

Não te deixes cativar pela elegância e sutileza dos dizeres humanos, porque “o reino de Deus não consiste em palavras, mas na virtude”.

 

 

 

Meditações (Marco Aurélio)

 

Cuida de cumprir as tuas obrigações de cada hora com estrita e simples gravidade, com coragem, liberdade, justiça, expulsando de ti qualquer outro pensamento. Isto só o conseguirás se realizares cada ato como se fosse o último de tua vida, evitando todo movimento irrefletido, toda transgressão apaixonada das leis da razão, toda dissimulação, toda vaidade, toda revolta contra o destino.

 

Busca não errar em teu exame e livre teu juízo do orgulho.

 

Nada concorre tanto para a grandeza da alma quanto o poder de examinar com método e verdade as coisas que se encontram na vida, de observá-las tão bem que seja possível chegar a uma conclusão sobre sua utilidade e sobre para que mundo são úteis.

 

Certamente, nenhum refúgio é mais tranqüilo e resguardado do que o que o homem encontra em sua alma, sobretudo se para lá levar aquelas verdades sobre as quais lhe basta inclinar-se para imediatamente adquirir uma absoluta quietude. Entendo por “quietude” a ordem perfeita da alma.

 

Tudo o que fizeres, faze-o com o propósito de ser homem de bem, no sentido próprio da palavra. Que esse ideal presida a todas as tuas ações.

 

Não te conduzas como se fosses durar milhares de anos. Sobre ti paira o inevitável. Enquanto vives e podes, esforça-te por tornar-te homem de bem.

 

Nunca se deixar arrastar pelo torvelinho. Em qualquer situação, visar à justiça, em todo pensamento, objetivar a compreensão.

 

No repouso que a ti mesmo concedes, sê sóbrio.

 

Que é pois que nos devemos esforçar por obter? Só isto: intenções retas, ações proveitosas à sociedade, palavras sinceras, disposição de aceitar tudo o que nos acontece como necessário, natural, decorrente do mesmo princípio e da mesma fonte que nós.

 

Assemelha-te às rochas, contra as quais incessantemente se quebram as ondas. Elas se muralham  e em seu derredor se acalma o furor do mal.

 

Sempre vá pelo caminho mais curto. O que segue a natureza é sempre o mais curto. Guia-te pois pela mais pura razão, no dizer e no fazer. Agindo assim te livrarás de cuidados, de conflitos, e a cálculos e astúcias não terás de recorrer.

 

Aplica-te aos dons que só de ti dependem: sinceridade, gravidade, austeridade, resignação, moderação, mansuetude, liberdade de espírito, simplicidade, seriedade, magnanimidade.

 

A ninguém acontece nada que a natureza não lhe dê forças para suportar.

 

Feliz é o homem que dá um bom destino a si mesmo. É com boas disposições, boas inclinações, boas ações que se faz um bom destino.

 

Conserva-te simples, bom, puro, digno, inimigo da opulência, amigo da justiça, piedoso, benevolente, terno, firme no cumprimento de teus deveres.

 

Só uma coisa é digna de estima: cultivar a verdade e a justiça, ser tolerante até para os mentirosos e os injustos.

 

Esmera-te em atenção às palavras alheias, e penetra, o mais possível, na alma daquele que te fala.

 

É necessário ser atento às palavras no discurso quanto ser atento aos atos nos empreendimentos. Procurar no discurso, o objetivo; nos empreendimentos, o sentido.

 

Se não és reto, retifica-te.

 

Deves aceitar piedosamente o que te acontece sempre e em toda a parte, tratar com justiça aqueles com quem vives, e vigiar com o maior cuidado os teus pensamentos, para que nenhuma má idéia se instale em ti.

 

Volta o olhar para o teu interior. Aí reside a fonte do bem inesgotável, se o buscares sem cessar.

 

Presta atenção em como pensam aqueles cujo louvor almejas. Dessa maneira não te magoará a sua leviandade, e, conhecendo a fonte de suas opiniões e ações, ser-te-á indiferente que te elogiem ou critiquem.

 

Absolutamente nada é um bem para o homem quando não o torna mais justo, sábio, forte e livre. Absolutamente nada lhe é um mal quando não produz vícios contrários a essas virtudes.

 

Os homens não deixarão de fazer exatamente o que fazem, ainda que te arrebentes pregando o contrário.

 

Não te deves queixar de ninguém. Corrige o culpado, se puderes. Se não o puderes, corrige o próprio ato. Se nem isso puderes, de que adiantam as queixas? Nada se deve fazer sem utilidade.

 

Se uma causa exterior te perturba, a tua aflição não vem dessa causa mas, sim, do teu juízo a respeito dela. Em teu poder está a possibilidade de diluir essa aflição.

 

O pensamento isento de paixões é uma fortaleza, a mais poderosa a que o homem se pode recolher para ser inatingível. Quem desconhece esse refúgio é um ignorante! Quem, conhecendo-o, nele não se abriga, é um desgraçado!

 

Evite ser negligente nos negócios, confuso nas palavras, sujeito a devaneios nos pensamentos. Que do desalento e da súbita alegria fuja tua alma. Com muitas tarefas não conturbes tua vida.

 

Nasceram os homens uns para os outros. Instrua-os, pois, ou tolera-os.

 

Tendo merecido os qualificativos de bom, modesto, verdadeiro, sensato, resignado, magnânimo, esforça-te por não merecer os seus opostos. Tendo-os perdidos, reconquista-os.

 

Do que tens a fazer, nada faças sem plano, nem contrariamente à justiça.

 

Orgulhar-se da humildade é a pior forma de orgulho.

 

 

 

Cartas dos Mestres de Sabedoria (C. Jinarajadasa)

 

As doutrinas fundamentais de todas as religiões se comprovarão idênticas em seu significado esotérico, uma vez que sejam desagrilhoadas e libertadas do peso morto representado pelas interpretações dogmáticas, dos nomes pessoais, das concepções antropomórficas e dos sacerdotes assalariados. Maha-Chohan

 

Todos nós temos de nos livrar de nosso próprio Ego, o ser ilusório e aparente, a fim de reconhecer nosso verdadeiro ser em uma vida divina transcendental. Maha-Chohan

 

O mundo em geral, e especialmente a cristandade, abandonado por dois mil anos ao regime de um Deus pessoal, bem como a seus sistemas políticos e sociais baseados nessa idéia, provou agora ser um fracasso. Maha-Chohan

 

Para serem verdadeiras, a religião e a filosofia têm de oferecer a solução de todos os problemas. Que o mundo esteja moralmente em tão má condição é uma evidência conclusiva de que nenhuma de suas religiões e filosofias, aquelas das raças civilizadas menos do que qualquer outra, jamais possuíram a verdade. Maha-Chohan

 

Sejam verdadeiros, leais a suas promessas, ao seu dever sagrado, ao seu país e a suas próprias consciências. Sejam tolerantes com os demais, respeitem os pontos de vista religiosos dos outros, se desejam que os seus próprios sejam respeitados. K.H.

 

Seja puro, virtuoso e leve uma vida devotada, e estará protegido. K.H.

 

Quanto mais tarde um homem inicia a viver uma vida superior, tanto mais longo deve ser o período de provação, pois ele deve desfazer os efeitos de uma longa série de anos gastos em objetivos diametralmente opostos à verdadeira meta. K.H.

 

Não degrade a verdade impondo-a a mentes que não a desejam. Não procure obter auxílio daqueles cujos corações não são suficientemente patrióticos para um trabalho altruísta que vise ao bem de seus concidadãos. K.H.

 

A verdade nunca chega, como um ladrão, através de janelas e portas gradeadas com ferro. K.H.

 

Esforcem-se em direção à Luz, todos vocês, bravos guerreiros da Verdade, mas não deixem que o egoísmo penetre em seu meio, pois só o altruísmo abre todas as portas e janelas do Tabernáculo interior e as conserva abertas. K.H.

 

Nenhum fato ou explicação pode fazer um homem cego ver. K.H.

 

O progresso espiritual superior deve ser acompanhado pelo desenvolvimento intelectual em uma linha paralela. K.H.

 

Para abrir as portas do mistério é preciso não apenas levar uma vida da mais estrita integridade, mas aprender a discernir a verdade da falsidade. K.H.

 

Nenhum esforço é perdido jamais, cada causa produz necessariamente seus efeitos. O resultado pode variar de acordo com as circunstâncias, que são parte da causa. Sempre é mais sábio trabalhar e forçar a corrente dos acontecimentos do que esperar pelo tempo. K.H.

 

Quem pensa que a tarefa de trabalhar para os outros é muito árdua não deve empreendê-la. Os sofrimentos morais e espirituais do mundo são mais importantes, e necessitam auxílio e cura mais do que a ciência necessita nosso auxílio em qualquer campo de descoberta. K.H.

 

Os pecados de vocês? O maior é atribuir a Deus a tarefa de libertá-los deles. Esta não é uma piedade meritória, mas uma debilidade egoísta e indolente. M.

 

Credulidade gera credulidade e termina em hipocrisia. K.H.

 

A melhor maneira de corrigir o erro é um exame honesto e com a mente aberta de todos os fatos, subjetivos e objetivos. K.H.

 

“Até mesmo as pedras podem pregar sermões”. Não seja demasiado ansioso por “instruções”. Você sempre obterá o que necessita se o merecer, mas não mais do que merece ou estiver apta a assimilar. K.H.

 

As faculdades espirituais exigem ainda mais instruções e controle do que as atividades mentais, pois o intelecto absorve com mais facilidade o errado do que o certo. K.H.

 

Auto-respeito, autoconhecimento, autocontrole, só estes três dão à vida um poder soberano. K.H.

 

Semeie grãos saudáveis e escolha seu solo, e o futuro o recompensará com colheitas inesperadas. Serapis

 

Aquele que se prepara para compreender o Infinito, deve compreender antes o finito. Serapis

 

A lei do equilíbrio pode recompensar somente àqueles que resistiram ao tormento cruel dos desejos terrenos. Onde não há tentação, o mérito de resistir à sua frágil voz é nulo e não se pode reivindicar recompensa.

 

Temos medo somente daqueles que amamos ou odiamos. Evitamos somente aqueles pelos quais sentimos repulsa ou que nos atraem em demasia. Nunca evitamos aqueles pelos quais sentimos indiferença.

 

Aquele que se preocupa com a opinião da multidão nunca se elevará acima dela. Serapis

 

Aquele que ouve seu irmão ser ultrajado, e mantendo a face serena, deixa a ofensa passar despercebida, tacitamente concorda com o inimigo, como se admitisse que ela fosse apropriada e justa. Serapis

 

Uma mentira nunca tem mais sucesso do que quando coloca em seu anzol como isca algo de verdade. M.

 

Aqueles que ponderam e hesitam e são muito cautelosos antes de entrar no espírito de um esquema inteiramente novo merecem geralmente muito maior confiança do que aqueles que correm em direção de qualquer empreendimento novo como moscas que se lançam a um copo de leite fervendo. M.

 

Honestidade sem justiça é como a lanterna de um vigia bêbado – só serve para lançar luz em suas próprias imagens distorcidas, deixando tudo ao seu redor em escuridão ainda maior. M.

 

É mais meritório fazer seu dever sem qualquer busca de recompensa do que ficar barganhando reconhecimento por suas ações. M.

 

Viva no presente para o futuro, e deixe o passado ser como um livro aberto.

 

Aquele que deseja controlar os acontecimentos de sua vida aqui e além deve, antes de tudo, submeter a si próprio ao controle, e triunfar sobre cada tentação e cada infortúnio da carne e da mente. K.H.

 

Enquanto alguém não tiver desenvolvido um perfeito senso de justiça, deveria preferir errar por piedade do que cometer o menor ato de injustiça. K.H.

 

Afaste sempre o olhar das imperfeições do seu próximo, e concentre antes a atenção sobre suas próprias falhas a fim de corrigi-las e tornar-se mais sábio. Não mostre a disparidade entre a palavra e a ação de outro homem, mas, seja ele irmão ou vizinho, auxilie-o antes em sua árdua caminhada pela vida.

 

Ninguém deve capinar um pedaço de terra maior do que sua força e capacidade o permitam.

 

 

 

Jiddu Krishnamurti

 

Fora da Violência

 

Embora tecnologicamente o homem tenha progredido incrivelmente, ele continua o mesmo de há milhares de anos: pugnaz, ávido, invejoso, violento, sob uma pesada carga de sofrimento.

 

No momento em que ocorrer uma radical transformação de nós mesmos, estabeleceremos a paz no mundo.

 

Se puderdes por de lado todas as ideologias, todos os princípios, e só olhar o fato, estareis então em contato com uma coisa real, não mítica, não teórica.

 

Se existe qualquer espécie de preconceito ou tendência, se há gostar ou não gostar, se há condenação, não tendes então nenhuma possibilidade de aprender, e só ireis deformar o que observardes.

 

Ao vermos o que é falso, podemos afastá-lo de nós completamente. Só quando não o vemos há confusão.

 

Deixai de especular acerca do desconhecido. O que interesse é compreenderdes o conhecido e dele vos libertardes.

 

A mudança na sociedade é de secundária importância; ela virá, natural e inevitavelmente, quando, como ente humano, tiverdes operado a transformação de vós mesmo.

 

Para descobrirdes a verdade, deveis estar completamente livre, só. E “estar só” é voltar as costas à sociedade.

 

O homem que crê é neurótico, e neurótico é também o que adora uma imagem. Nestas neuroses encontra-se muita segurança. E a segurança não faz operar-se uma radical revolução em nós mesmos. Para realizá-la, cumpre observar sem escolha, sem nenhuma deformação causada pelo desejo, pelo prazer ou pelo medo. Temos de observar o que realmente somos, sem nenhuma espécie de fuga.

 

Havendo sanidade, a vida se torna sagrada; há nela suprema alegria, e podeis fazer o que quiserdes e tudo o que fazeis é virtuoso, verdadeiro.

 

Ao compreenderdes a desordem em vós existente, dessa compreensão vem a ordem – uma ordem precisa, matemática, em que não há deformação alguma. Tudo isso requer uma mente meditativa, uma mente capaz de olhar em silêncio.

 

Enquanto estivermos agindo de maneira fragmentária, estaremos, inevitavelmente, criando mais caos no mundo.

 

Se a crença se torna da máxima importância, o indivíduo está pronto a tudo sacrificar por ela; se essa crença é real ou nenhuma validade tem, não importa, desde que proporciona consolação, segurança, uma sensação de permanência.

 

Se existe alguma espécie de medo, oculto ou patente, a busca se torna uma evasão, uma fuga à realidade.

 

Tanto o crente como o descrente estão condicionados pela cultura da época, pela sociedade, pelo extraordinário “processo” da propaganda.

 

O homem realmente sério, que deveras deseja descobrir se algo existe de superior a esta coisa terrível chamada “existência”, deve, obviamente, estar de todo livre do dogma, da crença, da propaganda, de todo livre da estrutura em que foi criado, para ser então um homem religioso.

 

Para investigar, a pessoa deve estar libertada do medo, da ansiedade, do desejo de estar psicologicamente em segurança. São esses os requisitos que deve preencher uma pessoa verdadeiramente ardorosa e séria que deseja descobrir.

 

O instrumento capaz de investigar é a mente lúcida, em que não há nenhuma deformação, nenhum preconceito formado por conclusões, fórmulas, crenças.

 

Cumpre transformar a vida que estamos levando todos os dias; o ódio e a violência em nós existentes, nossas ansiedades, complexos de “culpa”, nossos impulsos para o êxito, para nos tornarmos “alguém” – tudo isso tem de acabar.

 

Ao observardes com vossos olhos e havendo a interferência de preconceitos de toda espécie, e do conhecimento, não estais então observando realmente. Assim, observar e escutar realmente – isso só se pode fazer em silêncio.

 

Para ser capaz de compreender o que é a Verdade, o que é a Realidade – se tal coisa existe – a pessoa deve estar livre de todos os artifícios, mistificações e ilusões humanas.

 

Não se pode prestar atenção quando estamos interpretando ou traduzindo ou comparando o que se nos dizcom o que já sabemos. Temos de escutar; esta é uma arte que devemos aprender, porquanto normalmente estamos sempre comparando, avaliando, julgando, aprovando, rejeitando e, portanto, não estamos escutando; estamos, com efeito, impedindo-nos de escutar.

 

A verdade é uma coisa que tem de ser vista imediatamente; e, para verdes qualquer coisa claramente, a ela deveis entregar vosso coração, vossa mente, e todo o vosso ser – imediatamente.

 

A verdade não pode ser achada mediante uma simples troca de opiniões ou idéias. Assim, se vamos conversar sobre qualquer problema, temos de fazê-lo num nível não intelectual, emocional ou sentimental.

 

Enquanto subsistir o “eu”, em qualquer forma que seja, sutil ou grosseira, haverá inevitavelmente violência.

 

Autodisciplina é uma violência que o individuo pratica contra si mesmo.

 

A desatenção gera a imagem; a atenção liberta a mente da imagem.

 

Compreender a vós mesmos é ajudar outro a compreender a si próprio; por conseguinte, aprender é ensinar.

 

A crença é uma forma de divisão e, portanto, uma forma de violência. Estar livre da violência implica estar livre de tudo o que o homem impôs ao homem: crenças, dogmas, rituais, minha pátria, vossa pátria, vosso deus e meu deus, minha opinião, vossa opinião, meu ideal. Essas coisas todas concorrem para separar os entes humanos e, por conseguinte, geram violência.

 

A pessoa que é capaz de sentimentalidade é incapaz de amar; a sentimentalidade gera brutalidade, crueldade, violência, e não amor.

 

A iluminação não vem de nenhum líder, de nenhum instrutor; vem da compreensão do que é, em nós, não pela fuga a nós mesmos. Cabe a cada um perceber exatamente o que se está passando em seu próprio campo psicológico; percebê-lo sem nenhuma deformação, nenhuma escolha, sem ressentimento, azedume, nenhuma explicação ou justificação – estar simplesmente cônscio.

 

A mente deve estar livre para observar. E ela não tem nenhuma possibilidade de observar, se estais seguindo algum sistema, algum guia, algum princípio, ou se estais acorrentado a qualquer espécie de crença.

 

A mente séria deve estar livre para observar, livre do peso morto do saber, da experiência, da tradição, que é memória acumulada – o passado.

 

Só a mente que está sempre nova aprende, e não aquela que leva uma pesada carga de saber.

 

Conhecimento é acumulação de associações, uma cadeia sem fim. E, se a mente se deixa colher por essa cadeia, torna-se impossível a mudança.

 

Toda forma de ajustamento, toda forma de desfiguração – deliberada ou inconsciente – é violência. Disciplinar-se a si próprio de acordo com um padrão, um ideal, um princípio, é uma forma de violência.

 

Se desejamos qualquer espécie de transformação social, torna-se necessária uma educação de nova espécie – a fim de que as crianças não sejam educadas para se ajustar.

 

O não nos identificarmos com nossa mobília, nosso saber, nossas experiências, nossas técnicas e conhecimentos tecnológicos, como engenheiros ou cientistas, o pormos fim a toda espécie de identificação, é uma forma de morte. Se o fizerdes alguma vez, vereis que daí não resulta descontentamento nem desespero, mas uma coisa maravilhosa: uma mente totalmente livre para observar e, portanto, para viver.

 

A Verdade não é “o que é”, mas a compreensão de “o que é” abre a porta conducente à Verdade. Se não compreenderdes, realmente, “o que é”, o que sois – se não o compreenderdes com o coração, com a mente, com o cérebro, com os sentimentos, não compreendereis o que é a Verdade.

 

O pensamento é sempre velho, nunca é livre, jamais pode ser novo. Quando o pensamento está em silêncio, há possibilidade de descobrir-se alguma coisa nova; mas o pensamento não pode, de modo nenhum, descobrir nada de novo.

 

A mente religiosa não tem absolutamente nada que ver com a crença em Deus; ela não tem nenhuma teoria, filosofia ou conclusão, porque é sem medo e, por conseguinte, não tem necessidade de crença.

 

A mente religiosa não pertence a nenhum grupo, nenhuma seita, nenhuma crença, nenhuma igreja, e, portanto, é capaz de olhar as coisas diretamente e de imediato compreendê-las.

 

Ponde completamente de parte toda espécie de autoridade, toda busca de instrutores, porque a verdade não pertence a ninguém, não é uma coisa pessoal.

 

A mente sujeita ao controle e a disciplina, no sentido de ajustamento a um padrão estabelecido pela própria pessoa, pela sociedade ou por determinada cultura, essa mente não é livre, é uma mente deformada.

 

Para ver qualquer coisa que é verdadeira, que é nova e deve ser descoberta, percebida, qualquer coisa não criada ou feita anteriormente, deve a mente estar livre do conhecido.

 

Nossa vida é uma série de ajustamentos; ou há o ajustamento motivado pelo medo, ou o ajustamento motivado pelo desejo de prazer. A mente não tem então possibilidade de descobrir qualquer coisa de novo.

 

O sofrimento, com a autocompaixão que lhe é própria, só tem fim quando há autoconhecimento.

 

O esclarecimento não vem por intermédio de outrem, mas sim por meio de vossa própria observação e compreensão de vós mesmos.

 

A mente que tem conclusões não é uma mente livre.

 

A ação imediata é a ação da inteligência: ver o perigo e agir; não há separação entre o ver e o agir. O próprio percebimento é ação.

 

Tudo o que o pensamento “projeta” se encontra no campo do tempo; ele pode inventar Deus, conceber um estado atemporal, inventar um céu, mas tudo é produto dele próprio, por conseguinte coisa do tempo, do passado – irreal.

 

Temos de efetuar em nós mesmos, do mais alto ao mais baixo nível, uma transformação de todo o nosso pensar, viver e sentir; então, só então, será possível a transformação social.

 

Todos falam de paz, mas a estão negando, porque só é possível a paz, a realidade e o amor, quando não há divisão.

 

A crença se torna existente quando há medo.

 

A Verdade é algo que só pode ser descoberto se não há medo.

 

Devemos por em questão todas as coisas da vida – o usar cabelos curtos ou longos, as roupas que vestimos, nossa maneira de andar, de comer, de pensar, de sentir: a mente se torna, então, sobremodo sensível, alertada, inteligente. Então, a mente é capaz de amar; e essa é a mente religiosa.

 

 

 

 

A Primeira e Última Liberdade

 

Vem a compreensão quando nós, vós e eu, nos encontramos no mesmo nível, ao mesmo tempo. Isso só pode acontecer quando há real afeição entre as pessoas, entre marido e mulher, entre amigos íntimos. Essa é a verdadeira comunhão. É instantânea a compreensão quando nos encontramos no mesmo nível, ao mesmo tempo.

 

As seitas que vos oferecem um sistema para a solução do problema do sofrimento econômico, social ou religioso são as piores; porque então o sistema se torna mais importante do que o homem – quer se trate de um sistema religioso ou de um sistema de esquerda ou da direita.

 

O real está perto, não precisamos procurá-lo; o homem que procura a verdade nunca a encontrará. A verdade se acha no que é – e nisso consiste sua beleza. Mas no momento em que a concebeis e começais a procurá-la, começais a lutar; e o homem que luta não pode compreender.

 

Se, vivendo no mundo, nos recusarmos a dele fazer parte, ajudaremos outros a sair deste caos, não no futuro, não amanhã, mas agora.

 

A verdadeira revolução só poderá realizar-se quando vós, o indivíduo, vos tornardes bem cônscio das coisas, em vossas relações com outrem.

 

Quando dependemos de um sistema para a transformação da sociedade, estamos simplesmente evitando o problema, porquanto sistema algum pode transformar o homem; o homem sempre transforma o sistema.

 

Enquanto eu não compreender a mim mesmo não tenho base para o pensamento, e toda minha busca será em vão. Posse refugiar-me em ilusões, fugir da competição, da luta, do conflito; posso venerar uma pessoa; posso buscar minha salvação através de outrem. Mas enquanto eu desconhecer a mim mesmo, enquanto desconhecer o processo total de mim mesmo, não tenho base para o pensamento, para o afeto, para a ação.

 

Se não conheceis a vós mesmos, se não conheceis vossa própria maneira de pensar e por que pensais certas coisas; se não conheceis o fundo do vosso condicionamento e não sabeis por que tendes certas crenças relativas à arte e à religião, relativas à pátria, ao vosso próximo e a vós mesmos, como podeis pensar de modo correto a respeito de qualquer coisa?

 

As idéias geram sempre inimizade, confusão, conflito.

 

Se dependerdes, para o descobrimento de vós mesmos, daquilo que se encontra nos livros, ficareis simplesmente na dependência de uma opinião.

 

Para se achar a verdade relativa à questão, é preciso estarmos livres de tudo quanto é propaganda, o que significa estarmos habilitados a estudar o problema independentemente da opinião.

 

A sociedade é o produto de nossas relações e, se estas são confusas, egocêntricas, interesseiras, limitadas, nacionais, “projetamos” tudo isso e produzimos caos no mundo.

 

A revolução na sociedade deve começar pela transformação interior, a transformação psicológica do indivíduo.

 

Para compreendermos o que está ruindo, temos de investigar negativamente, e não com um sistema positivo, uma fórmula positiva, uma conclusão positiva.

 

Uma das causas fundamentais da desintegração da sociedade é, pois, a imitação, e um dos fatores desintegradores é o guia, o líder, cuja essência mesma é a imitação.

 

O mundo é a “projeção” de nós mesmos, e para compreendê-lo precisamos compreender a nós mesmos. O mundo não está separado de nós; nós somos o mundo, e nossos problemas são os problemas do mundo.

 

O autoconhecimento é o começo da sabedoria e, por conseguinte, o começo da transformação ou regeneração.

 

Para o indivíduo conhecer-se a si mesmo deve ter lucidez, vigilância, por parte da mente, com inteira independência de todas as crenças, de toda idealização, uma vez que as crenças e os ideais só nos oferecem uma cor, pervertendo o exato percebimento.

 

A verdade é isto: termos a capacidade de nos encontrar com todas as coisas de maneira nova, de momento em momento, sem a reação condicionadora do passado, de modo que não haja efeito cumulativo atuando como barreira entre nós e aquilo que é.

 

Uma taça só tem utilidade quando vazia e a mente que anda cheia de crenças, de dogmas, de asserções, de citações, é, com efeito, estéril; é apenas mente repetitiva, maquinal.

 

Uma crença, religiosa ou política, impede-nos, obviamente, a compreensão de nós mesmos.

 

Se não tivermos crenças com que a mente esteja identificada, então, livre dessa identificação, ela é capaz de olhar a si mesma tal como é; começa aí, sem dúvida, a compreensão de nós mesmos.

 

Os indivíduos mais ponderados, mais despertos, mais alertados, são talvez os que menos crêem. Pois a crença limita, isola.

 

Um homem que deseja a paz, que deseja criar um mundo novo, um mundo feliz, não pode, decerto, isolar-se numa forma qualquer de crença.

 

Onde há processe de desejo, tem de haver processo de isolamento pela crença, porque é bem óbvio que nós cremos para ter segurança, econômica, espiritual e também interior.

 

Enquanto não compreendermos o processo do desejo, sob a forma de crença, tem de haver luta, tem de haver conflito, tem de haver sofrimento, e o homem estará sempre contra o homem.

 

Quanto maior a carga de conhecimentos da mente, tanto menos capaz ela é de compreensão.

 

Se desejamos viver em paz uns com os outros, é claro que a ambição deve deixar de existir completamente, não só a ambição política, econômica, social, mas também aquela outra ambição mais sutil e mais perniciosa, que é a ambição espiritual: ser alguma coisa.

 

Se desejais descobrir uma coisa nova, experimentar algo que não seja projetado pela vossa imaginação, vossa mente deve se livre.

 

O desejo de nos preenchermos, de nos tornarmos alguma coisa, surge quando percebemos que nada somos. Porque sou nada, porque sou insuficiente, vazio, interiormente pobre, luto por “vir a ser” alguma coisa; exterior ou interiormente, luto por me preencher numa pessoa, numa coisa, numa idéia.

 

A realidade, a verdade, não é reconhecível. Para que a verdade surja, a crença, o conhecimento, o experimentar, o cultivo da virtude – tudo isso tem de desaparecer.

 

O homem cheio de riquezas mundanas, ou o homem rico de saber e de crença, jamais conhecerá nada senão a escuridão, e será um foco de malefícios e tribulações.

 

O temor começa a existir quando desejo viver segundo determinado padrão. Viver sem medo significa viver sem determinado padrão. Quando desejo uma certa maneira de viver, isso em si é uma fonte de temor.

 

Se não somos simples não podemos ser sensíveis às mensagens interiores das coisas.

 

A mente que procura, que busca, que tateia, que se agita, não é simples. A mente que se sujeita a qualquer padrão de autoridade, interior ou exterior, não pode ser sensível. Só quando a mente é deveras sensível, vigilante, e percebe tudo o que se passa em si própria, suas reações, seus pensamentos; só quando a mente não está mais interessada em “vir a ser”, não mais se está moldando, com o fim de ser alguma coisa – só então está apta a receber aquilo que é a verdade. Só então pode haver felicidade. Porque a felicidade não é um fim: é o resultado da realidade.

 

Quando se tem percebimento, pode-se ver o inteiro processo do pensar e da ação; mas isso só acontece quando não há condenação. Se condeno uma coisa, não a compreendo, e condenar é uma forma de evitar qualquer espécie de compreensão.

 

O problema é sempre o de relação – com coisas, com pessoas e com idéias; não existe outro problema.

 

A realidade não é cognoscível pela mente, porque a mente resulta do conhecido, do passado; por esse motivo deve a mente compreender a si própria, compreender seu funcionamento, sua verdade, pois só então pode existir o desconhecido.

 

A vida são relações, que se expressam no contato com coisas, pessoas, idéias. Compreendendo as relações, teremos capacidade para enfrentar a vida de maneira completa, adequada.

 

Enquanto tiverdes uma fronteira nacional, econômica, religiosa ou social é bem claro que não pode haver paz no mundo.

 

Quando resistis a uma coisa, essa própria resistência indica que estais em conflito com ela.

 

Se, em cada um de nós, se tornar inexistente o centro do “eu”, com seu desejo de domínio, posição, autoridade, subsistência, autoperpetuação, não há dúvida de que nossos problemas deixarão de existir.

 

A crença, o conhecimento, a disciplina, a experiência, todo o processo de alcançar um resultado ou alvo, a ambição, o “vir a ser” alguma coisa nesta vida ou numa vida futura – tudo é processo de isolamento, processo causador de destruição, amarguras, guerras, do qual não há possibilidade de fuga pela ação coletiva.

 

Quanto mais enganamos a nós mesmos, tanto maior se torna a força da ilusão, porque a ilusão nos infunde certa vitalidade, certa energia, certa capacidade para impormos a outrem nossas ilusões.

 

Devemos, em primeiro lugar, perceber as atividades sobremodo sutis do “eu”, da mente, tornar-nos cônscios das idéias, crenças, especulações, e abandoná-las todas, porque são ilusões.

 

Tudo o que nasce do pensamento é condicionado, produto do tempo, da memória; por conseqüência, não é real.

 

A única coisa capaz de operar transformação fundamental, libertação psicológica criadora, é a vigilância cotidiana, é estarmos cônscios, momento por momento, dos nossos motivos conscientes e inconscientes. Compreendendo que as disciplinas, as crenças, os ideais só servem para fortalecer o “eu” e são, por conseguinte, totalmente fúteis.

 

A ação que se baseia em sistema ou idéia levará inevitavelmente à frustração.

 

Procuramos um instrutor porque estamos confusos. Se percebêsseis as coisas com clareza, não procuraríeis nenhum guru. É óbvio que se fôsseis profundamente feliz, se não houvesse problemas, se compreendêsseis completamente a vida, não procuraríeis guru.

 

Nenhum guru, nenhum livro ou texto sagrado pode dar-vos o autoconhecimento. Só pode vir o autoconhecimento quando estais cônscios de vós mesmos, nas relações. Ser é estar em relação.

 

A mente é o instrumento do conhecido e, portanto, não pode achar o desconhecido; só pode mover-se do conhecido para o conhecido.

 

Todo ideal é autoprojeção, coisa fictícia, irreal. O real é o que é, não o seu oposto. A mente que está buscando a realidade, procurando Deus, está buscando o conhecido. Quando pensais em Deus, vosso Deus é a projeção do próprio pensamento, o resultado de influências sociais. Só podeis pensar no conhecido; não podeis pensar no desconhecido, não podeis concentrar-vos na verdade. No momento em que pensais no desconhecido, ele é apenas o conhecido que projetastes. Deus, ou a verdade, é impensável.

 

Ninguém pode guiar-vos à verdade e se alguém voa guia, só pode levar-vos ao conhecido.

 

Só se pode pensar sobre coisa que se conhece.

 

O desconhecido só pode se manifestar quando o conhecido é compreendido, dissolvido, abandonado.

 

Para poder descobrir qualquer coisa nova, tendes de começar com vossos próprios recursos; tendes de iniciar a jornada despojado de tudo, principalmente do vosso saber.

 

Aquele que constantemente se protege com o saber não é, por certo, um homem que busca a verdade.

 

A disciplina, que é resistência, só tem o efeito de criar hábito, e o hábito por certo não pode gerar inteligência. O hábito, o exercício, nunca pode criar inteligência.

 

Não há liberdade se estais em busca de um fim, porquanto estais preso a esse fim. Podeis estar livre do passado, mas o futuro vos prende, e isso não é liberdade.

 

Todos nós vivemos mergulhados em nossas atividades, nos livros, relações, idéias, que nos impedem de estar cônscios da solidão.

 

Quando se dá importância a valores secundários, eles nos conduzem ao sofrimento e ao caos; os valores secundários são, necessariamente, valores dos sentidos.

 

Quando nos exercitamos numa coisa, ela se torna um hábito, e o percebimento não é o hábito. A mente habituada é mente insensível. A mente que funciona na rotina de determinada ação está embotada, é inflexível, e o percebimento requer constante flexibilidade e vigilância.

 

Se, em vez de crença, houvesse boa vontade, amor e consideração entre os homens, não haveria guerras. Mas nós nos alimentamos de crenças, idéias e dogmas, fomentando assim o descontentamento.

 

Só pode haver ação correta quando há pensar correto, quando há autoconhecimento. Se não conheceis a vós mesmos, não há paz.

 

A compreensão, por certo, é integral, não dividida, não parcial. Ou compreendo uma coisa, ou não a compreendo.

 

Está sobremodo embotada a mente que necessita de estímulo e vai procurá-la fora de si próprio.

 

Procuramos preencher nosso vazio com ritos, com conhecimentos, com tagarelices, com reuniões partidárias, enfim recorrendo a numerosos meios de fuga, e esses meios de fuga se tornam importantíssimos, e não a compreensão do que é.

 

O hábito faz dormir.

 

Só o homem que não conhece a realidade se entretém com palavras sem significação. O homem que diz que sabe, não sabe. O homem que conhece a realidade, momento por momento, não tem meios de comunicar essa realidade. A crença é negação da verdade, a crença é um obstáculo à verdade; crer em Deus não é achar a Deus. Nem o crente nem o descrente acharão a Deus. Porque a realidade é o desconhecido, e vossa crença ou descrença do desconhecido é simples autoprojeção e, por conseguinte, não é real.

 

Se deveras crêsseis em Deus, se isso fosse uma experiência real, vossos semblantes irradiariam afeto, e não estaríeis destruindo vosso semelhante.

 

Deus não é produto da mente, não é resultado de autoprojeção; só pode surgir quando há virtude, que é liberdade. Virtude é enfrentar o fato, o que é. E enfrentar o fato é um estado de bem-aventurança. Só quando a mente está repleta de felicidade, tranqüila, imóvel, sem nenhuma projeção de pensamento, consciente ou inconsciente – só então se manifesta o Eterno.

 

A memória de fatos, de coisas técnicas, é uma necessidade óbvia; mas a memória como retenção psicológica é prejudicial à compreensão da vida, à comunhão.

 

O conhecido é criação da mente, porque o pensamento é resultado do conhecido, do passado, e o pensamento só pode criar o que conhece.

 

A mente só pode receber a realidade quando está de todo tranqüila, sem pedir, sem desejar, sem ansiar, sem rogar, seja para si, seja para a nação ou para outra pessoa. Quando a mente está de todo tranqüila, quando cessou o desejo, só então a realidade pode manifestar-se.

 

O homem que está plenamente cônscio está meditando; não reza, porque não precisa de coisa alguma.

 

O amor, por certo, não é um sentimento. Ser sentimental, ser emotivo, não é indício de amor, porque a sentimentalidade e a emoção não passam de meras sensações.

 

Só quando morremos cada dia para tudo o que é velho pode haver o novo.

 

Sem se estar livre do resíduo da experiência não pode haver o recebimento do novo.

 

O homem feliz não se preocupa em ser rico ou em ser pobre, não lhe importa o nível social, a casta ou a nação a que pertença. Ele não tem guias, nem deuses, nem templos, nem igrejas, e, portanto, não tem disputas nem inimizades.

 

Não se precisa procurar a luz. Haverá luz quando não houver mais escuridão, pois a escuridão não nos leva à luz.

 

O homem que venera outro homem, por ter esse outro alcançado a realidade, está, em verdade, rendendo culto à autoridade e, por conseguinte, nunca encontrará a verdade.

 

Porque não amamos e porque não somos felizes, pomos nosso interesse nas coisas, pensando que elas nos trarão a felicidade, e uma das coisas em que pomos nosso interesse é Deus.

 

Enquanto funcionar a memória, a mente não poderá compreender o que é. Nossa mente, entretanto, o nosso ser total, se torna extraordinariamente criador, passivamente vigilante, ao ser compreendida a significação do findar, porque no findar há renovação, ao passo que na continuidade há morte, decomposição.

 

Para se receber a verdade, conhece sua beleza, suas delícias, é necessária receptividade instantânea, não anuviada de teorias, de temores, de soluções.

 

O homem que muito tem receia a revolução, interior e exterior.

 

A mente sutil não é simples; a mente que trabalha para a consecução de um fim, uma recompensa, ou é inspirada pelo temor, esta mente não é simples. A mente que está carregada de conhecimentos, não é simples; a mente que está paralisada pelas crenças, não é tampouco simples. A mente que se identifica com algo maior e luta por conservar essa identidade, não é simples.

 

A mente limitada pela crença não pode ser simples. A mente imobilizada pelo saber não é simples. A mente distraída por coisas como Deus, mulheres, música, não é simples. A mente presa à rotina do escritório, dos ritos, das orações, não é simples. Simplicidade é ação sem idéia.

 

A realidade só pode ser compreendida quando se vive, não quando se foge. Buscando uma finalidade para a vida, estais realmente fugindo, e não sabeis o que é a vida.

 

Quando há amor, que é sua própria eternidade, não há mais a busca de Deus, porque o amor é Deus.

 

Para encontrar a finalidade da vida temos de transpor a porta de nós mesmos.

 

O amor só pode ser encontrado na ação, que são as relações.

 

Ver o falso como falso e o verdadeiro como verdadeiro é transformação, porque quando se vê uma coisa claramente, como verdade, esta verdade liberta. Quando se vê que uma coisa é falsa, esta coisa falsa se extingue.

 

 

 

 

Diálogos sobre a Vida

 

Seguir outro homem, por mais ilustrado ou nobre que ele seja, é erguer uma barreira à compreensão.

 

O pensar positivo, que se baseia na experiência, é sempre produto do passado, e esse pensar nunca descobrirá nada novo.

 

Os caminhos da tradição conduzem, de modo inevitável, à mediocridade, e a mente que está aprisionada na tradição não pode perceber o que é verdadeiro.

 

A acumulação de fatos não conduz à compreensão da vida. O saber é uma coisa e a compreensão outra coisa. O saber não conduz à compreensão; mas a compreensão pode enriquecer o saber, e o saber pode completar a compreensão.

 

O pensar positivo é processo de ajustamento e a mente que se ajusta nunca se achará num estado de descobrimento.

 

É certo que qualquer ato baseado na autoridade de um livro, por mais sagrado que este seja, ou na autoridade de uma pessoa, por mais nobre e piedosa, é um ato impensado, que inevitavelmente produzirá confusão e sofrimento.

 

Do mais preeminente político ao mero cabo eleitoral de província, do mais alto prelado ao simples vigário de freguesia, do maior reformador ao azafamado assistente social – cada um se está servindo da pátria, dos pobres, do nome de Deus, como meio de realizar suas próprias idéias, esperanças, utopias. Ele, o que assim procede, é o centro de tudo; para ele, o poder e a glória, mas em nome do povo, em nome de coisas sagradas, em nome dos oprimidos.

 

Não há condicionamento nobre ou condicionamento melhor; todo condicionamento envolve sofrimento. O desejo de ser ou de não ser gera condicionamento, e é esse desejo que importa compreender.

 

Os pais e a sociedade estão moldando a mentalidade das crianças por meio de tradições, crenças, dogmas, conclusões, opiniões, e essa herança psicológica impede o advento de uma nova ordem social.

 

O desejo de ser guiado leva ao ajustamento, e a mente que se ajusta é incapaz de encontrar o verdadeiro.

 

Procurar as luzes de outrem, sem autoconhecimento, é seguir cegamente. Todo seguir é cego.

 

O seguir é, tão só, um sintoma de profunda ânsia de segurança.

 

Todas as atividades de uma mente confusa só podem gerar confusão maior.

 

Começar com uma conclusão põe fim ao pensar.

 

O que é verdadeiro não necessita de interpretação, e o que se interpreta não é verdadeiro. O intérprete se torna um traidor, porquanto o que oferece é apenas sua própria opinião, e opinião não é a verdade.

 

O descontentamento é uma chama que se deve manter viva, e que não se deve abafar com um certo interesse ou atividade, a que a pessoa se entrega como reação à dor que ele causa.

 

Religião não é dogmas e crenças, rituais e superstições; não é tampouco devoção visante à salvação pessoal, pois isso é atividade egocêntrica. Religião é a conduta total da vida; é compreensão da verdade, que não é projeção da mente.

 

Tendes de morrer para tudo o que é conhecido para que possa existir o desconhecido.

 

Para achar a Verdade, ou Deus, não deve haver nem crença nem descrença. O crente é como o incréu; nenhum dos dois descobrirá a verdade, porque seu pensar foi moldado por sua educação, sem ambiente, seu meio cultural, e por suas próprias esperanças e temores, alegrias e pesares. O homem que não está livre de todas essas influências condicionantes, por mais que se esforce, nunca descobrirá a verdade.

 

Para descobrir o que é verdadeiro, ou o que é falso, a mente precisa estar livre. Buscar a Deus, sem compreensão de si mesmo, é de mui pouca significação. A busca que tem motivo não é busca nenhuma.

 

Para se produzir uma transformação radical em nossa maneira de vida há necessidade de crescente percebimento e grande profundeza de sentimento – e isso é amor. Com amor, tudo é possível.

 

Se pudermos perceber que se nos concentrarmos exclusivamente numa parte não podemos ter a compreensão do todo, talvez então nos deixaremos confundir em relação às partes. Se não somos capazes de perceber o todo, a parte assume uma importância maior do que tem.

 

O deus de uma mente pequena é também pequeno; sua pequenez se mede pela pequenez da mente que deposita flores a seus pés.

 

Para se acender a chama da inteligência e mantê-la sempre viva, requer-se vigilância e muita simplicidade.

 

Pensar, partindo de uma conclusão ou convicção, não é pensar nada.

 

Vossas crenças se baseiam em vossa educação, vosso meio cultural; são produto de vosso fundo, de influências sociais, ancestrais, religiosas ou tradicionais.

 

Quando a mente já está condicionada por um sistema de crenças, como poderá descobrir a verdade a respeito delas? É claro que a mente deve em primeiro lugar libertar-se de suas crenças, porque só então poderá ser percebida a verdade concernente a elas.

 

Poder, no sentido de ascendência, predomínio, influência coercitiva sobre outros, é e sempre foi uma coisa má; não há poder “bom”.

 

A reforma, mesmo necessária, não é muito significativa se não se levar em consideração a totalidade do homem. O podar de uns poucos ramos mortos não torna sadia a árvore, quando as raízes não estão sãs. As meras reformas sempre tornam necessárias novas reformas. O que se faz necessário é uma revolução total em nosso pensar.

 

O homem que está buscando Deus é verdadeiramente religioso? Como pode buscar Deus se não O conhece? E, se conhece o Deus que busca, o que conhece é apenas coisa que lhe ensinaram ou coisa que leu; ou, ainda, coisa baseada em sua experiência pessoal, por sua vez moldada pela tradição e pelo seu próprio desejo de encontrar segurança num outro mundo.

 

É necessária a libertação do conhecido para que possa surgir o desconhecido.

 

A ambição de preenchimento ou de vir a ser alguma coisa contém sempre o germe da frustração, do medo, do sofrimento.

 

Toda compulsão, por mais sutil que seja, é produto de ignorância; nasce do desejo de recompensa ou do medo à punição.

 

As pessoas, em sua maioria, têm esse sentimento de solidão e o medo a ele inerente, mas o sufocam, fogem dele, absorvem-se em certa atividade religiosa ou de outra natureza. A atividade a que se entregam é seu refúgio; nela se deixam absorver inteiramente e esta é a razão por que sabem defendê-la tão violentamente.

 

Uma ferida profunda precisa ser examinada, tratada, curada; nunca é bom tapá-la ou recusar-se a olhá-la.

 

A verdade não pode ser organizada e nenhuma organização pode conduzir o homem à verdade.

 

A verdade não tem morada fixa; ela é uma coisa viva, mais viva, mais dinâmica do que qualquer coisa que a mente possa conceber. Portanto, não pode haver caminho para ela.

 

O importante é libertar a mente da inveja, do ódio e da violência; e, para isso, não se necessita de nenhuma organização. As chamadas organizações religiosas nunca libertam a mente; só a obrigam a ajustar-se a certo dogma ou crença.

 

Cada um precisa ser a luz de si mesmo; seguir a luz de outro só leva à escuridão.

 

Um homem verdadeiramente religioso não se preocupa com política; para ele só há ação, ação religiosa total e não aquelas atividades fragmentárias chamadas políticas e sociais.

 

O homem que segue a outro, seja o maior dos santos ou qualquer pregador de esquina, é essencialmente irreligioso.

 

O homem que busca o poder e aceita o poder, em qualquer forma que seja, é fundamentalmente irreligioso.

 

Crenças e dogmas têm muito pouco valor; são, de fato, ativamente nocivas, porquanto separam o homem do homem e geram animosidade. O que importa é que a mente se liberte da inveja, da ambição, do desejo de poder, porque essas coisas destroem a compaixão. Amar, ser compassivo, isso procede do Real.

 

Pensar, partindo de uma conclusão, de uma crença, não é pensar, absolutamente.

 

A mente se move do conhecido para o conhecido, de uma certeza para outra; por isso nunca há libertação do conhecido.

 

As religiões organizadas apenas condicionam a mente a determinado padrão de pensamento.

 

Que eu seja simples, pois então, talvez, venha a compreender o que é profundo.

 

 

 

 

Liberte-se do Passado (ver livro)

 

 

Somos o resultado de toda espécie de influência e em nós nada existe de novo, que tenha sido descoberto por nós mesmos, que seja original, inédito, claro.

 

A mente que foi torturada, subjugada, a mente que deseja fugir a toda agitação, que renunciou ao mundo exterior e se tornou embotada pela disciplina e pelo ajustamento – essa mente, não importa o quanto procure, só achará o que estiver em conformidade com sua própria deformação.

 

A compreensão de si próprio é o começo da sabedoria.

 

Qualquer espécie de filosofia, qualquer espécie de teologia representa meramente uma fuga da realidade, do que existe.

 

A verdade não tem caminho, e essa é sua beleza; ela é viva.

 

Livrar-se de toda autoridade, seja própria, seja de outrem, é morrer para todas as coisas de ontem - para que a mente seja sempre fresca, sempre juvenil, inocente, cheia de vigor e de paixão. Só nesse estado é que se aprende e observa.

 

Toda autoridade, de qualquer espécie que seja, sobretudo no campo do pensamento e da compreensão, é a coisa mais destrutiva e danosa que existe.

 

Só posso observar-me em relação, porque a vida é toda de relação. De nada serve ficar sentado num canto a meditar sobre mim mesmo. Não posso existir sozinho. Só existo em relação com pessoas, coisas e idéias e, estudando minha relação com as pessoas e coisas exteriores, assim como com as interiores, começo a compreender a mim mesmo.

 

A maioria de nós percorre a vida desatentamente, reagindo sem pensar, de acordo com o ambiente em que fomos criados, e tais reações só acarretam mais servidão, mais condicionamento; mas, no momento em que aplica toda a atenção ao seu condicionamento, você se verá inteiramente livre do passado; ele se desprenderá naturalmente de você.

 

Atenção não é a mesma coisa que concentração. A concentração é exclusão; a atenção é percebimento total, que nada exclui.

 

A mente que não está tolhida pela memória tem a verdadeira liberdade.

 

Tudo o que é resultado da memória é velho e, por conseguinte, nunca é livre. Liberdade de pensamento é algo que não existe; é puro contra-senso.

 

Esse anseio de posição, de prestígio, de poder, de ser reconhecido pela sociedade como pessoa de destaque representa uma vontade de dominar os outros, e essa vontade de domínio é uma forma de agressão.

 

Você não pode se compreender de acordo com Freud, Jung ou de acordo comigo. As teorias de outras pessoas não têm importância nenhuma.

 

Quando perceber que você é uma parte do medo, que não está separado dele, que você é o medo, então nada poderá fazer a respeito dele: o medo acabou totalmente.

 

Violência não é meramente assassinar. Há violência no uso de uma palavra áspera, num gesto de desprezo, na obediência motivada pelo medo.

 

Quando se separa, pela crença, pela nacionalidade, pela tradição, gera-se violência. Assim, o homem que deseja compreender a violência não deve pertencer a nenhuma nação, nenhuma religião, nenhum partido político ou sistema partidário; o que deve interessá-lo é a compreensão total da humanidade.x

 

O homem que é realmente sério, que sente a ânsia de descobrir o que é a verdade, o que é o amor, não tem conceito de espécie alguma. Só vive dentro de o que é.

 

Viver com plenitude no momento presente é viver com o que é, o real, sem idéia de condenação ou justificação; então você o compreende tão completamente que fica livre dele. Quando se vê claramente, o problema está resolvido.

 

Todo estímulo, seja da igreja, seja do álcool ou das drogas, da palavra escrita ou falada, acarretará inevitavelmente a dependência – e essa dependência nos impede de ver claramente, por nós mesmos, e, por conseguinte, de ter a energia vital.

 

O aceitar e seguir uma ideologia, boa ou má, sagrada ou profana, é uma atividade fragmentária e, portanto, uma causa de conflito; e o conflito surge inevitavelmente quando há separação entre o que “deveria ser” e “o que é”, e todo conflito é dissipação de energia.

 

A mente que está confusa, não importa o que faça, em qualquer nível que seja, permanecerá confusa.

 

Nunca as agonias da repressão, nem a brutalidade da disciplina de ajustamento a um padrão conduziram à verdade. Para encontrar-se com a verdade, a mente deve estar completamente livre e sem a mínima deformação.

 

Para se viver completamente, totalmente, de modo que cada dia seja uma nova beleza, tem-se de morrer para todas as coisas de ontem, pois, do contrário, viveremos mecanicamente, e uma mente mecânica jamais saberá o que é o amor ou o que é a liberdade.

 

Em geral tememos a morte porque não sabemos o que significa viver. Não sabemos viver e, por isso, não sabemos morrer. Enquanto tivermos medo da vida, teremos medo da morte. O homem que não teme a vida não teme a insegurança, porque compreende que, interiormente, psicologicamente, não existe segurança nenhuma.

 

Estar livre do conhecimento é morrer; e, então, você estará vivendo!

 

Dividir qualquer coisa em o que deveria ser e o que é, é a maneira mais ilusória de enfrentar a vida.

 

Zelar, com efeito, é cuidar como se cuida de uma árvore ou de uma planta, regando-a, estudando as suas necessidades, escolhendo o solo mais adequado, tratando-a com carinho e ternura; quando prepara os seus filhos para se adaptarem à sociedade, você os está preparando para serem mortos. Se amasse seus filhos, não haveria guerras.

 

O sofrimento é produto do “eu”, o sofrimento é criado pelo pensamento, o sofrimento é produto do tempo.

 

Quando há amor e beleza, tudo o que se faz é correto, tudo o que se faz é ordem. Se sabe amar, você pode fazer o que desejar, porque o amor resolverá todos os outros problemas.

 

A mente que busca não é uma mente apaixonada, e não buscar o amor é a única maneira de encontrá-lo; encontrá-lo inesperadamente e não como resultado de qualquer esforço ou experiência.

 

Se você está diretamente em contato com a natureza; se observa o movimento de uma ave a voar, se vê a beleza de cada movimento das nuvens, observa as sombras nos montes ou a beleza manifestada no rosto de outra pessoa, acha que terá vontade de ir a um museu para ver quadros?

 

Só quando há desatenção existe “observador e coisa observada”. Quando você está olhando com atenção completa, não há espaço para nenhum conceito, fórmula, lembrança.

 

É só quando vemos sem nenhum preconceito, nenhuma imagem, que somos capazes de estar em contato direto com alguma coisa na vida.

 

A própria atenção que você dá a um problema constitui a energia que resolve o problema.

 

Tudo depende de você. Não há líder, não há instrutor, não há ninguém que possa ensinar-lhe o que deve fazer. Você está só neste mundo insano e brutal.

 

O observador é a coisa observada.

 

O pensamento é tortuoso, porque pode inventar tudo e ver coisas que não existem. É capaz dos mais extraordinários truques e, portanto, não merece confiança.

 

Se há o percebimento da origem do pensamento, nele já não existe nenhuma contradição.

 

Ter silêncio e espaço interiores é muito importante, porque implica liberdade para existir, mover-se, atuar, voar.

 

Apenas a mente que está só, livre de influências, de disciplinas, do controle de uma infinita variedade de experiências, é capaz de encontrar-se com algo totalmente novo.

 

Só há possibilidade de clareza quando a mente se encontra em silêncio.

 

Se a mente é mesquinha, ciumenta, ansiosa, a pessoa poderá tomar a mais moderna droga, porém só verá sua própria e insignificante criação, as projeções sem importância de seu próprio fundo condicionado.

 

Tudo o que é mensurável encontra-se nos limites do pensamento e tem a propriedade de criar a ilusão.

 

Se na busca de uma coisa fundamental, tal como a verdade, o prazer é a vossa medida, já projetastes o que a experiência será e, por conseguinte, ela já não é válida.

 

A mente que está buscando e ansiando por experiências mais amplas e profundas é uma mente muito superficial e embotada, porquanto está sempre vivendo com suas memórias.

 

Você pode influir no mundo de uma maneira admirável se em si mesmo você não for violento, se viver realmente, em cada dia, uma vida pacífica, uma vida sem competição, sem ambição, sem inveja, uma vida não causadora de inimizade.

 

Todo movimento que vale o esforço, toda ação de profunda significação, tem de começar em cada um de nós.

 

A mente religiosa difere completamente da mente que crê na religião. Você não pode ser religioso e ao mesmo tempo hinduísta, muçulmano, cristão, budista. A mente religiosa nada busca, não pode fazer experiências com a verdade. A verdade não é uma certa coisa dita por seu prazer ou sua dor, ou por seu condicionamento hinduísta – ou qualquer que seja a religião a que você pertence. A mente religiosa é um estado de espírito em que não há medo e, por conseguinte, não há crença de espécie alguma, porém tão só o que é, o que realmente é.

 

Você não quer olhar de frente a sua própria vida. E só ela é que importa: a sua vida, você mesmo, sua mediocridade, sua superficialidade, sua brutalidade, sua violência, sua avidez, sua ambição, sua diária agonia e infinito sofrer; é isso que você tem de compreender, e ninguém, nem na terra, nem no céu, pode salvá-lo, senão você mesmo.

 

Se tem ideais, crenças ou princípios de qualquer espécie, você não pode de modo nenhum olhar para si diretamente.

 

 

 

 

 

Krishnamurti Para Principiantes

 

O pensamento correto e a ação correta em uma vida valem mais do que mil encarnações de vidas desperdiçadas.

 

Não pode haver autoridade legitimada na vida espiritual: nenhuma escritura, nenhum guru, nenhum árbitro de ascensão espiritual, nenhuma hierarquia. Cada ser humano deve encontrar a liberdade de uma maneira nova.

 

O que estamos de fato buscando não é claridade, não é a compreensão do estado real da mente, mas sim buscando caminhos e meios para fugir de nós mesmos.

 

As escrituras, o que tem sido dito pelos filósofos, pelas autoridades em religião com suas sanções e suas exigências para que vocês obedeçam, que vocês sigam – estas coisas perderam totalmente o significado pra qualquer homem que está atento, que está ciente dos problemas do mundo.

 

Temos que descartar não apenas a autoridade da liderança, mas também a autoridade do sacerdote, a autoridade do livro, a autoridade da religião.

 

Uma mente que tem medo, faça o que fizer, não terá amor algum; e sem amor vocês não podem construir um novo mundo.

 

A menos que haja uma revolução fundamental na totalidade da consciência – isso é, em todo o campo do pensamento – o homem não só irá se degenerar e, desse modo, perpetuar a violência, o sofrimento, mas também criar uma sociedade que se tornará cada vez mais mecânica, cada vez mais proporcionadora de prazer, e conseqüentemente levará uma vida extremamente superficial.

 

Qualquer conflito torna a mente insensível.

 

Todos nós queremos prazer. E sobre esse princípio agimos. Nossa moralidade, nossa relação social, nossa procura pelo que se denomina Deus e tudo o mais – tudo isso está baseado no prazer e na gratificação desse prazer. E o prazer é a continuação do desejo por meio do pensamento.

 

Se vocês não sabem como ver a verdade do movimento de cada dia, a verdade de toda atividade, de todo trabalho, de todo pensamento, nunca irão além disso, vocês nunca descobrirão o que está além das limitações da consciência.

 

Onde quer que tenha havido autoridade, especialmente autoridade interior, deve haver desordem.

 

Uma pessoa que esteja buscando experiência de qualquer tipo – especialmente a denominada religiosa, experiência espiritual – não somente deve questioná-la, duvidar dela, mas deve descartá-la totalmente.

 

Um homem que está perseguindo aquilo que não pode ser compreendido por uma mente que está condicionada gera desordem não somente no exterior, mas também interiormente.

 

A denominada autoridade espiritual é algo maligno, e essa é uma das principais causas da desordem porque é ela que tem dividido o mundo em várias formas de religiões, em várias formas de ideologias.

 

O pensamento é sempre velho, o pensamento nunca é novo. A menos que vocês descubram por si mesmos – não repetindo o que alguém diz, não importa quem seja - a menos que descubram por si próprios o princípio do pensamento, como uma semente origina uma folha verde, possivelmente vocês não poderão ir além das limitações do ontem.

 

A compreensão de si mesmo não depende do tempo; ela deve ser instantânea.

 

Nós devemos sobreviver no nível físico e morrer no nível psicológico. É somente onde existe morte, no nível psicológico, dos milhares de dias passados, que as células cerebrais se aquietam.

 

Nosso problema não é apenas social, econômico, e assim por diante, mas muito mais um problema religioso, um problema de crise de consciência.

 

Esse é o problema de vocês. Quando vocês vêem algo extraordinariamente belo, cheio de vida e beleza, vocês não devem permitir que o pensamento intervenha, porque no momento em que o pensamento o toca, sendo ele passado, o corromperá transformando-o em prazer e, por conseguinte, origina-se aí a necessidade de obter cada vez mais prazer; e, quando ele não é fornecido, existe o medo.

 

Para ver a realidade, deve-se ter uma mente clara, não corrompida, inocente, não confusa, não torturada, livre; só então se pode ver a realidade.

 

Vocês têm que ser uma luz para si mesmos.

 

Toda religião, embora todas professem amor, fraternidade e tudo o mais, está de fato separando o homem do homem.

 

No momento em que compreende a sociedade e rejeita toda a estrutura na qual está baseada – ambição, inveja, busca de sucesso, dogmas religiosos, crenças e superstições – você está fora dela, portanto pode pensar no problema inteiro de uma maneira nova e então, talvez, não existirá nenhum problema.

 

Se você escuta a verdade e não a vive, sua vida se torna uma confusão terrível, a triste desordem que é.

 

O que é importante é nos libertarmos das idéias, dos nacionalismos, de todas as crenças e dogmas religiosos de modo que possamos agir não de acordo com um padrão ou uma ideologia, mas sim de acordo com as necessidades.

 

Deve haver liberdade não somente de todas as nossas crenças e dogmas, mas liberdade de ambição pessoal e da atividade autocentrada. Com certeza, somente então pode existir um novo mundo.

 

Utilizamos a propriedade, o conhecimento, os deuses, as ilusões, os relacionamentos como meios para acobertar o nosso próprio vazio, a nossa própria solidão, e desse modo estas coisas se tornam muito importantes. As coisas que se tornaram nossas fugas tornaram-se extraordinariamente valiosas.

 

Inteligência é a compreensão do processo inteiro, do processo total da vida, não o conhecimento de um fragmento da vida.

 

Seguir um guru é destruir sua mente.

 

A maioria de nós não sabe “o que é”, pois estamos preocupados com “o que deveria ser”. Este “deveria ser” cria a dualidade. “O que é” nunca cria. “O que deveria ser” produz o conflito, a dualidade.

 

Escapar do sofrimento por meio de rituais, de divertimentos, de crenças ou de qualquer outra forma de distração é distanciar nosso pensamento cada vez mais da questão central, que é a de compreender a si mesmo.

 

O eremita, o monge, a chamada pessoa religiosa, cuja mente está ocupada com a virtude, com Deus, é essencialmente idêntica ao homem cuja mente está ocupada com os negócios, com mulheres, com a bebida, porque ambos estão ocupados.

 

O homem cuja mente está ocupada com Deus nunca achará Deus, porque Deus não é algo com que possamos nos ocupar; é o desconhecido, o imensurável.

 

Apenas a mente que está totalmente desocupada, completamente vazia – apenas essa mente é que pode receber algo novo, na qual não existe ocupação alguma. Mas essa coisa nova não pode vir à existência enquanto a mente estiver ocupada.

 

O homem que vive nunca pergunta “o que é viver?” e não possui uma teoria sobre o viver. Somente os semivivos é que falam sobre o propósito da vida.

 

É somente quando a mente deixa de pensar em termos de sua própria continuidade que o incognoscível se manifesta.

 

O seu Deus é uma projeção da mente de acordo com sua satisfação, apetite, alegria, prazer ou medo.

 

Sua oração a Deus é simplesmente uma negociação.

 

Quando a mente está presa, amarrada a uma crença, ela não pode estar aberta. Quando é deliberadamente aberta, obviamente qualquer resposta que recebe é uma projeção dela própria.

 

Ser devoto de uma imagem ou de uma idéia, ou de um Mestre, não é meditação. Obviamente, é um modo de fugir de si mesmo. É uma saída muito reconfortante, mas ainda é uma fuga.

 

A meditação não é um afastamento da vida. A meditação é um processo de compreensão de si mesmo.

 

O autoconhecimento é o começo da meditação.

 

O homem que deseja encontrar a realidade precisa abandonar completamente o seu condicionamento – seja cristão, hindu, budista ou de qualquer outro grupo.

 

Nenhum instrutor, evidentemente, pode ajudá-los a encontrar a verdade; deve-se encontrá-la dentro de si mesmo; deve-se ir através da dor, do sofrimento, da investigação; deve-se descobrir e compreender as coisas por si mesmo.

 

Enquanto estiver buscando a paz por meio de um sistema, um método ou uma técnica, eu terei paz, mas será uma paz de concordância, uma paz da morte.

 

Qualquer forma de repressão, qualquer forma de disciplina, supressão, resistência ou conformação a uma idéia de que deve por fim ao pensamento, é inútil.

 

O que importa é estar consciente de si mesmo e manter-se atento, sem armazenar, pois no momento em que vocês acumulam, a partir desse centro vocês julgam. O autoconhecimento não é um processo de acumulação; é um processo de descobrimento de momento a momento na vida de relação.

 

Se quero compreender alguma coisa, evidentemente não deve haver condenação, não deve haver comparação.

 

A verdade é uma coisa que se apresenta de instante a instante. Não é para ser cultivada ou para ser acumulada, armazenada e confinada na memória. Ela surge somente quando há um percebimento no qual não existe o experimentador.

 

O tesouro não está nos livros, não está no seu guru; ele está em você mesmo e a chave para ele é a compreensão de sua própria mente.

 

A mente deve estar livre do conhecimento, porque uma mente que está preenchida com o conhecimento não pode jamais descobrir “o que é”.

 

O problema é a coisa mais importante e não a solução. Se procuramos uma solução, a encontraremos; mas o problema persistirá porque a solução para ele é irrelevante.

 

Enquanto a ação for o produto do desejo, da memória, do medo, do prazer e da dor, inevitavelmente deverá gerar conflito, confusão e antagonismo.

 

A compreensão nunca pode resultar num hábito, rotina; ela exige constante atenção e vigilância.

 

A verdade não é uma coisa para ser alcançada; ou ela é vista ou não é vista; não pode ser percebida gradualmente.

 

É a verdade que liberta, não a vontade e o esforço.

 

As coisas do mundo são para serem repartidas e não para serem possuídas com exclusividade.

 

Condenamos os outros, e essa própria condenação é uma justificação de nós mesmos.

 

Não estamos conscientes de nosso condicionamento e, enquanto não o estivermos, só podemos produzir mais conflito e mais confusão.

 

Quando nós estamos conscientes de nossas fugas, só então podemos conhecer o nosso condicionamento.

 

Pensar a respeito do problema é fugir do problema; porque o pensar é o problema e o único problema.

 

Uma mente ocupada não é uma mente livre, e certamente só uma mente livre pode ter a percepção da criação atemporal.

 

Pode-se não querer recompensas terrenas, mas a ânsia de alcançar o céu ainda é a busca de um ganho.

 

Apenas uma mente desocupada é que pode prestar atenção.

 

O futuro é o que você é agora. Se não houver mudança – não adaptações superficiais, ajustes superficiais a qualquer padrão, político, religioso ou social, mas uma mudança que seja muito mais profunda, que demande sua atenção, seu cuidado, seu afeto -, se não houver uma mudança fundamental, então o futuro é o que estamos fazendo todos os dias de nossa vida no presente.

 

Onde o eu está, sob qualquer aparência, não há amor.

 

Deus é a ilusão a qual adoramos; e o incrédulo cria a ilusão de um outro Deus, o qual ele adora – o Estado ou alguma utopia ou algum livro que ele pensa conter toda a verdade.

 

As mentes de todas estas pessoas – monges, santos, reformadores – não diferem muito das mentes daqueles que apenas se interessam pelas coisas que proporcionam prazer.

 

Libertar-se do conhecimento é a verdadeira vida religiosa. Isso não significa apagar o conhecido, mas ingressar numa dimensão inteiramente diferente a partir da qual o conhecido é observado.

 

Você nunca poderá saber o que é o desconhecido porque no momento em que o reconhecer como desconhecido você está de volta ao conhecido.

 

Você só pode descobrir quando está negando constantemente.

 

Viver é mais importante do que qualquer idéia, ideal, objetivo ou princípio. É por não sabermos o que é viver que inventamos estes conceitos visionários, não realísticos que oferecem modos de fuga.

 

Negar qualquer coisa que o homem tenha inventado, negar todos os seus valores, ética e deuses é estar num estado mental em que não há dualidade, portanto nenhuma resistência ou conflito entre opostos.

 

Para o homem que tem negado todas as afirmações da sociedade, religião, cultura e moralidade, o homem que ainda está na prisão da conformidade social é um sofredor.

 

 

 

 

Comentários Sobre o Viver – Volume 1

 

A verdade é uma terra sem caminhos.

 

O desejo é sempre do futuro; o desejo de tornar-se algo é a inação no presente. O agora tem maior importância do que o amanhã. Todo o tempo é o agora, e entender o agora é estar livre do tempo. Tornar-se é a continuação do tempo, da dor. Tornar-se não contém ser. Ser é sempre no presente e ser é a forma mais elevada de transformação. Tornar-se é apenas continuidade modificada e só existe transformação radical no presente, em ser.

 

O indivíduo se identifica religiosa ou politicamente com esse ou aquele grupo por tradição ou habito, por impulso, preconceito, imitação ou preguiça. Essa identificação põe fim a todo o entendimento criativo e o indivíduo se torna simples ferramenta nas mãos do chefe do partido, do padre ou do líder preferido.

 

A identificação é uma experiência indireta e, portanto, totalmente falsa.

 

Não se pode ir muito longe quando se está ancorado.

 

Aquele que se identifica jamais pode conhecer a liberdade, na qual toda a verdade toma forma.

 

Quanto mais exteriorizados somos, mais sensações e distrações precisam existir, e isso dá origem a uma mente que nunca está silenciosa, que não é capaz de uma profunda busca e descoberta.

 

Simples abstinência, controle ou disciplina não levam à tranqüilidade, mas apenas entorpecem a mente, tornando-a insensível e limitada.

 

A especulação, como a curiosidade, é uma indicação de inquietação; e uma mente inquieta, por mais talentosa que seja, destrói o entendimento e a felicidade.

 

O pensamento, com seu conteúdo de emoções e sensações, não é amor. O pensamento, invariavelmente, nega o amor. O pensamento é baseado na memória, e o amor não é memória.

 

Preencher seu coração com as coisas da mente é não deixar espaço para o amor.

 

A humildade não é uma conquista, não é uma virtude a ser cultivada. Uma virtude cultivada deixa de ser virtude, pois então é meramente uma outra forma de conquista, uma marca a alcançar. Uma virtude cultivada não é uma abnegação do Eu, mas uma imposição negativa do Eu.

 

A verdade é o entendimento do que é a cada momento sem o fardo ou o resíduo do momento passado.

 

A humildade está no presente, não no futuro. Você não pode se tornar humilde. O próprio tornar-se é a continuação da auto-importância, que se esconde na prática de uma virtude.

 

Cuidado com o homem que lhe oferecer uma recompensa neste mundo ou no próximo.

 

Com tanta pobreza e degradação, é preciso ser muito insensível para ser rico.

 

Quanto mais o exterior exibe, maior é a pobreza interior.

 

A mente consumida no tornar-se algo nunca pode estar serena, pois a serenidade não é o resultado da prática nem do tempo. A serenidade é um estado de entendimento e o tornar-se nega esse entendimento. Tornar-se cria o sentido do tempo, que é realmente o adiamento do entendimento. O “eu serei” é uma ilusão nascida da auto-importância.

 

A mente é o produto do ambiente, recriando e sustentando a si mesma em sensações e identificações; e é por isso que a mente se aferra a códigos de conduta, padrões de pensamento etc. Visto que a mente é o resultado do passado, ela jamais consegue descobrir a verdade ou permitir que a verdade tome forma. Ao prender-se a organizações, ela descarta a busca pela verdade.

 

Os rituais são vãs repetições que oferecem uma fuga maravilhosa e respeitável do autoconhecimento. Sem autoconhecimento a ação tem muito pouca importância.

 

O desconhecido não pode ser apanhado na rede do conhecido.

 

O vício do saber é como qualquer outro vício; ele oferece uma fuga do medo do vazio, da solidão, da frustração, do medo de ser nada.

 

Ser generoso com a mão é uma coisa, mas ser generoso com o coração é outra. A generosidade da mãe é uma questão razoavelmente simples, dependendo do padrão cultural e assim por diante; mas a generosidade do coração é de importância muito mais profunda, exigindo percepção e entendimento prolongados.

 

Estar associado a qualquer pensamento organizado, a atividades políticas ou religiosas, oferece uma fuga respeitável da mediocridade e da labuta da vida diária.

 

A mente é a experiência, o conhecido, e não pode nunca encontrar-se no estado de experienciar; pois o que ela vivencia é a continuação da experiência. A mente só conhece continuidade, e ela não poderá jamais receber o novo enquanto sua continuidade existir.

 

A virtude é do coração, não da mente. Quando a mente cultiva a virtude, é um calculismo astucioso; é uma autodefesa, um hábil ajuste ao ambiente.

 

A verdade deve vir, você não pode ir até a verdade, e sua virtude cultivada não o levará até ela. O que você alcançar não será a verdade, mas seu próprio desejo projetado; e só na verdade existe felicidade.

 

A virtude do coração é entendimento.

 

A realidade não será alcançada pelo desapego; é inatingível por quaisquer métodos. Todos os meios e fins são uma forma de apego e eles devem cessar para que haja realidade.

 

O todo não pode ser entendido por meio da parte e é por isso que nunca entendemos. Nós nunca temos a visão do todo, nunca estamos atentos ao todo, pois estamos muito ocupados com a parte.

 

A mente deve voluntariamente perder todo o impulso acumulativo, o armazenamento de experiências como meio de ter mais experiências e realizações. É a ânsia autoprotetora de acumulação que origina a curva do tempo e impede a renovação criativa.

 

A mente se move do conhecido para o desconhecido, e ela não pode alcançar o desconhecido.

 

O pensamento só consegue negar ou afirmar, ele não pode descobrir ou pesquisar o novo.

 

O pensamento não pode penetrar no desconhecido e, assim, nunca pode descobrir ou experienciar a realidade.

 

A mente jamais pode experienciar o novo e, portanto, deve estar inteiramente silenciosa.

 

Ajustar-se às normas não necessariamente indica equilíbrio. As próprias normas podem ser o produto de uma cultura desequilibrada.

 

Pode Deus ser encontrado por meio da procura? Você pode procurar pelo incognoscível? Para encontrar, você deve conhecer o que está procurando. Se você procura para encontrar, o que você encontrar será uma projeção; será o que você deseja, e a criação do desejo não é a verdade.

 

Sem autoconhecimento, o deus que você busca é o deus da ilusão; e a ilusão, inevitavelmente, traz conflito e dor.

 

Rejeitar a feiúra e agarrar-se à beleza é ser insensível.

 

Conflitos e escolhas jamais podem ser um fator libertador. Se há escolha, existe atividade e não ação; pois a escolha está baseada na idéia. A mente pode entregar-se a atividades, mas ela não pode agir. A ação surge de uma fonte bastante diferente.

 

Qualquer sociedade que deliberadamente negligencie o homem estará condenada.

 

Quanto maior a exibição externa, maior a pobreza interna.

 

A luta e o esforço incessantes, as fugas e os medos ansiosos logo embotam a mente e o coração; e a mente astuta rapidamente encontra substitutos para a sensibilidade da vida. Divertimentos, família, política, crenças e deuses ocupam o lugar da clareza e do amor. A clareza é perdida pelo conhecimento e pela crença, e o amor pelas sensações.

 

A compreensão do que é não exige crenças, mas percepção direta, que é estar diretamente consciente, sem a interferência do desejo. É o desejo que provoca a confusão, e a crença é a extensão do desejo.

 

O outro nome da crença é a fé, e a fé é também o refúgio do desejo.

 

Todos os tipos de crença, religiosas ou políticas, impedem o entendimento do relacionamento, e não pode haver ação sem esse entendimento.

 

A mente só pode operar com suas próprias projeções, com as coisas que são dela mesma; mas ela não tem relação com as coisas que não de sua própria origem. O silêncio não é da mente e, portanto, a mente não pode cultivá-lo ou identificar-se com ele. O teor desse silêncio não pode ser avaliado por palavras.

 

É bom ser externamente simples, mas é muito mais importante ser simples e claro internamente.

 

A simplicidade não vem da mente. Uma simplicidade planejada é só um ajuste astuto, uma defesa contra a dor e o prazer; é a atividade autolimitante que cria várias formas de conflito e confusão. É o conflito que causa escuridão, dentro e fora.

 

O pensamento pode registrar, mas não pode experienciar a libertação do conflito, pois a simplicidade ou a clareza não são da mente.

 

Nossas mentes estão recheadas com tanto conhecimento que é quase impossível experienciar diretamente.

 

Somos o resultado dos pensamentos e influências de terceiros; somos condicionados pela propaganda tanto religiosa quanto política. O templo, a igreja e a mesquita exercem uma estranha e sombria influência em nossas vidas, e as ideologias políticas dão substância aparente a nossos pensamentos. Somos formados e destruídos pela propaganda.

 

Lemos sobre as experiências dos outros, assistimos aos outros jogarem, seguimos o exemplo dos outros, citamos os outros. Estamos vazios em nós mesmos e tentamos preencher esse vazio com palavras, sensações, esperanças e imaginação; mas o vazio continua.

 

A verdade não pode ser repetida, ela não pode ser propagada ou usada.

 

A experienciação só vem com a ausência do desejo por sensação; a nomeação, a designação, precisa cessar. Não existe um processo de pensamento sem a verbalização; e estar preso na verbalização é ser um prisioneiro das ilusões do desejo.

 

A dependência de traços e formas exteriores só indica o vazio de nosso ser, que enchemos com música, arte, silêncio deliberado.

 

Quanto mais temos consciência que estamos perdidos e confusos, mais ansiosos ficamos para sermos guiados e orientados; portanto, a autoridade é estabelecida em nome do Estado, em nome da religião, em nome de um mestre ou de um líder partidário.

 

Não existe intermediário entre e a realidade, e, se houver um, ele é um deturpador, um enredador, não importa quem ele seja, se o mais elevado salvador ou seu mais recente guru ou mestre.

 

A clareza não pode ser dada por outro. A confusão está em nós, nós a criamos e temos de removê-la.

 

Quanto há entendimento, há liberdade, que não pode ser comprada ou concedida por outra pessoa.

 

A disciplina é o aperfeiçoamento da resistência, e onde há resistência não há entendimento. Uma mente bem disciplinada não é uma mente livre, e é somente na liberdade que a descoberta pode ser feita.

 

Tudo que a mente possa pensar é seu. A mente não pode pensar sobre algo que não seja seu; ela não pode pensar sobre o desconhecido.

 

Só quando todas as várias camadas da consciência estão aquietadas, completamente silenciosas, é que existe o incomensurável, a felicidade que não pertence ao tempo, a renovação da criação.

 

Nós censuramos os outros e essa mesma censura é a justificação de nós mesmos.

 

O perdão é desnecessário quando não existe a acumulação da raiva. O perdão é essencial se existe ressentimento; mas, estar livre da adulação e do sentimento de mágoa, sem a dureza da indiferença, leva à misericórdia, à caridade.

 

Reprimir a raiva pela ação vigorosa da vontade é transferir a raiva para um nível diferente, dando a ela um outro nome; mas é ainda parte da violência. Para estar livre da violência, e não se trata do cultivo da não-violência, deve haver o entendimento do desejo.

 

Enquanto estivermos confusos, o que escolhermos também deverá ser confuso. Não podemos perceber claramente quando estamos meio cegos; o que vemos, então, é apenas parcial e, portanto, não é real.

 

O entendimento do que é não requer crença; pelo contrário, crenças, idéias, preconceitos são empecilhos definitivos ao entendimento.

 

Estar perdido com os muitos é uma forma de segurança psicológica; estar identificado com um grupo ou uma idéia, laica ou espiritual, é sentir-se seguro.

 

A crença molda a experiência.

 

O conhecimento ou a experiência precisam cessar para que a realidade seja. A experiência não pode encontrar a realidade. A experiência molda o conhecimento e o conhecimento distorce a experiência; ambos precisam cessar para a realidade existir.

 

Ter certeza do futuro é viver na ilusão.

 

O sacrifício do presente pelo futuro é a insanidade daqueles que são enlouquecidos pelo poder, e o poder é mau.

 

Você pode colocar cinzas na cabeça, vestir um simples pano ou perambular como um mendigo; mas isso não é simplicidade.

 

Buscar realização é um convite à frustração. Não existe realização do Eu, mas somente o fortalecimento do Eu por meio da posse daquilo pelo que ele anseia.

 

O entendimento vem não pelo exercício da vontade, mas somente quando a mente está completamente silenciosa.

 

Somente pela percepção passiva, porém alerta, existe a libertação do medo.

 

Tentamos preencher nosso vazio interior com palavras, com sons, com barulhos, com atividades; a música e o cântico são uma fuga feliz de nós mesmos, de nossa insignificância e de nosso tédio.

 

A mente que é silenciada por disciplina, por ritual, por repetição, jamais pode ser alerta, sensível e livre.

 

A percepção, desprovida de escolha, dos mecanismos da mente, que é a criadora da ilusão, é o início da meditação.

 

É essencial morrer para a experiência de ontem e para as sensações de hoje, do contrário haverá repetição; e a repetição de um ato, de um ritual, de uma palavra, é inútil. Na repetição não pode haver renovação. A morte da experiência é criação.

 

Para entendermos o que é, o padrão, ou a idéia, deve ser posto de lado.

 

As crenças condicionam a experiência, e a experiência, depois, reforça a crença. O que você acredita, você experiência. A mente dita e interpreta a experiência, convida-a ou rejeita-a. A própria mente é o resultado da experiência, e ela pode reconhecer ou experienciar apenas aquilo com que esteja familiarizada, que conheça, em qualquer nível que seja. A mente não pode experienciar o que não seja conhecido.

 

O conhecido está sempre tentado capturar o desconhecido; mas ele só pode captar aquilo que já é conhecido. O desconhecido jamais pode ser experienciado pelo conhecido; o conhecido, o experienciado, deve cessar para que o desconhecido seja.

 

Quanto mais somos interiormente torturados, maior o impulso de sermos exteriormente violentos. A agitação interior nos impele a buscar proteção externa; e quanto mais a pessoa se defende, maior o ataque sobre os outros.

 

O desafio deve ser enfrentado de modo novo, fresco, pois o desafio é sempre novo. Para enfrentar o desafio de forma adequada, a memória condicionada da experiência deve ser posta de lado, as reações de prazer e dor devem ser profundamente entendidas.

 

A experiência não é uma abordagem à verdade; não existe “sua experiência” ou “minha experiência”, mas apenas a compreensão inteligente do problema.

 

Pode haver divisões hierárquicas ou níveis de progresso espiritual na compreensão da verdade, na percepção de Deus?

 

O entendimento de si mesmo, por mais doloroso ou passageiramente prazeroso, é o início da sabedoria.

 

A experiência e o conhecimento são uma cadeia contínua de reações e, portanto, nunca podem compreender o novo, o fresco, o não-criado. A experiência e o conhecimento, sendo contínuos, formam um caminho para suas próprias projeções, e desse modo estão constantemente tolhendo.

 

A tolerância é da mente, não do coração.

 

Não existe comunhão onde há tolerância.

 

O autoconhecimento é o início da sabedoria em cujo silêncio e tranqüilidade existe o incomensurável.

 

Enquanto houver conflito ou oposição ao problema, não poderá haver entendimento dele; pois esse conflito é uma distração. Só existe entendimento quando há comunhão, e a comunhão é impossível enquanto existe resistência ou discórdia, medo ou aceitação.

 

No campo da mente, o amor não pode existir. A mente é a região do medo e do cálculo, ciúme e dominação, comparação e rejeição, e por isso o amor não existe.

 

O amor não é pessoal nem impessoal; o amor é um estado de existência no qual a sensação, assim como o pensamento, estão totalmente ausentes.

 

O amor não é uma abstração, mas sua realidade só poderá ser experienciada quando a idéia, a mente, não for mais o fator supremo.

 

Ser coerente é ser irrefletido. É mais fácil e seguro seguir um padrão de conduta sem desvio, ajustar-se a uma ideologia ou a uma tradição, do que se arriscar à dor de pensar. Para obedecer a uma autoridade, interna ou externa, não é necessário questionar; isso torna o pensamento desnecessário, com suas ansiedades e perturbações.

 

O entendimento traz a libertação do conflito; e com a libertação do conflito há a integração.

 

Nós somos as coisas que possuímos, nós somos aquilo a que estamos apegados.

 

Somente quando a pessoa está atenta ao processo total da obsessão ou de qualquer outro problema há a libertação do problema.

 

Nós escolhemos nossos líderes, políticos ou religiosos, segundo nossas própria confusão, e portanto eles também são confusos.

 

Se estiver em busca de gratificação, naturalmente encontrará o que deseja, mas não vamos chamar a isso verdade. A verdade toma forma quando a gratificação, o desejo por sensação, chega ao fim.

 

A verdade não é uma questão de argumentação e convicção; não é o resultado de opiniões.

 

Você consegue entender qualquer coisa por meio do conflito? Conquistar não é entender. O que você conquista tem de ser conquistado repetidamente, mas existe libertação naquilo que é totalmente entendido. Para entender é preciso existir a percepção do processo de resistência.

 

Somente no entendimento do que é existe libertação do que é.

 

É por querer maiores sensações que você segue e então cria um líder, um guru; e por essa nova gratificação você se sacrificará, agüentará desconfortos, insultos e desencorajamentos. Tudo isso é parte da exploração mútua, não tem absolutamente nada a ver com a realidade e jamais levará à felicidade.

 

Toda a fuga, seja na forma de um ideal, do cinema ou da igreja, é prejudicial, levando a ilusões e confusões.

 

Sendo o presente monótono, insípido, voltamo-nos para o passado ou olhamos para um futuro projetado. Essa fuga do presente, inevitavelmente, leva à ilusão. Ver o presente como ele realmente é, sem críticas ou justificativas, é entender o que é, e então existe a ação que produz uma transformação no que é.

 

O problema é a coisa importante, não a resposta. Se procurarmos uma resposta, vamos encontrá-la; mas o problema persistirá, pois a resposta é irrelevante para o problema. Nossa busca é por uma fuga do problema e a solução é um remédio superficial; portanto, não há entendimento do problema.

 

A mente não pode ser forçada a parar; se o for, estará morta, será uma lagoa estagnada.

 

A mente estaria perdida sem a preocupação dos problemas; ela se alimenta de problemas, quer sejam problemas mundiais ou locais, políticos ou pessoais, religiosos ou ideológicos; assim é que nossos problemas nos tornam banais e limitados.

 

Interna ou externamente, é mais fácil reprimir do que entender.

 

O entendimento jamais pode ser transformado em hábito, uma questão de rotina; ele exige atenção e vigilância constantes. Para entender deve haver flexibilidade, sensibilidade, um entusiasmo que não tem nada a ver com sentimentalismo.

 

A verdade não é uma coisa a ser atingida; ela é vista ou não é vista, ela não pode ser percebida gradualmente.

 

É a verdade que liberta, não a vontade ou o esforço.

 

O homem que é totalmente identificado com seu ideal é obviamente desequilibrado.

 

Somente uma coisa morta pode ser forçada a se conformar a um padrão; e, como a vida está em constante movimento, surge uma contradição no momento em que tentamos ajustar a vida a um padrão ou conclusão fixos.

 

Para estar livre da dor e do sofrimento é necessária uma inteligência suprema.

 

A memória é um auxílio ao entendimento? A memória compara, modifica, censura, justifica ou identifica; mas ela não pode produzir entendimento.

 

Onde há luz, não existe escuridão. A escuridão não pode ocultar a luz; se o fizer, não há luz. Onde o ciúme está, o amor não está. A idéia não pode ocultar o amor.

 

O deus de uma mente pequena é um deus pequeno.

 

Somente na espontaneidade, na liberdade, pode haver descoberta. Uma mente disciplinada não pode descobrir; ela pode funcionar eficientemente e, portanto, impiedosamente, mas não pode revelar o insondável.

 

A busca por uma resposta é uma evasão do problema.

 

Só existe libertação do problema quando toda a mente está absolutamente silenciosa, atenta ao problema, sem necessidade de escolha; pois só então o criador do problema não está presente.

 

A ação em direção a uma meta predeterminada não é de modo algum ação, mas conformidade a uma crença, a uma idéia.

 

A propriedade gera ódio. Na verdade odiamos o que possuímos, o que é evidenciado pelo ciúme. Onde houver posse nunca poderá haver amor; possuir é destruir o amor.

 

Estar em comunhão é amar. Sem amor, você não pode apagar o passado; com amor, não há passado. Ame, e o tempo não existirá.

 

Apenas quando há comunhão entre duas pessoas é que elas se entendem mutuamente; se resistirem uma à outra, não há entendimento. A comunhão ou o relacionamento só podem existir quando não há medo.

 

Para acumular riqueza a pessoa precisa ferir, ser cruel e não generosa; precisa haver crueldade, cálculo astuto, desonestidade; precisa haver a busca do poder, aquela ação egocêntrica meramente encoberta pelas palavras de sonoridade agradável como responsabilidade, dever, eficiência, direitos.

 

A demonstração de simpatia pode fazer brilhar, mas não é a chama; a atividade chamada serviço, embora benéfica e necessária, não é amor; a muita praticada e disciplinada tolerância, a compaixão cultivada na igreja e no templo, a fala suave, os modos meigos, o culto ao salvador, à imagem, ao ideal – nada disso é amor.

 

Permita que seu coração fique vazio. Não o encha com palavras, com ações da mente. Deixe seu coração ficar totalmente vazio; somente aí ele será preenchido.

 

As explicações, a revelação de causas, as dissecações do problema não o resolvem de modo algum; pois ele não pode ser resolvido com os meios da mente. A mente só pode criar mais problemas. Ela pode fugir do problema por meio de explicações, ideais, intenções; mas, faça o que fizer, a mente não pode se libertar do problema. A própria mente é o campo no qual problemas e conflitos crescem e se multiplicam.

 

Quando o inesgotável é impedido pela memória, aí a busca por resultados começa. A mente, o resultado, está sempre buscando um fim, um propósito, e isso é a morte. A morte não existe quando o experienciador não está presente. Só então existe o inexaurível.

 

A finalidade da meditação é a própria meditação. A busca de algo pela meditação ou além dela é uma conquista de resultados; e aquilo que é conquistado é novamente perdido. Buscar um resultado é a continuação da projeção; o resultado, embora elevado, é a projeção do desejo.

 

A mente nunca está em repouso, está sempre se esforçando, sempre realizando, sempre ganhando – é claro, sempre com medo de perder.

 

Através do esforço e da luta, por meio de resistência e renúncias, a mente se torna insensível; e pode essa mente estar aberta e vulnerável?

 

A mente jamais pode criar o novo; a própria mente é um resultado, e todos os resultados são criação do velho. Os resultados jamais podem ser novos; a busca de um resultado jamais pode ser espontânea; aquilo que é livre não pode buscar um fim. A meta, o ideal, é sempre uma projeção da mente; e, certamente, isso não é meditação. A meditação é a libertação do meditador; só na liberdade há descoberta, sensibilidade para receber.

 

O pensamento, sendo um resultado, opõe-se ou concorda, compara ou se ajusta, censura ou justifica, e portanto ele nunca pode ser livre.

 

O pensamento está ancorado na memória e jamais pode ser livre para descobrir a verdade de qualquer problema.

 

O pensamento, o resultado, jamais pode criar o novo; o novo é de momento a momento, e o pensamento é sempre o antigo, o passado, o condicionado.

 

O pensamento é sempre uma conclusão; pensar é concluir, e, portanto, nunca pode ser livre.

 

Renunciar a algo para obter um resultado é permuta; nisso não existe desistência, mas somente troca.

 

Estar aberto e vulnerável é ser sensível; onde houver uma reserva haverá insensibilidade.

 

Quando o coração está vazio das coisas da mente e a mente está vazia de pensamento, então há amor. Aquilo que está vazio é inexaurível.

 

Estar ocupado com algo, quer seja a mobília ou Deus, é um estado de pequenez, de superficialidade.

 

Estar ocupado com Deus, com o Estado, com o conhecimento, é a atividade de uma mente mesquinha. Ocupação com alguma coisa sugere limitação, e o Deus da mente é um deus mesquinho, pois mais alto que ela possa colocá-lo.

 

Somente para aquilo que tem fim pode haver o novo, somente para aquilo que morre pode haver vida.

 

O conhecimento é um vício, como a bebida alcoólica; ele não traz entendimento. O conhecimento pode ser ensinado, mas não é sabedoria; deve haver libertação do conhecimento para a chegada da sabedoria.

 

O conhecimento, a idéia e a crença atrapalham a sabedoria.

 

Se pensamos sobre Deus ou sobre a bebida, não importa; cada um terá seu efeito particular, mas em ambos os casos o pensamento está ocupado com sua própria projeção. Idéias, ideais, metas e assim por diante são, todas, projeções ou extensões do pensamento. Estar ocupado com as próprias projeções, em qualquer nível, é cultuar o Eu.

 

É a verdade que liberta, não o esforço para ser livre.

 

O conflito deve ser entendido, não enobrecido ou reprimido.

 

O conflito é a focalização do Eu, e quando o conflito cessa há o fim de todo o pensamento e o início do inexaurível.

 

Uma das desgraças das ideologias e crenças organizadas é o conforto, a gratificação mortal que elas oferecem. Elas nos põem para dormir e então sonhamos, e o sonho se torna ação.

 

O pensamento projeta o ideal; o ideal é parte do pensamento. O ideal não é algo além do pensamento; é o próprio pensamento.

 

Nós nos anestesiamos através de vários meios: Deus, rituais, ideais, bebidas alcoólicas e assim por diante. Queremos fugir da perturbação, e uma das fugas é a busca pela causa.

 

O estudo das explicações não é o estudo da sabedoria; a sabedoria só é possível quando as explicações cessam.

 

O entendimento vem com uma elevada sensibilidade, mas a sensibilidade não é uma coisa a ser cultivada.

 

A maioria de nós quer ser tornada estúpida; e o hábito é muito eficaz para anestesiar a mente. O hábito da disciplina, da prática, do esforço sustentado para se tornar algo – são modos respeitáveis de se tornar insensível.

 

O homem que possui, seja propriedade ou conhecimento, nunca pode ser sensível, ele nunca pode ser vulnerável ou aberto.

 

A respeitabilidade é um disfarce para o hipócrita; cometemos todos os crimes possíveis em pensamento, mas externamente somos irrepreensíveis.

 

O pensamento não pode pensar sobre o amor, pois o amor está fora do alcance da mente. O pensamento é contínuo e o amor é inexaurível. Aquilo que é inexaurível é sempre novo e aquilo que tem continuação está sempre com medo de acabar.

 

Para um idealista, o passado ou o futuro é um estado fixo, pois ele mesmo é do passado ou do futuro. Um idealista nunca está no presente; para ele, a vida é sempre no passado ou no futuro, mas nunca no agora.

 

Para um idealista, o presente é uma passagem para o futuro e assim não é importante; os meios não importam absolutamente, mas somente o fim. Usa qualquer meio para chegar ao fim.

 

Somente por meio do autoconhecimento existe libertação do cativeiro, e essa liberdade é desprovida de toda e qualquer crença, de toda e qualquer ideologia.

 

Estar certo é estar fechado em si mesmo e invulnerável.

 

A própria palavra “saber” não indica um estado no qual a investigação cessou?

 

Sem o entendimento de si mesmo, todas as atividades levam à confusão e dor.

 

Uma declaração categórica interrompe toda a investigação.

 

Somente quando somos perturbados, despertados, é que começamos a observar e descobrir.

 

A maioria quer estar morta, estar insensível, pois viver é doloroso; e contra essa dor construímos muros de resistência, os muros do condicionamento. Esses muros, aparentemente protetores, só geram mais conflito e infelicidade.

 

Conhecimento é condicionamento. O conhecimento não proporciona liberdade.

 

A experiência, de acordo com a crença, ou a ideologia, é simplesmente a continuação daquela crença, a perpetuação de uma idéia. Essa experiência somente reforça a crença.

 

O conhecimento como experiência no nível psicológico é um obstáculo ao entendimento.

 

O conhecimento, o passado, pode projetar somente aquilo que é conhecido.

 

O conhecimento é um empecilho ao conhecimento.

 

Saber é ser ignorante; não saber é o início da sabedoria.

 

A complexidade deve ser abordada de forma simples, do contrário jamais a compreenderemos.

 

Os que sabem que não sabem são os simples; eles vão longe, pois não possuem o fardo do conhecimento.

 

A simplicidade está no entendimento do que é, não em tentar converter o que é em simplicidade.

 

Nunca estamos em um relacionamento direto com nossos problemas, mas sempre através de alguma crença ou formulação. Nós só podemos resolver nossos problemas quando estamos em um relacionamento direto com eles. Não são nossos problemas que colocam o homem contra o homem, mas nossas idéias sobre eles. Os problemas nos unem, mas as idéias nos separam.

 

O nacionalismo, como a veneração a Deus, é somente a glorificação de si mesmo. É o próprio Eu que é importante, de fato ou ideologicamente, e não a desgraça e o sofrimento.

 

Qualquer atividade que nos afaste do que é está destinada a trazer dor e antagonismo. O conflito é a negação do que é ou a fuga do que é; não há outro conflito além desse. Nosso conflito se torna cada vez mais complexo e insolúvel porque não enfrentamos o que é. Não existe complexidade no que é, mas somente nas muitas fugas que buscamos.

 

Buscar subentende o conhecido.

 

A insatisfação que busca ser satisfeita logo encontra o que deseja em um tipo qualquer de relacionamento, com posses, com uma pessoa ou com algum “ismo”.

 

O homem que acumula, seja dinheiro ou conhecimento, jamais pode ser livre.

 

O pensador é o pensamento e ele não pode operar sobre si mesmo.

 

Eu sou insignificante; mas, se me identifico com o país, com a família ou com alguma crença, sinto-me realizado, completo. Essa busca por plenitude é evitar o que é.

 

Toda especulação é ignorância.

 

O pensamento não pode resolver qualquer problema humano, pois o próprio pensamento é o problema.

 

Fugas de qualquer tipo, quer seja Deus ou o álcool, somente impedem o entendimento da dor.

 

A liberdade não pode ser conseguida no final, ela deve existir no próprio início.

 

O desejo por repetição surge apenas quando não há alegria hoje; quando o hoje está vazio, olhamos para o passado ou para o futuro. O desejo por repetição é o desejo por continuidade e jamais existe o novo na continuidade. Existe felicidade, não no passado ou no futuro, mas somente no movimento do presente.

 

O pensamento, em todos os níveis, é a reação da memória, e assim o pensamento, invariavelmente, produz conflito. Pensamento é sensação e sensação não é felicidade.

 

O pensamento jamais pode trazer felicidade; ele pode somente lembrar sensações, pois o pensamento é sensação. Ele não pode cultivar, produzir ou avançar em direção à felicidade. O pensamento só pode ir em direção àquilo que conhece, mas o conhecido não é felicidade; o conhecido é sensação.

 

Todas as atividades da mente são meras sensações, reações a estímulos, a influências, e portanto não são absolutamente ações. Quando a mente está sem atividade, há ação; essa ação é sem causa, e somente aí existe a felicidade perfeita.

 

Jamais podemos conhecer uns aos outros, somente estar em comunhão uns com os outros. Podemos conhecer os mortos, mas nunca os vivos; o que conhecemos é o passado morto, não o vivo. Para percebermos os vivos, devemos enterrar os mortos em nós mesmos.

 

Conhecimento não é sabedoria, e sem ela não há paz, não há felicidade.

 

Censurar é negligenciar, não dar atenção; e não pode haver entendimento por meio da censura.

 

Achamos que podemos nos livrar de um problema ao conhecer sua causa; mas o conhecimento é meramente informação, uma conclusão verbal. Esse conhecimento, obviamente, impede o entendimento do problema. Saber a causa de um problema e entender o problema são duas coisas inteiramente diferentes.

 

O entendimento do falso é a descoberta do verdadeiro.

 

O pensamento jamais pode ser livre, e é preciso haver liberdade para descobrir, liberdade do pensamento.

 

Carregamos conosco todos os nossos esforços, conclusões e intenções passados; não conseguimos olhar o problema a não ser por essas cortinas.

 

Seja o que você é.

 

Quando usamos trabalho ou pessoas como um meio para um fim, então, obviamente, não temos um relacionamento, comunhão alguma, nem com o trabalho, nem com as pessoas; e então somos incapazes de amar.

 

 

 

 

Comentários Sobre o Viver – Volume 2

 

A mente deseja ficar presa e garantida em algum tipo de atividade, negligenciando assuntos mais profundos e amplos, pois, desse modo, estará em terreno mais seguro.

 

O autoconhecimento é o início da sabedoria; sem autoconhecimento o aprendizado conduz à ignorância, discórdia e tristeza.

 

Condicionamento é apego: apego ao trabalho, à tradição, à propriedade, às pessoas, às idéias e assim por diante.

 

Apego é fuga, e é a fuga que reforça o condicionamento.

 

Nosso apego a uma pessoa, a um trabalho, a uma ideologia, é o fator condicionante.

 

Pensar no problema é fugir dele, pois pensar é o problema, o único problema.

 

A libertação do condicionamento vem com a libertação do pensamento. Só quando a mente estiver completamente quieta é que haverá liberdade para o real existir.

 

O conhecido só pode vivenciar aquilo que é dele mesmo; ele jamais pode experimentar o novo, o desconhecido.

 

O desconhecido não pode ser experienciado. Você pode pensar ou especular sobre o desconhecido, ou ter medo dele; mas o pensamento não pode compreendê-lo, pois é o resultado do conhecido, da experiência.

 

Enquanto o coração estiver sobrecarregado com as coisas da mente, existirá ódio; pois a mente é o local do ódio, do antagonismo, da oposição, do conflito.

 

Veja o falso como falso, e então a verdade aparecerá.

 

Nós representamos o passado de acordo com nossos condicionamentos particulares e o interpretamos para que se ajuste a nossos preconceitos.

 

A crença organizada, que é chamada de religião, é, como qualquer outra ideologia, algo da mente e, portanto, separadora.

 

Somente quando a bandeira, a crença, o líder e a idéia como ações planejadas caírem poderá haver amor; e o amor é a única revolução criativa e constante.

 

Só quando a mente se expurga de todo pensamento existe o silêncio da criação. A mente não estará tranqüila enquanto estiver viajando a fim de chegar.

 

As posses tornam a mente enfadada. A aquisição, quer de conhecimento, de propriedade, de virtude, cria insensibilidade.

 

Ver a verdade no falso é o início da sabedoria.

 

Viver é um fim a cada dia; é morrer para todas as aquisições, lembranças, experiências, para o passado.

 

A expurgação da mente é a tranqüilidade do coração.

 

Disciplina subendente conformidade a um padrão.

 

Não deveríamos investigar, em vez de afirmar ou negar? Não deveríamos tentar encontrar a verdade da questão, em vez de nos agarrarmos a nossas conclusões e opiniões?

 

Toda resposta do pensamento é condicionada, e realizar uma revolução baseada em pensamento ou idéia é perpetuar uma forma modificada do que era.

 

Reforma e revolução baseadas em idéias são fatores retrocedentes na sociedade.

 

Enquanto o homem for usado psicológica ou fisicamente, quer em nome de Deus ou do Estado, haverá uma sociedade baseada na violência.

 

Só há entendimento quando a mente está silenciosa; e a mente não está silenciosa quando está presa a uma ideologia, dogma ou crença, ou quando está associada ao padrão da própria experiência, de suas lembranças.

 

O conhecimento, a carga do passado, é corrupção. O poder de acumular, o esforço do vir a ser, destrói a inocência; e sem inocência como pode haver sabedoria?

 

Nossas aquisições são um meio de encobrir nosso próprio vazio.

 

O adorador é o adorado. Adorar o outro é adorar a si mesmo; a imagem e o símbolo são uma projeção de si mesmo.

 

Você escolhe de acordo com sua gratificação; sua escolha é seu preconceito. Sua imagem é seu estimulante e está esculpido na sua própria memória; você está adorando a si mesmo por meio da imagem criada por seu próprio pensamento. Sua devoção é o amor por si mesmo encoberto pelo cântico de sua mente.

 

A identificação com o grande ainda é uma projeção do pequeno. O mais é uma extensão do menos. O pequeno em busca do grande encontrará apenas o que ele for capaz de encontrar.

 

Se a sociedade existe para o indivíduo, então ela precisa ajudar a libertá-lo de sua própria influência condicionadora. Ela deve educá-lo para se formar como um ser humano integrado.

 

Entender o falso como o falso, ver a verdade no falso e ver a verdade como a verdade é o princípio da inteligência.

 

O que é jamais pode ser entendido pelo filtro da idéia; deve ser abordado como uma coisa nova. Como o que é nunca está estático, a mente precisa não estar ligada ao conhecimento, a uma ideologia, a uma crença, a uma conclusão.

 

Todas as idéias, crenças, sistemas de pensamento, são separadores, excludentes.

 

A verdade não é para ser conquistada; você não pode tomá-la de assalto; ela escorregará por suas mãos se tentar agarrá-la. A verdade chega silenciosamente, sem você saber. O que você sabe não é a verdade; é apenas uma idéia, um símbolo. A sombra não é o real.

 

Se algo lhe é desconhecido, como você pode ter medo disso? Você está realmente com medo não do desconhecido, da morte, mas da perda do conhecido, porque isso pode causar dor ou levar embora seu prazer, sua satisfação. É o conhecido que causa medo, não o desconhecido.

 

Especulação e imaginação são um estorvo para a verdade. A mente que especula jamais pode conhecer a beleza do que é; ela fica presa na rede das próprias imagens e palavras.

 

Se os meios foram a imitação, o fim deverá ser uma cópia. Os meios criam o fim. Se a mente for moldada no início, ela também deverá estar condicionada no fim.

 

O próprio anseio de entender é o início da liberdade.

 

Para buscar a verdade você precisa saber o que ela é. A busca implica um conhecimento antecipado, algo já sentido ou conhecido.

 

Cada problema só é resolvido quando a idéia, a conclusão, não existe; conclusões, idéias, pensamentos são a agitação da mente.

 

Nosso relacionamento atual se baseia em necessidade e uso. Esse relacionamento é inerentemente violento, e, por isso, a própria base de nossa sociedade é a violência. Enquanto a estrutura social for se basear em uso e necessidade mútuos, estará destinada a ser violenta e destrutiva; enquanto eu usar o outro para minha gratificação pessoal ou para satisfação de uma ideologia com a qual eu esteja identificado, só poderá haver medo, desconfiança e oposição.

 

O homem que é ambicioso para si mesmo ou para seu partido, ou que deseja realizar um ideal, é obviamente um fator desintegrador na sociedade.

 

Falar de paz é totalmente absurdo enquanto nosso relacionamento com o um e com os muitos se baseia em necessidade e uso. A necessidade e o uso do outro devem, inevitavelmente, levar ao poder e à dominação.

 

Idéias e crenças são a própria antítese do amor.

 

O pensamento de negação é a forma mais elevada de inteligência.

 

O mundo é você; você é o problema; o problema não está separado de você; o mundo é a projeção de você mesmo. Ele não pode ser transformado até que você seja.

 

Renunciar para encontrar não é renúncia em absoluto; é apenas uma negociação astuta, uma troca, uma jogada calculada para ganhar algo. Você desiste disso para obter aquilo. A renúncia com um fim em vista é somente uma rendição para ganhos adicionais.

 

Para entender, as opiniões e as conclusões precisam cessar.

 

Para viajar para longe, a mente precisa estar livre. A liberdade não é algo a ser obtido no final de um longo esforço; ela deve estar logo no início da viagem.

 

Só quando a palavra, o nome, a associação e a experiência não existem é que a mente está quieta, não só nas camadas superficiais, mas completa e integralmente.

 

O ideal é uma fuga maravilhosa e respeitável do real.

 

O problema é a própria mente, não os problemas que ela gera; a solução dos problemas gerados pela mente é apenas a reconciliação de efeitos, e isso só leva a mais confusão e ilusão.

 

A mente só é entendida no espelho do relacionamento, e você tem de começar a ver a si mesmo naquele espelho.

 

Sem entender a si mesmo, o que quer que faça produzirá, inevitavelmente, confusão e sofrimento.

 

Ver a verdade no falso é o início da sabedoria; ver o falso como o falso é a compreensão mais elevada.

 

Ser vulnerável é viver, e isolar-se é morrer.

 

A entidade integrada não é tornada inteira pelo outro; como ela é completa, há completude em todos os seus relacionamentos. O que está incompleto não pode ser completado no relacionamento. É ilusão pensar que somos completados pelo outro.

 

Quando a pessoa está feliz, o tempo não existe, ontem e amanhã estão inteiramente ausentes; a pessoa não pensa no passado ou no futuro. Mas a infelicidade gera esperança e desespero.

 

A mente, com seu tecer incessante de padrões, é a criadora do tempo; e com o tempo há medo, esperança e morte. A esperança leva à morte.

 

Uma revolução baseada em idéias, deduções e conclusões é apenas uma continuação modificada do velho padrão. Para uma revolução fundamental e duradoura, precisamos entender a mente e a idéia.

 

A mente é experiência, memória, idéia, é o processo total da resposta. Até que entendamos o funcionamento da mente, da consciência, não poderá haver uma transformação fundamental do homem e de seus relacionamentos, que compõem a sociedade.

 

A menos que o velho padrão seja quebrado totalmente, não poderá haver uma transformação radical.

 

O isolamento é a morte, e a sabedoria não é encontrada no recolhimento.

 

Retirar-se, isolar-se para encontrar é dar um fim ao descobrimento.

 

A conformidade anestesia a mente para o conflito. Queremos que nos deixem entorpecidos, insensíveis; tentamos barrar o feito e, desse modo, também nos tornamos entorpecidos ao bonito.

 

A liberdade não pode ser encontrada em qualquer retiro, em qualquer sistema ou crença, nem pela conformidade nem pelo medo denominados disciplina.

 

Só a verdade liberta, e não seu desejo de ser livre. O próprio desejo e esforço de ser livre é um estorvo para a libertação.

 

O acúmulo em qualquer forma, como conhecimento, experiência ou crença, impede a liberdade; e é somente quando há liberdade que a verdade pode existir.

 

A mente que é silenciada não é uma mente tranqüila; ela é uma mente morta, insensível. Quando o desejo existe, a beleza do silêncio não existe.

 

Só existe o inefável quando a experiência, o conhecimento, cessou totalmente. Só a verdade liberta a mente do próprio cativeiro.

 

A satisfação torna a mente entorpecida e o coração enfastiado; ela leva à superstição e à indolência, e a margem da sensibilidade é perdida.

 

Pensar em termos de fórmulas e sistemas só produz oposição e discórdia.

 

O experienciador está sempre condicionado por sua experiência.

 

Não há liberdade para o experienciador, ele está sempre preso nas próprias experiências; ele é o criador do tempo e nunca poderá experienciar o eterno.

 

A humildade deve estar no início de todas as buscas.

 

Buscar a autoridade e defini-la como um guia é destruir a percepção, o entendimento.

 

Para perceber com clareza é preciso haver libertação do desejo, que confunde e condiciona a mente.

 

Sua mente precisa ser capaz da percepção direta; se ela não o for, ficará perdida na floresta de idéias, opiniões e crenças.

 

O entendimento não é um dom reservado a poucos, mas ele vem para os que são sinceros em seu autoconhecimento.

 

Quando a mente está comparando, avaliando, ela não está silenciosa; ela está ocupada. Uma mente ocupada é incapaz de uma percepção clara e simples.

 

A sabedoria e a verdade vêm para o homem que verdadeiramente diz “eu sou ignorante, eu não sei”. Os simples, os inocentes, não aqueles que estão carregados de conhecimento, verão a luz, pois eles são humildes.

 

Toda experiência tem significado quando com ela vem autoconhecimento, que é o único fator libertador ou integrador; mas sem autoconhecimento a experiência é um fardo, levando a todo tipo de ilusão.

 

A aceitação também é uma forma de morte.

 

Qualquer ação da mente é pequena, limitada. A mente tem de parar de atuar e apenas assim pode haver o fim da mediocridade.

 

Você não estará consciente da verdade nem verá o falso como o falso enquanto sua mente estiver ocupada, de algum modo, com o esforço, com a comparação, com a justificação ou a reprovação.

 

Seja simples, e não tente tornar-se algo ou captar alguma experiência.

 

Enquanto estamos tentando chegar a algum lugar ou ser alguma coisa, precisa haver a dor do conflito, e tendo causado a dor, queremos então fugir dela; e realmente fugimos para todo tipo de atividade.

 

Embora doloroso, é maravilhoso estar descontente sem sufocar essa chama com conhecimento, tradição, esperança ou sucesso.

 

A mente especuladora, com seus pensamentos complicados, não é capaz de uma transformação fundamental; ela não é uma mente revolucionária. Ela se vestiu com o que deveria ser e segue o padrão das próprias projeções limitadas e fechadas em si mesmas.

 

Trazer para o presente o que é passado, agradável ou doloroso, é impedir o real. A realidade não tem continuidade. Ela existe de momento para momento, atemporal e sem medida.

 

A pessoa precisa morrer a cada dia para todas as suas lembranças, experiências, conhecimento e esperanças; a acumulação de prazeres e arrependimentos, a coleta de virtudes, deve cessar a cada momento.

 

Não poderá haver paz, nem felicidade duradoura para a humanidade enquanto nós – o indivíduo, o grupo e a nação – aceitarmos essa existência competitiva como inevitável.

 

O político nunca pode trazer paz ao mundo, nem podem aqueles que pertencem a uma crença organizada, pois todos foram condicionados para um mundo de líderes, salvadores, guias e exemplos; e quando você segue outro, está buscando a realização da própria ambição, quer neste mundo ou no da ideação, o chamado mundo espiritual.

 

A realidade não pode ser buscada; ela existe quando o buscador não existe. A mente é tempo, e o pensamento não pode descobrir o que não tem medida.

 

Quando se está confuso, busca-se orientação, mas aquilo que se encontrar será sempre o resultado da própria confusão de alguém. O líder é tão confuso quanto o seguidor que, a partir de seu conflito e infelicidade, escolheu o líder. Seguir um outro, quer seja um líder, um salvador ou um mestre, não produz clareza e felicidade. Somente com o entendimento da confusão e do criador dela há libertação do conflito e da infelicidade.

 

Não existe uma forma iluminada de seguir; todo o comportamento de seguir é ruim. A autoridade corrompe, quer em posições elevadas ou entre os insensatos. Os insensatos não são transformados em sensatos por seguir outro, por mais que este possa ser grande e nobre.

 

A cooperação só é possível quando há libertação da inveja, da aquisitividade e do anseio por dominação ou por poder pessoal ou coletivo.

 

Qualquer esforço da parte da mente para mudar o que ela é apenas leva à continuação dela mesma sob outra forma e, assim, não há mudança alguma.

 

Esse desejo de estar seguro, de alcançar um fim cobiçado, gera a aceitação da orientação de um guia, o seguimento do exemplo, a veneração do sucesso, a autoridade de líderes, salvadores, mestres e gurus, e tudo isso é chamado de ensinamento positivo; mas é, na verdade, insensatez e imitação.

 

Não há uma perspectiva pessoal para a verdade, como não existe para o descobrimento de fatos científicos. A idéia de que existem caminhos separados para a verdade, de que a verdade tem aspectos diferentes, é irreal; é o pensamento especulativo do intolerante tentando ser tolerante.

 

O pensamento não pode descobrir aquilo que não é produto do pensamento. O pensamento resulta do conhecido, portanto ele não pode sondar o desconhecido, o incognoscível.

 

Por ser o produto do conhecido, o pensamento jamais pode experienciar o desconhecido; por ser o resultado do tempo, ele nunca pode entender o atemporal, o eterno. O pensamento precisa cessar para o real ser.

 

Deus é para ser encontrado em igrejas ou em nossos corações? O anseio de ser confortado gera ilusão; é esse anseio que cria igrejas, templos e mesquitas. Nós nos perdemos neles, ou na ilusão de um Estado onipotente, e as coisas reais passam despercebidas. O desimportante torna-se totalmente absorvente. A verdade ou o que queira, não pode ser encontrada pela mente; o pensamento não pode ir atrás dela; não há caminho para ela; ela não pode ser comprada por veneração, orações ou sacrifícios. Se quisermos conforto, consolo, conseguiremos isso de um modo ou outro, mas com isso virá mais dor e infelicidade. O desejo por conforto, por segurança, tem o poder de criar todo tipo de ilusão. Apenas quando a mente está quieta é que existe a possibilidade de o real tomar forma.

 

O veneno e a corrupção começam quando você olha para uma pessoa como sua autoridade, seu guia, seu salvador.

 

Uma mente preocupada nunca é uma mente livre, quer ela esteja preocupada com o sublime ou com o trivial.

 

Quanto mais lutamos contra um hábito, por mais profundas que sejam suas raízes, mais força damos a esse hábito. Estar consciente de seu hábito sem escolher nem cultivar outro é o fim do hábito.

 

A mente é insignificante quando está preocupada com Deus, com o Estado, com a virtude ou com o próprio corpo.

 

Há uma enorme diferença entre uma mente preocupada e uma mente ativa. Uma mente ativa é silenciosa, consciente, sem preferências.

 

O ideal é uma pose, uma máscara cobrindo o fato, o real.

 

Pode outra pessoa decidir qual deve ser o modo de vida de alguém?

 

Qualquer atividade que dê ênfase ao ser, ao ego, é destrutiva.

 

O conhecimento impede o entendimento criativo.

 

O ser é o passado, o poder de acumular bens, virtudes, idéias. O pensamento resulta desse condicionamento de ontem, e com esse instrumento você está tentando descobrir o incognoscível. Isso não é possível. O conhecimento precisa cessar para a outra coisa existir.

 

Simplesmente esteja ciente da absoluta necessidade e importância de uma mente quieta. Não lute pela quietude, não se torture com disciplina para adquiri-la, não a cultive nem a pratique. Todos esses esforços produzem um resultado, e aquilo que é um resultado não é quietude.

 

A mente está contida na prisão de sua própria criação, de seus próprios desejos e esforços, e cada movimento que ela faz, em qualquer direção, é dentro da prisão; mas ela não está ciente disso; então, em sua dor e conflito, ela reza, ela busca uma mediação externa que a liberte. Ela geralmente encontra o que procura, mas o que encontra é o resultado do próprio movimento. A mente ainda será uma prisioneira, só que em uma nova prisão, que é mais gratificante e confortadora.

 

Você não precisa de filosofias e doutrinas para ser gentil e bondoso.

 

Simplesmente rotular um estado não significa que o entendemos; pelo contrário, é um obstáculo para o entendimento.

 

Alguém pode não querer o reconhecimento mundano, mas o anseio de alcançar o céu ainda será uma busca pelo ganho. O desejo está sempre buscando realização, êxito, e é esse movimento do desejo que precisa ser entendido e não afastado ou escondido. Sem entendimento dos comportamentos habituais do desejo, o simples controle do pensamento tem pouca significância.

 

Repressão e conformidade não são os passos que levam à liberdade. O primeiro passo em direção à liberdade é o entendimento do cativeiro.

 

A mente precisa estar vazia do conhecido para o desconhecido existir.

 

A mente que busca convidar o real pelas várias práticas, disciplinas, por orações e atitudes, só pode receber suas próprias projeções gratificantes, mas elas não serão o real.

 

Ver o falso como falso é em si mesmo suficiente, pois essa mesma percepção liberta a mente do falso.

 

A ambição gera mediocridade, pois ambição é a realização do ser pela ação, pelo grupo, pela idéia. O ser é o centro de tudo que é conhecido, é o passado movendo-se através do presente para o futuro, e toda atividade no campo do conhecido cria a superficialidade da mente.

 

 

 

 

Edições de Planeta - Krishnamurti

 

O importante não é perguntar como transformar a dor, ou se a dor pode ser transformada em felicidade. É preciso assumir o sofrimento dos outros... O importante é compreender a dor por conta própria, e a partir daí extingui-la definitivamente.

 

A superstição é um dos maiores flagelos do mundo, um dos entraves dos quais é preciso se libertar inteiramente.

 

Aquele que esqueceu sua infância e perdeu toda a simpatia pelas crianças nunca poderá instruí-las e ajudá-las.

 

Um crime não deixa de ser um crime porque é cometido por muitas pessoas.

 

Quando se procura a verdade a gente traz o reflexo sobre o rosto. Quando se torna a verdade a gente não a reflete mais. Ela irradia.

 

O erro consiste em aceitar em vez de compreender.

 

É muito mais fácil seguir cegamente do que compreender e tornar-se assim verdadeiramente livre.

 

A verdade é um país sem caminho... Ilimitada, incondicionada, inatingível por qualquer caminhante e impossível de ser organizada.

 

A vida é uma experiência, é o céu inteiro, e as palavras são as janelas.

 

A verdade é um país sem caminhos e que a ele não se chega por nenhuma trilha, por nenhuma religião, por seita alguma.

 

Onde existe a imitação, certamente há a desintegração; onde há a autoridade necessariamente existe a cópia. E já que toda estrutura mental e psicológica está baseada sobre a autoridade, é preciso nos libertarmos dela a fim de sermos criativos.

 

Um sistema não pode modificar o homem. Este é que altera sempre o sistema.

 

As idéias sempre são fonte de inimizade, de confusão e de conflitos. É preciso antes de mais nada libertarmo-nos de todas as propagandas. As crenças dividem os homens.

 

Nossos problemas são tão complexos que só podemos resolvê-los tornando-nos simples. Nossos espíritos estão tão atravancados que nos tornamos incapazes de ser simples e de ter experiências diretas. Se não somos simples nunca podemos ser sensíveis aos sinais interiores das coisas.

 

O homem que se conhece vê aquilo que é sem intermediários, sem deformações. Ele não julga, não condena e não interpreta. Ele não é mais aquele que olha, nem que é olhado. Ele simplesmente é.

 

Conhecermo-nos tal como somos exige uma extraordinária rapidez de pensamento, porque o que é sofre mudanças perpétuas, e se o espírito adere a esta corrente ele não deve, evidentemente, começar por se amarrar, por se fixar um dogma ou uma crença.

 

Um novo pensamento, um novo sentimento só são produzidos quando o espírito não está preso à memória. Se você compreende uma coisa completamente, ou melhor, se você vê a verdade de uma coisa, isto não leva a memória em consideração.

 

Um homem rico de laços terrestres – ou rico de conhecimento e de crenças – conhecerá somente as trevas e será um centro de desordem e de miséria. Somente o homem plenamente consciente está em estado de meditação. Logo que o eu deixe de existir, a eternidade pode assumir sua existência.

 

O esforço nos distancia daquilo que é. Não se pode tornar um lago calmo; ele somente o é quando o vento pára.

 

Um recipiente só é utilizável quando está vazio, e um espírito cheio de crenças, dogmas, afirmações e citações é, na verdade, um espírito estéril, uma máquina de repetição.

 

As idéias não são a verdade. A verdade deve ser vivida plenamente, de momento a momento.

 

Se a verdade era um ponto fixo, não era a verdade, mas apenas uma opinião. A verdade é o desconhecido e aquele que a busca nunca a encontrará, porque todos os elementos que a compõem pertencem ao conhecido. O espírito é o resultado do passado, um produto do tempo. É o instrumento do conhecido e não pode descobrir o desconhecido. Pode ir apenas do conhecido ao conhecido.

 

A compreensão vem quando se está no mesmo nível e no mesmo momento.

 

Quando se está num estado receptivo as coisas podem ser entendidas mais facilmente.

 

A verdade não lhes pode ser dada por ninguém. É preciso que vocês a descubram.

 

A compreensão é gerada pelo fato de se estar consciente daquilo que é. Saber exatamente o que é, o real, o atual, sem interpretar, sem condenar ou justificar, é o começo da sabedoria. Quando começamos a interpretar, a traduzir segundo nossos condicionamentos e preconceitos, é que passamos ao lado da verdade.

 

É evidente que não se pode ver claramente enquanto se é ambicioso, quando se tenta ser ou tornar-se alguma coisa. Não quero dizer que é preciso estarmos satisfeitos com aquilo que somos, mas que se pode viver sem ficar fazendo comparações com os outros, e sem comparar aquilo que é com o que deveria ser.

 

Todas as palavras, todos os símbolos, todas as idéias, são prejudiciais à clareza da visão. Para se chegar até o final da dor e saber se é possível ser livre imediatamente, viver cada dia liberto da dor, deve-se penetrar profundamente em si mesmo e livrar-se de todas essas explicações, palavras, idéias, crenças, de maneira que o espírito fique realmente puro e capaz de ver aquilo que é.

 

O homem que aos seus próprios olhos personifica a justiça e o direito fecha-se em si mesmo.

 

A virtude nunca poderá ser meta. A virtude é um estado de espírito no qual não há luta. Você não se pode tornar virtuoso: você é ou não é.

 

O homem de princípios rígidos jamais é livre.

 

O homem estritamente em seus princípios nunca poderá ser virtuoso.

 

Enquanto eu lutar para ser alguma coisa, para adquirir a retidão e a virtude, estarei fechando o círculo sobre mim mesmo; e não há liberdade neste confinamento.

 

Quando nos opomos a uma qualidade estamos dando importância à luta, e conseqüentemente reforçamos o muro da resistência. Este muro de resistência é considerado como sendo a própria virtude, mas ele impede que a virtude nasça. A verdade só aparece ao homem livre, e para ser livre não é preciso cultivar a memória, que é a armadura da moralidade convencional.

 

Para conhecer Deus, para conhecer o real, não é preciso procurá-lo. Se o procuram é porque estão fugindo daquilo que é.

 

Para encontrar a realidade, para que ela exista, o sofrimento deve cessar. Por isso, procurar Deus, a verdade, a imortalidade, é simplesmente fugir ao sofrimento.

 

O homem que discute sobre a natureza de Deus não o conhece, porque sua realidade não pode ser medida nem captada nas redes das palavras.

 

A pergunta a respeito da existência ou não de Deus é vã, sem sentido, e só pode levar a uma ilusão. Como um espírito que é prisioneiro da agitação diária, da aflição e do sofrimento, que é ignorante e limitado, pode conhecer aquilo que é sem limites e indizível? Como pode o produto do tempo conhecer o intemporal? Nunca. Nem mesmo pensar nele.

 

É preciso estar completamente limpo para saber, e as tolices que os homens inventaram a respeito de Deus devem ser queimadas. Isto significa estar sem medo, errar sozinho, e raros são aqueles que o fazem.

 

Para encontrar a verdade em qualquer assunto eu não devo ter crença.

 

O homem que está preso a uma crença, qualquer que seja a extensão da corda que o prende, está retido e por isso não pode explorar. Examinará somente sob o raio da sua servidão e nunca encontrará a verdade.

 

O homem na defensiva não conhece a verdade. Encontrará apenas o que está protegendo. E o que ele protege não é a verdade, mas sua própria inclinação, sua deformação, sem preconceito.

 

Eu não posso investigar o que está além do meu alcance. Posso pesquisar apenas o que conheço, que é a minha própria projeção.

 

O que é resultado do tempo não poder conhecer senão a si mesmo, pode apenas investigar-se.

 

Só depois de um fim é que existe renovação; só após a morte é que existe um novo nascimento, o que significa morrer para o dia que passa, para o instante que corre.

 

Os problemas da vida não são de sins ou de nãos categóricos. A vida é tão vasta. Só a pessoa frívola procura uma resposta categórica.

 

A imortalidade não está na continuação de uma idéia, que é o eu. A imortalidade está naquilo que, morrendo a cada instante, constantemente se renova.

 

Vocês não podem repetir a verdade porque ela nunca é constante. A verdade é um estado de experiência, e o que podem repetir é um estado estático; portanto não é verdade.

 

Quando a crença se torna mais forte que a afeição, mais forte que o amor, quando a crença é mais importante que a humanidade, e toda nossa estrutura é feita de crença – em Deus ou em ideologia, no comunismo ou no nacionalismo – certamente vocês são a verdadeira causa das destruições.

 

Tenho o desejo de me realizar, de ser célebre, porque interiormente eu não sou nada; sou vazio, sou sozinho, sou uma pobre criatura que se reveste das plumas da celebridade porque acham que tenho uma técnica, um talento, que toco bem violão, piano e que sei manejar as palavras.

 

Quando você percebe um perigo não inventa muitas histórias para se decidir e saber o que fazer. Se diante de um perigo imediato você disser que é preciso meditar, tomar consciência, aprofundar-se, compreender, estará irremediavelmente perdido.

 

A verdade é indescritível. Se alguém a descrever, não é a verdade. Se alguém lhe explicar este êxtase, este perfume, desconfie dessa pessoa porque ela mente.

 

O espírito religioso não tem nada a ver com o conformismo, os dogmas, os ritos e as organizações espirituais ou religiosas. É o espírito que está em perpétuo estado de ressurreição, ou melhor, que morre incessantemente para o passado.

 

É a avidez e não o amor que criou a dependência e suas tristes conseqüências: o instinto de posse, o ciúme, o medo. Viver na dependência de outra pessoa não é amar. É estar vazio interiormente e só. A dependência gera o temor e não o amor.

 

O amor ultrapassa os sentidos. O amor é em si eterno; não é um condicionamento ou um resultado. Contém a piedade, a generosidade, o perdão e a compaixão; faz nascer a humildade e a doçura.

 

O intelecto, com todos os seus desejos, suas ambições e buscas, deve chegar a um fim para que o amor possa existir.

 

O amor não pertence ao tempo. Ninguém pode aprender a amar. O amor é a única coisa eternamente nova. Quando estamos conscientes que amamos, a atividade egocêntrica aparece, e isto não é mais amor.

 

Um coração sem amor é como um riacho sem água para alimentar seu rio.

 

O amor é semelhante ao perfume das flores que encanta igualmente aqueles que as veneram e aqueles que as esmagam.

 

Quando a ação é apenas uma repetição mecânica e não um movimento livre, não existe mais libertação.

 

O sexo é um dos meios que se tem para esquecer-se de si mesmo... porque vivemos tão superficialmente, de um modo tão imitativo, que o sexo é a única coisa que nos resta. E ele se torna um problema.

 

A parede dos hábitos só pode ser transpassada quando se consegue ser imparcialmente lúcido e negativamente atento.

 

Ver as coisas como elas são liberta o espírito.

 

Os homens baseados em dogmas e em crenças estão bloqueados.

 

Compreender a mim mesmo é de uma importância primordial porque não posso compreender nenhum problema humano sem compreender o instrumento que observa, o instrumento que percebe, que examina. Se eu não me conheço, não tenho base alguma para pensar.

 

A verdade é livre, viva, descondicionada. Suas características infinitas, sem desabrochamento espontâneo, tornam impossíveis todas as sistematizações e organizações.

 

Meditar é viver atentamente cada instante. Não é isolar-se num quarto ou numa caverna, porque dessa maneira nunca se pode conhecer a verdade. A verdade não pode ser encontrada nos contatos com a existência diária. Meditar é para o pensamento se livrar do tempo, porque na duração o intemporal nunca pode ser apreendido.

 

O que acontece a qualquer coisa que continua? Cai em ruínas e se torna uma rotina. A continuidade é uma garantia de degradação.

 

A espera do futuro é o assassinato do presente.

 

Quando nos baseamos num sistema para transformar a sociedade estamos apenas descartando o problema, porque um sistema não pode transformar o homem. A história nos mostra que sempre é o homem quem transforma o sistema.

 

Se vocês não mudarem agora, nunca mais mudarão. Porque a mudança que acontece amanhã é apenas uma modificação e não uma transformação. A transformação acontece agora; a revolução é agora, não amanhã.

 

Quando se necessita de qualquer espécie de estímulo, a mente se torna lenta, embotada, incapaz de pensar agilmente.

 

A mente carregada de conhecimentos não é uma mente rica; só o é a mente que penetrou profundamente em si mesma e descobriu seus próprios e inumeráveis recessos, suas secretas idéias e motivos, e é capaz de penetrar e transcender o pensamento.

 

Enquanto eu não compreender toda a esfera de meu pensamento, todo o conteúdo de minha mente, não é possível ir além; e nós temos de ir além, porque, se se não descobre algo totalmente novo, a vida se torna muito mecânica, superficial, estéril.

 

Só podemos pensar a respeito de coisas que já conhecemos e que podemos reconhecer; mas, para se encontrar o que se acha além da mente, o pensamento terá de cessar.

 

Não se pode saber o que é verdadeiro se existe um dirigente já moldado pelo passado, por um certo condicionamento.

 

A menos que a mente se liberte de seu condicionamento, tanto consciente como inconscientemente, não poderá haver investigação real, porque vossa busca será de acordo com vosso condicionamento, e vossas experiências de acordo com vosso fundo.

 

A mente que de fato está buscando o verdadeiro, que deseja descobrir se existe a verdade, a realidade, Deus, deve estar livre de seu fundo; e se não descobrirmos o que é verdadeiro, nossa vida se torna um padrão mecânico, porventura modificado por circunstâncias, porém sempre um padrão mecânico, a que chamamos progresso, revolução.

 

A base essencial da meditação é o autoconhecimento – o conhecer a si mesmo. Se não conhecemos a nós mesmos, toda meditação, toda contemplação, todas as preces, por mais proveitosas e aparentemente benéficas que sejam, conduzem inevitavelmente a várias formas de ilusão.

 

Quando vos olhais através de uma cortina de conhecimentos que acumulastes acerca de vós mesmos, há desfiguração daquilo que vedes.

 

A meditação não é prece; a prece implica súplica, rogo, e isso é extremamente infantil. Vós só rezais quando vos vedes em dificuldades. Um homem feliz não reza. Só reza o homem que sofre, o homem que deseja algo ou tem medo de perder algo.

 

O cérebro é o resultado de séculos de tempo. É o resultado biológico, zoológico, da influência, da cultura, de toda a estrutura psicológica da sociedade. E é só quando o cérebro está quieto, completamente imóvel,  porém vazio e não amortecido pela disciplina, pelo controle, pela repressão, que a mente pode começar a operar.

 

A crise surgida no mundo não é econômica, nem social, porém uma crise na mente, na consciência; e não pode haver solução para esta crise a menos que se verifique mutação profunda, fundamental, em cada um de nós.

 

 

 

 

Aos Pés do Mestre (ver livro)

 

Os homens que não sabem trabalham para adquirir a riqueza e o poder, porém estes bens são, quando muito, para uma vida somente e, portanto, irreais. Há coisas maiores do que essas – coisas reais e duradouras; quando as tiveres visto uma vez, não mais desejarás as outras.

 

Precisas distinguir não somente o útil do inútil, mas ainda o mais útil do menos útil. Alimentar os pobres é uma boa obra, nobre e útil; porém, alimentar-lhes as almas é ainda mais nobre e mais útil.

 

Deus tanto é Sabedoria como Amor; e quanto mais sábio fores, mais Ele se manifestará por teu intermédio. Estuda, pois, mas estuda em primeiro lugar o que mais te habilite a auxiliar aos outros. Trabalha pacientemente em teus estudos, não para que os homens te julguem sábio, nem mesmo para gozares a felicidade de ser sábio – mas por que o sábio pode ser sabiamente útil.

 

Há no mundo muitos pensamentos falsos, muitas superstições insensatas, e ninguém que a eles se escravize poderá progredir. Por conseguinte, não deves acolher um pensamento simplesmente porque muitas pessoas o acolhem, nem por ter merecido crédito durante séculos, nem por constar de algum livro que os homens julguem sagrado; deves pensar por ti mesmo sobre a questão e, por ti mesmo, ajuizar se ela é razoável.

 

A superstição é um dos maiores males do mundo e um dos empecilhos de que, por ti próprio, te deves libertar inteiramente.

 

Aprende a distinguir a Deus que está em todos e em tudo, por pior que seja a sua aparência exterior. Podes ajudar teu irmão pelo que tens de comum com ele – a Vida Divina. Aprende a despertar nele essa Vida, aprende a invocá-la nele; assim o salvarás do mal.

 

Precisas, pois, fazer o bem por amor ao bem, e não com a esperança da recompensa. Trabalha por amor ao trabalho e não para ver o resultado; deves entregar-te ao serviço do mundo porque o amas e não podes deixar de fazê-lo.

 

É bom falar pouco; melhor ainda é nada dizer, a não ser que estejas seguro de que o que pretendes dizer é verdadeiro, amável e útil. Antes de falar, pensa cuidadosamente se o que pretendes dizer preenche essas três qualidades; se assim não for, não o digas.

 

Assim, acostuma-te antes a ouvir do que a falar; não emitas opinião senão quando diretamente solicitada. Um enunciado das qualidades requeridas é assim formado: saber, ousar, querer, calar; e a última das quatro é a mais difícil de todas.

 

Não cedas nunca à tristeza e ao desalento. O desalento é mau, porque contamina os outros e torna as suas vidas mais difíceis, o que não tens o direito de fazer.

 

Emprega, diariamente, o poder do teu pensamento em bons propósitos; sê uma força orientada para a evolução.

 

Preserva a tua mente do orgulho, porque o orgulho provém somente da ignorância.

 

Sê indulgente com todos; sê benévolo em tudo.

 

Aquele que esqueceu a sua infância e perdeu a simpatia pelas crianças não é o homem que as possa instruir e ajudar.

 

Em tudo o que a tua mão fizer, aplica toda a tua força.

 

Três pecados há que operam maior dano do que todos os outros no mundo – a maledicência, a crueldade e a superstição – por serem pecados contra o amor. Contra esses três pecados, o homem que quiser encher o seu coração do amor de Deus deve estar vigilante, incessantemente.

 

Um crime, porém, não deixa de o ser porque muita gente o comete.

 

Não basta refrear o mal; é preciso ser ativo no bem.

 

Se anseias unificar-te com Deus, não é por amor de ti próprio, mas a fim de que possas ser um canal através do qual o Seu amor flua sobre os homens, teus irmãos.

 

 

 

 

A Humanidade Pode Mudar?

 

 

Posso olhar para aquela árvore, mulher, homem, céu ou ave sem a palavra, e descobrir o que são? Mas se surge alguém e diz "vou lhe mostrar como fazer isso", então estou perdido. E o "como fazer isso" é todo o conteúdo dos livros sagrados - lamento dizer - de todos os gurus, dos bispos, dos papas.

 

A própria origem do ego é o movimento do pensamento no tempo, na distância, daqui para ali, e todos os conflitos, sofrimentos, confusões criados pelo pensamento formam o ego. Quando o pensamento chega ao fim, isso é uma forma de morte enquanto vivemos.

 

A escolha tem que existir apenas quando a mente está confusa. Quando está clara, não há escolha.

 

Para sermos espontâneos temos que ser inteiramente livres.

 

Só pode haver comunicação quando estamos no mesmo nível, e com a mesma intensidade, ao mesmo tempo.

 

A verdade, de modo algum, pode ser percebida, vista, ao longo do tempo.

 

Não podemos perceber a totalidade, a menos que tenhamos entendido o movimento do pensamento, porque o pensamento é em si limitado.

 

O pensamento é a reação da memória, e memória é conhecimento, experiência, de modo que o pensamento se move do passado, sempre do passado, do qual nunca está livre.

 

A verdade não é perceptível através do tempo. A verdade não existe quando o ego está presente. A verdade não surge se o pensamento está se movendo em qualquer direção. A verdade é algo que não pode ser mensurado. E, sem amor, sem compaixão, sem essa inteligência, a verdade não pode vir a ser.

 

A verdade é atemporal. A verdade é eterna, não é a sua verdade, a minha verdade, a verdade de outra pessoa - ela é algo que transcende o tempo. O pensamento pertence ao tempo; os dois, verdade e pensamento não podem andar juntos.

 

O pensamento criou tanta ilusão, e produziu tanta decepção, que talvez esteja enganando a si mesmo ao dizer "sim, eu vi a verdade". Por isso, tenho que ser muito claro, tem que haver clareza, de que não há qualquer ilusão. A ilusão existe, existirá inevitavelmente, se eu não compreender a natureza da realidade.

 

A verdade só pode existir, só pode ser, ou só é, quando o ego não está presente.

 

Enquanto eu aceito qualquer autoridade, não importando de quem, não há percepção direta.

 

Se estou preso à tradição, não posso investigar. Começarei a andar em círculos. Tenho que me livrar do mourão e da corda que me prende ao mourão.

 

Para descobrir o que é a morte temos que conviver com ela. Isso significa terminar. Acabar com nossos apegos e crenças, acabar com tudo o que acumulamos. Ninguém quer fazer isso.

 

Alguém abandona qualquer opinião a que se apega? Abandona por completo seus preconceitos? Ou as experiências que acumulou? Nunca. Elas dizem "por favor" - nem mesmo escutarão o que você diz. Você diria que um político lhe daria ouvidos? Ou um sacerdote, ou alguém que está completamente a salvo em suas próprias conclusões? Porque, nesse estado, essa pessoa estaria inteiramente segura, em perfeita segurança. E se você chega e a perturba, ou ela venera ou mata você, o que é a mesma coisa.

 

Seria a percepção alguma coisa a ser cultivada no sentido de manipulada, vigiada, trabalhada?

 

Percepção é algo no qual não existe escolha.

 

Na percepção não há escolha, é apenas estar perceptivo a algo. No momento em que a escolha entra na percepção, ela não existe mais. E escolha significa mensuração, divisão, e assim por diante.

 

Não há chegada, há apenas o movimento de aprender - e aí é que está a beleza da vida. Se chegamos, nada mais há.

 

Não devemos pertencer a nenhuma organização espiritual, por mais promissora, por mais atraente, por mais romântica que seja.

 

Uma das coisas mais desastrosas é que todos nós pregamos, escrevemos livros, elaboramos teorias, fórmulas e conceitos, e não há absolutamente nenhuma ação.

 

Uma das razões dessa desordem imensa, destrutiva, no mundo é a divisão das religiões.

 

Evidentemente a religião foi criada pelo homem para ajudá-lo a tornar-se civilizado, não para procurar Deus - não podemos encontrar Deus através de crenças, dogmas, rituais, repetição da leitura do Gita ou da Bíblia, ou seguindo um sacerdote. Este mundo está dividido em religiões - religiões organizadas, com seus dogmas, seus rituais, suas crenças, suas superstições, em todo o mundo. E elas não aproximam as pessoas de nenhuma maneira.

 

O que importa é aquilo que somos, não os rótulos que usamos.

 

A verdade não se encontra seguindo alguém, tornando as coisas fáceis para nós sob a forma de um padrão: fazendo isto, seguindo aquilo, meditando desta maneira, disciplinando-se assim ou assado. Jamais chegarão lá dessa maneira. Para descobrir a verdade temos de ser livres. Temos de ser independentes, nadar contra a corrente, batalhar.

 

A ordem virá quando compreendermos a desordem, quando deixarmos de ser nacionalistas, quando estivermos realmente buscando a verdade, a liberdade - não através de alguma organização, de alguma crença, de algum guru.

 

Qualquer mudança que ocorre através de punição e recompensa - isso é mudança?